Com o universo de negócios em constante transformação, uma questão emergente preocupa líderes e gestores: o desinteresse da Geração Z (nascidos entre 1995 e 2009) por cargos de liderança. Este fenômeno não só desafia a forma como organizações, inclusive cooperativas, tradicionalmente moldam suas estruturas de gestão, mas também reflete mudanças mais profundas nas expectativas e prioridades dos jovens profissionais.
Uma pesquisa da CoderPad revelou que 36% dos profissionais da Geração Z não têm intenção de assumir responsabilidades gerenciais. Adicionalmente, um estudo do consultor de carreira de Harvard, Gorick Ng, mostra que menos de 2% dessa geração almeja ascender na pirâmide corporativa. Esses números acendem um alerta: a necessidade de repensar estratégias para engajar e desenvolver futuros líderes, especialmente dentro das cooperativas.
Expectativas e valores
A mudança nas aspirações da Geração Z vai além de uma simples falta de interesse; ela reflete uma transformação significativa nas prioridades dessa geração. Ana Paula Faria, vice-coordenadora do Comitê Nacional de Jovens da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), observa que “os jovens da Geração Z são nativos digitais, e buscam um mercado de trabalho com valores e experiências diferentes das gerações anteriores.” Para eles, a liderança é percebida não apenas como ascensão hierárquica, mas como um alinhamento com valores pessoais e impacto social.
Ana Paula acredita que a maneira que os líderes conduziram seus cargos, ao decorrer dos anos, intensificou esse desinteresse, trazendo uma discordância de como uma liderança deve ser. “Ser um líder, através dos olhos dessa nova geração, é uma visão bem diferente de ser um líder moldado em outras gerações, por isso é essencial o diálogo entre as gerações, para que se possa ter um ambiente diverso e participativo, que vislumbre o crescimento não só profissional como pessoal também”, explica.
“É necessário compreender as características dessa geração. Esse é o início para qualquer prática dentro da cooperativa”
– Ana Paula Faria, vice-coordenadora do Comitê Nacional de Jovens da OCB
Por que abrir espaço na sua cooperativa agora?
Abrir espaço para essa geração é essencial para garantir a renovação e a sustentabilidade da organização no futuro. Essa juventude traz consigo uma mentalidade digital nativa, com habilidades tecnológicas que podem impulsionar a inovação e a eficiência operacional além do seu forte compromisso com causas sociais e ambientais, alinhando-se perfeitamente aos princípios cooperativistas.
Num cenário de rápida evolução e pressão por práticas sustentáveis, integrar essa geração pode acelerar, por exemplo, a adoção de padrões ESG essenciais para a competitividade. Se essa porta não for aberta e, também, atrativa aos jovens, o futuro do setor cooperativista está em jogo.
A adaptação às novas demandas da juventude pode representar uma oportunidade para as cooperativas renovarem sua abordagem e fortalecerem sua relevância no mercado. Isso envolve não apenas a implementação de práticas e políticas alinhadas com os valores dos jovens, mas também a criação de um ambiente que valorize a diversidade e promova o desenvolvimento pessoal e profissional.
“Estamos falando da continuidade do sistema cooperativista e desses jovens que vão ser empreendedores daqui 10, 15, 20 anos. Então, precisamos gerar o interesse, mas, principalmente, dar condições para que estes interessados se desenvolvam, seja como colaborador ou como cooperado”, explica Alzimiro Thomé, presidente do Cresol Instituto e da Central Cresol Baser.
O que o setor tem feito para atrair e integrar os jovens
A oportunidade de se reinventar no mercado tem trazido ao modelo cooperativista a chance de se alinhar com as novas expectativas dos jovens profissionais. Thomé destaca a importância dos princípios do cooperativismo nesse contexto: “Os princípios do cooperativismo, especialmente o de educação, formação e informação, podem ajudar a compreender e se adaptar às novas expectativas dessa geração”, acrescenta.
A Cresol, juntamente ao programa educacional “Juventude Cooperativista”, realiza um trabalho de seis meses com estudantes do ensino médio, onde há encontros mensais e entrega de material didático que aborda a liderança, provoca a educação financeira e cooperativista. Fora do ambiente escolar, existe o projeto “Juventude Conectada”, que se encontra na quinta edição e reúne, por edição, mais de 400 jovens, que ao longo de 14 semanas, debatem, constroem e se aproximam do cooperativismo. “Outras atividades já consolidadas no Sistema Cresol e que abrangem a geração Z são: “Empreendedorismo”, “Sucessão Familiar”, “Potencializa Elas” e “Juventude Protagonista”. Todos estes projetos estão disponíveis para os 19 Estados”, acrescenta Thomé.
Desde 2019, a OCB incentiva participação dos jovens no movimento cooperativista, constituindo em 2021 o Comitê Nacional de Jovens, com representantes de diversos estados. O objetivo é fortalecer o movimento, criando ferramentas para instruir futuros líderes, trazendo novas ideias, ações e projetos, para que a participação do jovem seja mais efetiva.
Esse ano, a OCB criou Manual de Implantação e Funcionamento de Comitês de Jovens em Cooperativas para preparar futuras lideranças a atuarem no movimento cooperativista. “Estamos empenhados em divulgar a jornada de formação “Jovem Liderança”, que possui Liderança, Cooperativismo e Desenvolvimento Pessoal como pilares. Esses são aprendizados importantes para o jovem que queremos ver ocupando futuros cargos de liderança no cooperativismo”, exemplifica Ana Paula Faria.
“Estamos falando da continuidade do sistema cooperativista e desses jovens que vão ser empreendedores daqui 10, 15, 20 anos”
– Alzimiro Thomé, presidente do Cresol Instituto e da Central Cresol Baser
Equilíbrio entre vida pessoal e profissional
Destacando a necessidade de se atentar as novas demandas da atualidade, a vice-coordenadora do Comitê Nacional de Jovens defende: “É necessário compreender as características dessa geração, perceber suas necessidades, ouvir suas opiniões e dar espaço para uma troca de ideias. Esse é o início para qualquer prática dentro da cooperativa”.
Há tempos o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional é apontado como um pilar importante para a saúde mental dos colaboradores, mas para a Geração Z, isso é mais que um sonho distante, é um valor inegociável.
“A juventude hoje tem uma preocupação grande em relação ao seu bem-estar. E nós precisamos aproveitar as oportunidades de conversar com eles e mostrar que, quando ele constrói a carreira profissional, ele constrói também a própria vida”, ressalta Thomé.
Para alcançar esse equilíbrio, as cooperativas precisam oferecer ambientes de trabalho que promovam flexibilidade e suporte ao desenvolvimento pessoal e profissional. Isso pode incluir opções de trabalho remoto, horários flexíveis e programas de bem-estar. A forma como as cooperativas abordam o equilíbrio entre vida pessoal e profissional pode ser um fator decisivo na atração e retenção de jovens talentos.
Prioridades em foco
Um outro aspecto crucial para envolver a Geração Z no cooperativismo e em cargos de liderança é a comunicação assertiva. É fundamental que as cooperativas demonstrem que estão alinhadas aos valores e expectativas dessa geração. A linguagem deve ser acessível e conectada às realidades e interesses dos jovens, destacando como o cooperativismo pode oferecer uma plataforma para a realização de seus ideais, como sustentabilidade, impacto social e inovação.
Ana Paula Faria, vice-coordenadora do Comitê Nacional de Jovens da OCB, enfatiza que “o diálogo aberto e contínuo é essencial para criar uma cultura onde os jovens se sintam ouvidos e valorizados. Eles precisam ver que suas opiniões têm peso e que há espaço para a colaboração intergeracional”. Além disso, a comunicação não deve ser unilateral; as cooperativas devem estar dispostas a ouvir e adaptar suas práticas, criando um ambiente onde os jovens possam realmente influenciar o futuro da organização.
Por Andrezza Hernandes – Redação MundoCoop
Matéria exclusiva publicada na edição 119 da Revista MundoCoop
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