A inadimplência no crédito rural atingiu, em outubro de 2025, o maior patamar desde o início da série histórica, iniciada em 2011. Dados da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) mostram que o atraso no pagamento das operações contratadas a taxas de mercado chegou a 11,4%, ante 3,54% em outubro de 2024 e 0,59% em janeiro de 2023.
O avanço expressivo expõe o enfraquecimento das finanças do produtor rural e amplia as incertezas sobre o desempenho do agronegócio em 2026. O diagnóstico foi apresentado pela CNA em coletiva de imprensa realizada no dia 9 de dezembro, em Brasília, quando a entidade alertou para um ambiente de pressão simultânea sobre margens, liquidez, capacidade de investimento e gestão de risco no campo.
Crédito mais caro explica inadimplência
Segundo a CNA e reportagens publicadas em veículos como Correio do Povo, CNN Brasil e R7, o avanço acentuado da inadimplência decorre da combinação de três fatores principais.
O primeiro é o impacto recorrente de eventos climáticos extremos. Secas severas no Sul, excesso de chuvas em períodos críticos de plantio e colheita, ondas de calor atípicas e a persistência da instabilidade climática geraram perdas sucessivas de safra, comprometendo o fluxo de caixa de muitos produtores e a capacidade de honrar financiamentos.
O segundo fator é a queda dos preços das commodities agrícolas. Após o ciclo de alta observado entre 2020 e 2022, soja, milho e outras culturas registraram recuo significativo nas cotações internacionais. Em diversas regiões, a combinação entre preços mais baixos e custos de produção elevados reduziu de forma expressiva as margens de lucro.
O terceiro elemento é o encarecimento e a restrição do crédito. Com a taxa Selic em 15% ao ano, conforme destacou a CNA, o crédito rural a taxas livres tornou-se mais oneroso, enquanto bancos passaram a adotar critérios mais rigorosos na concessão de financiamentos, estreitando as alternativas disponíveis ao produtor e ampliando o peso financeiro das dívidas já contraídas.
Seguro rural insuficiente
Outro ponto central destacado pela CNA é o desempenho insatisfatório do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) em 2025. O programa cobriu apenas 2,2 milhões de hectares, o pior resultado desde 2007 e equivalente a menos de 5% da área agricultável brasileira.
Com baixa cobertura, o risco climático recai integralmente sobre o produtor. Uma safra perdida, sem seguro, pode representar anos de endividamento, o que ajuda a explicar a escalada da inadimplência observada ao longo de 2025. Para a entidade, a gestão de risco precisa ser tratada como política pública estruturante, uma vez que a fragilidade do seguro rural amplia a vulnerabilidade financeira no campo.
Agro enfrenta fragilidades internas
Apesar da deterioração do crédito, o agronegócio segue como um dos principais pilares da economia brasileira. Dados apresentados pela CNA indicam que o PIB do setor deve crescer 9,6% em 2025, alcançando R$ 3,13 trilhões. Para 2026, a projeção é de crescimento mais modesto, de 1%, refletindo o ambiente de incertezas.
A inflação brasileira deve encerrar 2025 em 4,4%, e o bom desempenho do agro foi determinante para esse resultado. Segundo a CNA, sem a contribuição do setor, haveria risco de novo descumprimento da meta de inflação, exigindo a manutenção de uma política monetária ainda mais restritiva.
O mesmo movimento aparece no Valor Bruto da Produção (VBP). Em 2025, o indicador é estimado em R$ 1,49 trilhão, alta de 11,9% sobre 2024, com crescimento mais forte da pecuária (14,2%) e avanço de 10,8% na agricultura. Para 2026, a projeção é de R$ 1,57 trilhão, crescimento de 5,1%, sinalizando expansão mais moderada e maior dependência da produtividade e dos preços internacionais.
Governo avalia mudanças nas regras para renegociação
Diante do avanço da inadimplência, o governo federal avalia ajustes nas regras de renegociação de dívidas rurais. O Executivo poderá editar uma nova medida provisória com mudanças no acesso à linha de R$ 12 bilhões operada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), criada para reestruturar passivos do setor.
A sinalização foi dada pelo secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Guilherme Mello, em reunião virtual com representantes de instituições financeiras, entidades do setor agropecuário do Rio Grande do Sul e do governo estadual. Participantes relataram que não houve compromissos formais, mas o secretário mencionou a tendência de publicação de uma nova MP até o Natal e a intenção de aprimorar o texto atual.
O governo analisa a possibilidade de incluir operações contratadas até o fim da safra 2024/25, renegociar juros e encargos financeiros que já se transformaram em dívida e revisar critérios de enquadramento dos produtores. Hoje, pela MP 1.314/2025, apenas o valor principal pode ser renegociado, o que exclui encargos acumulados e limita o alcance da linha.
Fonte: Portal do Cooperativismo Financeiro e Globo Rural, com adaptações da MundoCoop












