A UNICAFES ( União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária ) reúne 1 milhão de membros em 1.500 cooperativas em todo o Brasil, das quais 83% já implementam ações para combater as mudanças climáticas, segundo um levantamento recente da rede. Essa capilaridade se alia à governança democrática. Por exemplo, a UNICAFES foi pioneira na paridade de gênero nos órgãos diretivos das cooperativas que representa – demonstrando a importância do desenho institucional: quando as mulheres lideram e decidem, os investimentos em adaptação, recuperação e eficiência ganham escala e sustentabilidade.
Este momento também é simbólico. Estamos vivenciando a Década das Nações Unidas da Agricultura Familiar (2019-2028), que coloca os agricultores familiares no centro dos sistemas alimentares sustentáveis, da conservação e da erradicação da pobreza, sob a liderança da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura ( FAO ) e do sistema das Nações Unidas. O Ano Internacional das Cooperativas das Nações Unidas, em 2025, reconhece o papel das cooperativas no desenvolvimento inclusivo e no trabalho decente. Em 2026, durante o Ano Internacional das Mulheres Rurais das Nações Unidas, a agenda de comércio e clima terá a oportunidade de reconhecer, ainda mais fortemente, a liderança das mulheres nas transições produtivas e energéticas já em curso nos territórios locais.
No âmbito do comércio internacional, a lógica é simples: uma parcela substancial das emissões de Escopo 3 (todas as emissões indiretas de gases de efeito estufa resultantes das atividades de uma empresa) nas principais cadeias de valor concentra-se em pequenos fornecedores — cooperativas e pequenas e médias empresas (PMEs). Acelerar a descarbonização global exige a plena inclusão desses atores em normas, financiamento e mercados. O Centro de Comércio Internacional (ITC) atua precisamente nessa fronteira: conecta PMEs e cooperativas a informações de mercado, conformidade com normas, facilitação do comércio e compradores em mais de 200 países e territórios.
Na agenda regulatória, o ITC publicou guias práticos sobre o Regulamento da UE sobre o Desmatamento (EUDR) e oferece treinamento para que cooperativas e PMEs possam atender aos requisitos de geolocalização, due diligence e MRV (Monitoramento, Relato e Verificação) — uma etapa essencial para acessar e manter os mercados da UE. Evidências recentes também reforçam que o setor agroalimentar é responsável por uma parcela significativa das emissões globais, o que torna urgente o apoio aos produtores de alimentos na transição para práticas de baixo carbono e que respeitem o meio ambiente.
No Brasil, a experiência demonstra que o desenvolvimento local e o comércio sustentável se reforçam mutuamente. Quando uma cooperativa fortalece a gestão, a qualidade, a rastreabilidade e o design de seus produtos, ela abre portas para compras públicas e privadas, encurta as cadeias produtivas, preserva as florestas e remunera melhor aqueles que cuidam do território. A sociobiodiversidade, conceito que se refere à conexão indissociável entre a diversidade social e a biodiversidade (do mel e frutas nativas ao cacau e ao açaí), é um ativo tanto competitivo quanto climático. O fortalecimento de empreendimentos familiares gera renda onde a natureza é o principal ativo, com benefícios diretos para os povos da floresta, comunidades indígenas e populações tradicionais.
Também estamos testemunhando novas arquiteturas de financiamento florestal. O recém-lançado Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês) propõe um mecanismo em larga escala para recompensar os países que preservam suas florestas — uma iniciativa que, se bem planejada, pode impulsionar as cadeias de valor comunitárias e cooperativas, alinhando conservação, inclusão e exportações responsáveis.
Dado este contexto, propomos cinco etapas para implementação imediata:
- As Contribuições Nacionalmente Determinadas (CND), que são planos de ação climática apresentados por cada país no âmbito do Acordo de Paris, com a participação de cooperativas , incluem metas, programas e indicadores específicos (energia, logística, agricultura de baixo carbono, serviços) com métricas proporcionais e apoio técnico.
- Financiamento que chega à base — linhas de crédito dedicadas em bancos públicos e multilaterais para cadeias de valor da sociobiodiversidade, com garantias, financiamento misto e produtos de capital de giro vinculados à assistência técnica e a padrões de relatórios simplificados.
- Conformidade viável com o Regulamento sobre Produtos Livres de Desflorestamento — adoção de ferramentas e guias de TIC para geolocalização, due diligence e MRV; reconhecimento mútuo e digitalização para reduzir os custos de conformidade.
- Compras que impulsionam a transição — critérios favoráveis à natureza em compras públicas e corporativas, com metas de participação para cooperativas e PMEs, reduzindo rapidamente as emissões de Escopo 3.
- Bioeconomia com foco no mercado — políticas de marca de origem, certificações e acesso de compradores para transformar soluções baseadas na natureza em contratos recorrentes e empregos de qualidade.
A UNICAFES traz escala, legitimidade e governança democrática; o ITC contribui com ferramentas, padrões e acesso ao mercado. Juntos, podemos acelerar a preparação cooperativa para o EUDR e outros requisitos internacionais; expandir a participação das mulheres nas cadeias de valor das exportações; e conectar a sociobiodiversidade do Brasil às oportunidades globais com fortes salvaguardas sociais e ambientais.
A mensagem de Belém para o mundo é simples: quando as mulheres lideram e as cooperativas prosperam, o clima vence, as florestas resistem e as economias locais florescem. Que a COP30 — no coração da Década da Agricultura Familiar e do Ano Internacional das Cooperativas — seja lembrada como a COP que colocou a democracia econômica, a igualdade de gênero e o comércio justo no centro da transição.
Fonte: The Co-op News com adaptações da MundoCoop












