Neste mês de julho, no evento Glocal Experience, o “pai” do conceito do tripé da sustentabilidade, John Elkington, uma das referências no movimento da sustentabilidade empresarial, na sua palestra online explanou sobre os cisnes verdes. Esta foi uma alusão criado por ele aos cisnes negros do economista Taleb, sendo os cisnes verdes baseados nos estímulos de mudanças de valores, paradigmas, tecnologia e modelos de negócios.
Estes cisnes verdes mostram um capitalismo regenerativo e é um conceito que substitui o tripé da sustentabilidade: o ambiental, social e econômico. Pois, segundo Ellkington, o tema virou, com o tempo, um mero item do balanço das empresas sem fazer parte das operações e estratégias.
Mas as empresas ainda estão discutindo as questões de ESG, o tripé na linguagem dos investidores, para criar projeto e estratégias à governança social, ambiental e corporativa. Segundo o que a pesquisa da consultoria Michael Page revelou, houve o aumento de 50% de busca de profissionais desta área entre janeiro e maio de 2022 no agronegócio, por exemplo. E a EcoOnline, que ouviu funcionários de 124 empresas em junho de 2022, relevou algumas verdades como um terço da equipe que lidera os relatórios ESG tem pouco ou nenhum treinamento relevante para fazê-lo de forma eficaz; ou ainda que 50% consideram os relatórios ESG como um exercício de “ticar a caixinha”; e 66,7% destacaram que sua organização não produz um relatório anual de sustentabilidade ou ESG disponível publicamente.
Enquanto isso, lá nos conselhos e boards, o Relatório divulgado pela Spencer Stuart e pelo Diligent Institute mostra que 71% dos conselhos das empresas estão levando em consideração os objetivos e metas ESG em sua estratégia de negócios, mesmo que relativamente poucas empresas tenham uma estrutura de governança para o ESG. Esta pesquisa foi com 590 conselheiros em várias empresas pelo mundo.
Como disse Elkington na sua palestra: “A agenda está ficando mais complexa”. Mas, na verdade, não é só a agenda e sim a gestão das empresas. Aquela empresa que somente produzia e vendia os seus produtos ou serviços tem que entender que agora não é só isso. É muito mais do que isso. É a gestão de todos os stakeholders, que o Klaus Schwab, fundador do Fórum Econômico Mundial, chama de Capitalismo dos Stakeholders.
No workshop que tive oportunidade de ministrar para os pequenos e microempreendedores lá no Sebrae do Mato Grosso, no Centro Sebrae de Sustentabilidade, contei esta história da complexidade da gestão que sempre gosto de contar nas minhas aulas e que fica bem mais claro a necessidade da gestão dos stakeholders, da sustentabilidade e do ESG.
Todo mundo conhece alguém que na pandemia ficou desempregado e teve que se virar “nos trinta” para pagar as contas. Um exemplo genérico pode ser a Dona Maria que resolveu vender bolos para os seus vizinhos, amigos e pessoal de contato do whatsapp. Dona Maria foi ao supermercado, comprou os ingredientes com o seu último salário e começou a produzir bolos. A sua primeira produção vendeu tudo e gerou uma ótima rentabilidade. E com o excedente investiu em mais uma produção. Depois de várias produções e dois meses, Dona Maria resolveu contratar duas primas para ajudar, pois elas também estavam desempregadas. E começaram a produzir, porém um bolo ficava de um jeito, o outro diferente e assim por diante. Dona Maria teve que padronizar, buscar as medidas certas, o tempo correto no forno, a quantidade certa de recheio, enfim, fez um processo de qualidade para que seus bolos saíssem todos iguais e com o mesmo sabor.
O que Dona Maria não sabia é que agora tinha que cuidar da qualidade dos seus produtos para continuar vendendo bem, ter uma boa gestão da qualidade.
Um dia, uma das funcionárias caiu no ônibus vindo para o trabalho e Dona Maria teve que dar todo uma assistência para ela. Pois é, agora Dona Maria tinha que treinar e cuidar dos seus funcionários, fazer a gestão de pessoas. Inclusive, a outra funcionária estava com problemas na família e Dona Maria fez uma “vaquinha” com seus clientes para ajudar a família dela. O primeiro projeto social da empresa, gestão social da empresa.
Mas não parou por aí, pois um cliente reclamou do bolo, pois pegou de manhã e a noite o bolo tinha “derretido”. Dona Maria foi entender como foi o dia deste cliente e entendeu a sua jornada. Pois é, agora ela tinha que entender também a Jornada do seu cliente e trabalhar com um Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC), a gestão do consumidor. E para terminar, uma outra cliente questionou por que ela usava plástico nos seus bolos e não papelão, se não dava para devolver o plástico para ela reutilizar, ou se ela não poderia trocar por papelão ou outro tipo de embalagem. E lá foi Dona Maria entender sobre reciclagem, logística reversa e tipos de embalagem biodegradáveis, tentar melhorar a sua gestão ambiental. Tudo isso sem esquecer em como comunicar, vender e gerenciar o faturamento, fazendo uma ótima gestão de mercado e financeiro.
Daria para continuar a história e colocar neste exemplo do dia a dia de negócios o quanto precisamos repensar todos os processos de gestão das empresas com um olhar para os stakeholders, pois os conselhos e investidores (que também são stakeholders) estão questionando este movimento para a perenidade, continuidade, sustentabilidade dos negócios. Complexo? Bem-vindos ao movimento do ESG e a sua evolução o Cisne Verde!
*Marcus Nakagawa é professor da ESPM; coordenador do Centro ESPM de Desenvolvimento Socioambiental (CEDS); idealizador e conselheiro da Abraps; idealizador da Plataforma Dias Mais Sustentáveis; e palestrante sobre sustentabilidade, empreendedorismo e estilo de vida. Autor dos livros: Marketing para Ambientes Disruptivos, Administração por Competências e 101 Dias com Ações Mais Sustentáveis para Mudar o Mundo (Prêmio Jabuti 2019).
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