O prolongamento do período de taxa de juros em patamar historicamente elevado está fragilizando a relação entre grandes empresas e investidores e startups do agronegócio, já que os investimentos disponíveis para novos negócios estão menores e mais seletivos.

Dirceu Ferreira Júnior, sócio-líder da PwC Agtech Innovation, admite que o agronegócio passa por uma crise de investimentos. A PwC funciona como um agente que conecta as agtechs às empresas, e o termômetro aponta um “mercado frio”.
“Os juros altos afetam a área de inovação, porque muitas startups estão em busca de investimento, mas o setor está retraído. Algumas companhias com estratégias de Corporate Venture Capital (CVC) desmontam ou reduzem drasticamente seus investimentos”, diz Ferreira.
Silvio Passos, fundador e presidente do conselho do Agroven, diz que há a desaceleração mesmo considerando os juros reais, descontando a inflação. O grupo de membros que Passos lidera é formado por cerca de 250 empresários que investem em agtechs. Segundo ele, a renda fixa é hoje a escolha de preferência da maioria dos investidores.
Para o especialista da PwC, os fundos de venture capital, especializados em investimentos de alto risco, também são impactados, já que dependem dos investidores que colocam dinheiro em busca de oportunidades de mercado. Apesar disso, o panorama não surpreende. “Isso faz parte de uma conjuntura normal quando olhamos o cenário econômico do país”, diz.
Na visão do hub, entre 60% e 70% dos recursos financeiros disponíveis para investimento em startups que existiam no mercado oriundos de Corporate Venture Capital (CVC) e Venture Capital secaram, e o mercado está mais seletivo.

“O dinheiro está mais escasso e, quando disponível, exige retorno mais rápido. É um mercado mais exigente, e isso é natural. Aconteceu nos EUA e em outros mercados no ecossistema do empreendedorismo”, resume Ferreira.
Thiago Parente, principal executivo da iRancho, agtech de gestão da pecuária que gerencia seis milhões de bovinos, reconhece que o cenário macroeconômico do Brasil está desfavorável ao investimento de risco. “[É difícil] concorrer com o governo, que tem um risco infinitamente inferior do que uma startup oferece”, argumentou. Porém, pontua que o governo não oferece a alavancagem que uma boa startup pode entregar. “Hoje a iRancho tem crescido de 40% a 50% ao ano”, exemplifica.
Em conversas com fundos interessados em sua tecnologia, o executivo identificou que o dinheiro “não está em falta para quem consegue entregar resultado”. A agtech acaba de anunciar uma rodada seed para captar R$ 10 milhões. Em sua trajetória, a iRancho já recebeu um investimento anjo e realizou uma rodada pré-seed, e atualmente fatura cerca de R$ 600 mil por mês.
O novo aporte busca ampliar o faturamento com a criação de uma área específica para desenvolver uma Inteligência Artificial que “conversa com o produtor”. “Estamos consolidados e temos ciência que há interesse na iRancho, e isso gera uma segurança”, sustenta Parente.

Passos, do Agroven, pontua que um investidor qualificado normalmente já trabalha com diferentes níveis de risco. Ele defende que é possível separar uma pequena parte para o Venture Capital, de alto risco, já que uma grande proporção dos recursos em renda fixa gera um alto retorno a baixo risco. “Isso, em parte pode ser direcionado para investimentos de alto risco, aproveitando ativos com valuations descontados pela falta de liquidez”, sustenta Passos.
O número médio de investimentos do AgroVen se mantém em três a quatro aportes por ano, e não deve mudar, avalia. O que mudou até o momento foi o perfil dos investidores: antes, a maior parte do capital vinha de membros pessoa física, mas agora as corporações ampliaram sua participação de 15% para 50% do total investido.
Para 2026, Ferreira não enxerga “calmaria”, já que será ano eleitoral, o que costuma provocar turbulências no mercado financeiro. “Fatores como o dólar, a bolsa e as decisões do Banco Central sobre a taxa Selic ditarão o ritmo do jogo”, antecipa. Esse ambiente deve manter os investimentos retraídos, além de afetar o caixa das novas empresas.
Fonte: Globo Rural com adaptações da MundoCoop












