Quando um produto é descartado após o uso, isso não significa que seu ciclo produtivo terminou. É possível devolver à indústria parte dos resíduos para que sejam reaproveitados, reduzindo o desperdício, a produção de lixo, e a necessidade de novas matérias-primas. Essa reinserção produtiva tem um nome: logística reversa, um conjunto de processos que envolve coleta, transporte e destinação adequada de resíduos para que eles possam fechar o ciclo da economia circular.
No Brasil, a logística reversa é regulamentada pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que parte do princípio de que a responsabilidade pelo ciclo de vida dos produtos é compartilhada entre fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, consumidores e serviços públicos de limpeza urbana e de manuseio dos resíduos sólidos.
De acordo com a lei, a logística reversa é um dos instrumentos para colocar em prática esse conceito e garantir que os produtos retornem ao ciclo produtivo ou tenham destinação ambiental adequada após seu descarte.
A participação das cooperativas nos processos de logística reversa está prevista na PNRS, em que elas são citadas como parceiras da indústria para fazer com que produtos usados, embalagens e resíduos possam ser corretamente reaproveitados.
Protagonistas da reciclagem no Brasil, as cooperativas atuam na coleta, separação e destinação de resíduos sólidos, com geração de trabalho, renda e inclusão para cooperados em todo o país. De acordo com os dados do Anuário da Reciclagem 2023, há 2.941 organizações de catadores em todo o território nacional, entre cooperativas e associações, em um total de 86,8 mil trabalhadores. Juntos, eles foram responsáveis pela recuperação de 1,7 milhão de toneladas de resíduos no ano passado.
“As cooperativas de reciclagem são as principais operadoras de programas de logística reversa para empresas como Coca-Cola, Heineken, Havaianas, Nestlé e Braskem. São fundamentais para o cumprimento de dispositivos previstos na Política Nacional de Resíduos Sólidos e para garantir sustentabilidade econômica, ambiental e social nesses processos, afirma o coordenador de Meio Ambiente do Sistema OCB, Alex Macedo.
Quando a lei entrou em vigor, determinava que as empresas precisavam comprovar o processo de reciclagem de pelo menos 22% de toda a massa de embalagens produzidas por elas. Atualmente, a exigência é de 30%. Para cumprir esse percentual, o setor produtivo criou programas de logística reversa que têm as cooperativas como principais executoras, com resultados bem acima do exigido pela legislação.
A Central de Cooperativas de Trabalho de Materiais Recicláveis do Distrito Federal (Centcoop-DF), que reúne 1,1 mil catadores de materiais recicláveis associados a 22 cooperativas, integra alguns desses programas.
Um deles é o Reciclar Pelo Brasil, considerada a maior plataforma de logística reversa inclusiva do país. Gerenciado pela Associação Nacional de Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis (Ancat), o programa atua com assessoramento técnico e investimentos diretos nas cooperativas participantes para garantir a qualificação da atividade de reciclagem e o desenvolvimento econômico dos cooperados.
Por meio da plataforma, as cooperativas prestam serviços de logística reversa para empresas como Coca-Cola Brasil, Ambev, AB Brasil, Ajinomoto, Arcor, DPA Brasil, Danone, Dr. Oetker, Nestlé, Pepsico, RD Raia Drogasil, Tetrapak, Vigor, BRF e Novelis.
Em 2023, o Reciclar Pelo Brasil mobilizou 7,8 mil catadores em 26 estados do país, gerando um volume de 102 mil toneladas de materiais recicláveis.
Outra iniciativa de impacto nacional diretamente ligada ao trabalho das cooperativas de reciclagem é o Mãos Pro Futuro, programa conjunto de logística reversa da Associação da Indústria Brasileira de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos; Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Limpeza e Afins (ABIPLA) e Associação Brasileira das Indústrias de Massas Alimentícias (ABIMAPI). Criado em 2006, o programa conecta 204 empresas a 182 cooperativas. Em 17 anos, mais de 1 milhão de toneladas de materiais recicláveis foram recuperados por meio da logística reversa do projeto.
Em outro programa, o Recupera, as cooperativas atuam na logística reversa de embalagens e produtos para 45 grandes empresas, de diversos setores, como 3M, Alpargatas, Seara, Johnson, Heineken, Aché, entre outras. O Recupera atua em todas as regiões do país, com mais de 250 cooperativas e associações de catadores, num total de 5 mil trabalhadores. Desde 2020, mais de 350 mil toneladas de resíduos foram recuperadas no programa.
Para a presidente da Centcoop, Aline Souza, a atuação em rede das cooperativas junto a iniciativas empresariais com essas é fundamental para gerar trabalho para os cooperados e garantir que a lei seja cumprida com benefícios sociais e ambientais.
“A logística reversa só existe por causa do trabalho dos catadores. Há um trabalho árduo feito lá na ponta pelos nossos companheiros, que é fazer com que a embalagem, de fato, siga seu destino de volta para a indústria. Fazer com que o percentual de reciclagem seja atingido pelos fabricantes. E esse trabalho precisa ser valorizado. Para que tudo isso dê certo, o protagonista é o catador, nós prestamos esse serviço com qualidade”, afirma. Referência entre as cooperativas do setor na América Latina, a Centcoop recicla cerca de 12 mil toneladas de resíduos por ano.
Logística reversa no agro
Além das cooperativas de reciclagem, outros setores do cooperativismo também têm apostado na logística reversa como estratégia para tornar o negócio mais sustentável, como as coops agropecuárias.
“A Cooxupé, de Minas Gerais, fez uma parceria com cooperativas de reciclagem para doar todo o resíduo gerado pela cooperativa na produção de café. Já a Aurora Vinícola faz um trabalho com compra de créditos de reciclagem como forma de estruturar a logística reversa das embalagens de vidro”, cita o coordenador de Meio Ambiente do Sistema OCB, Alex Macedo.
No interior de São Paulo, a Coplacana, referência na produção de amendoim e cana-de-açúcar, é precursora da logística reversa de embalagens vazias e sobras de defensivos agrícolas com o Sistema Campo Limpo, criado em 1996, muito antes de o Brasil ter uma lei sobre o assunto.
Com a participação da indústria fabricante, distribuidores, trabalhadores rurais cooperados e o Poder Público, o sistema da cooperativa paulista recebe cerca de 400 toneladas de embalagens vazias por ano, possibilitando que os cooperados façam o descarte desses materiais de maneira correta. As embalagens de defensivos são descontaminadas, armazenadas e passam por um processo de redução de volume para facilitar o transporte até as recicladoras.
Fonte: SomosCoop
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