O CEO de uma startup farmacêutica em rápido crescimento nos encaminhou recentemente uma troca de e-mails que teve com seus diretores financeiro e comercial. Parece que o CCO surpreendeu tanto o CEO quanto o CFO ao propor gastar mais de US$ 450 mil para manter uma agência externa.
O CFO imediatamente disparou um e-mail privado ao CEO: “Estamos em modo de total contenção enquanto levantamos fundos da Série C. Acabamos de pedir um empréstimo ponte de US$ 75 milhões. Por que ela não vem falar comigo? Eu deveria estar incluído nessas decisões.” O CEO respondeu: “Imagino que, se um membro da equipe de liderança executiva me trouxer uma proposta, ele já conversou com os colegas.” O CFO respondeu: “Bem, ela não fez isso!”
Ao vermos a troca de mensagens, dissemos ao CEO: “Parece que membros da sua equipe imediatamente escalam os problemas para você, em vez de tentar resolvê-los sozinhos.” Teria sido melhor, acrescentamos, se eles tivessem tentado primeiro conversar um com o outro para resolver o problema. Se ainda sobrasse uma divergência de opinião, deveriam especificar por que discordaram e como tentaram resolver isso. Então, e só então, com essa especificação, eles deveriam ter ido até o CEO para discutir — juntos.
Desentendimentos e conflitos sobre questões tão variadas quanto direção estratégica, investimentos e prioridades diárias permeiam todas as organizações. Em nossos oito anos coletando dados sobre eficácia organizacional de 1,4 mil executivos representando 500 empresas ao redor do mundo, 84% relataram lidar regularmente com contrapartes que chamaram de “irracionais”. Esse conflito ocorre entre pares, em diferentes funções e unidades de negócios, e entre líderes de equipes executivas e membros do conselho. O conflito pode ser explícito, mas muitas vezes é encoberto. Conflitos às vezes são resolvidos de maneira construtiva, mas, mais frequentemente, o conflito compromete a execução e prejudica as relações. Gerir conflitos para que não interfiram nas operações ou prejudiquem as relações de trabalho é essencial para a eficácia organizacional.
Procedimentos de escalada claramente definidos garantem que os desentendimentos sejam tratados no nível correto e resolvidos de forma colaborativa e eficiente. Não é um desafio trivial; as pessoas enfrentam vários pontos de tensão ao decidir se devem escalar a situação. (Veja “Onde surgem tensões ao escalar questões para líderes.”) Infelizmente, poucas organizações definiram e implementaram uma forma eficaz de garantir que os conflitos sejam resolvidos de forma eficiente e eficaz no nível correto de gestão.
Como escalar para os líderes cria tensões
As pessoas frequentemente têm dificuldade em decidir se devem escalar conflitos para a liderança no trabalho. Qualquer uma das opções pode parecer complicada, a menos que haja procedimentos claros para se dirigir a um nível hierárquico superior.
| Levantar uma questão rápido demais. As pessoas ignoram a resolução de problemas, quando gerar soluções em grupo poderia ter sido mais eficiente | ou | Demorar muito para levantar uma questão. As pessoas perdem tempo buscando a solução, quando seria mais eficiente escalar logo |
| Resolver problemas com uma visão estreita. Optar pelas soluções mais acessíveis sem observar o panorama e as implicações da decisão | ou | Resolver o problema sem conhecer detalhes suficientes. Líderes em posições mais elevadas decidem qual será a solução, mas podem desconhecer todos os detalhes ou a dinâmica da equipe |
| Envolver poucas pessoas na tomada de decisão. O número de participantes é reduzido para chegar a uma solução rápida, mas os tomadores da decisão podem não conhecer o contexto todo | ou | Envolver todo mundo na tomada de decisão. As pessoas reúnem inputs valiosos e se comprometem com a solução, mas gastam tempo e energia demais montando uma solução que atenda todos |
Seis parâmetros para escalar conflitos corretamente
Alguns conflitos, as pessoas correm para escalar até o líder – unilateralmente, rápido demais e, em geral, de uma forma que produz decisões subótimas e mina a confiança entre as partes envolvidas. Outros conflitos deveriam ser escalados para o nível certo de liderança por terem implicações estratégicas, mas não o são, ao menos não em tempo hábil – e a agilidade estratégica da empresa fica comprometida. Em todos os casos, aprendizados valiosos e insights estratégicos se perdem em meio às disfunções.
Seis diretrizes podem ajudar as organizações as escalar conflitos corretamente, ou seja, reduzindo atritos organizacionais, eliminando escaladas desnecessárias, melhorando a tomada de decisão, fortalecendo relacionamentos de trabalho em toda a organização e aumentando a agilidade estratégica.
- Defina diretrizes claras sobre quando e onde escalar: Ao identificar os tipos de conflitos que os funcionários devem escalar imediatamente versus aqueles que devem tentar resolver sozinhos, as organizações capacitam seus funcionários a lidarem com eles com confiança e eficiência. A existência de orientações claras sobre quando levar um desacordo a uma instância superior tira uma pressão significativa sobre os indivíduos e equipes envolvidos, tornando a situação menos tensa naquele ponto. As partes em conflito precisam saber que podem, e devem, escalar os problemas sempre que a perspectiva da alta gestão for necessária para tomar uma boa decisão.
Ocasionalmente, conflitos urgentes e estrategicamente vitais precisam ser escalados de imediato. Mas a maioria dos conflitos só deve ser escalada depois que ambas as partes tenham feito esforços extensos para alcançar uma solução. Nesses casos, a escalada torna-se adequada como válvula de segurança para o processo de administração de conflitos: quando as pessoas diretamente envolvidas não conseguem chegar a uma solução, mesmo após tentarem resolver o problema de forma completa e sistemática, elas precisam ter a quem recorrer.
Decidir para quem o conflito deve ser escalado pode ser simples em alguns casos, como quando duas partes se reportam à mesma pessoa. Em muitos casos, porém, eles terão superiores diferentes e devem considerar não apenas quem tem autoridade para decidir, mas também quem tem o conhecimento para ajudar a tomar a melhor decisão para a organização. Sempre que possível, o problema deve ser escalado simultaneamente com e para todos que precisam estar envolvidos. Isso deve ser feito presencialmente quando possível e por interação virtual em tempo real quando não for. O e-mail só deve servir para compartilhar informações e manter um registro do processo, não como substituto do diálogo. - Exija que as pessoas documentem seus esforços de resolução antes de escalá-los: Para viabilizar escaladas eficientes e eficazes, espera-se que os envolvidos documentem e expliquem como tentaram resolver o problema por conta própria. Essa exigência serve a dois propósitos significativos.
Primeiro, é uma forma eficaz de conter uma onda de escaladas desnecessárias quando aqueles em conflito não tentaram resolver isso por conta própria. Quando os gestores aceitam que resoluções de discordâncias subam até eles, eles enviam uma mensagem poderosa — mas não intencional — aos seus reportes de que a melhor forma de fazer as coisas acontecerem é escalar ao primeiro sinal de conflito. Em contraste, ao rejeitar essa postura, é enviada uma mensagem igualmente poderosa e explícita de que se espera que os membros da equipe trabalhem pelo processo de resolução de problemas antes de recorrer a uma instância superior. Essa prática também constrói em toda a organização o entendimento de que as partes originais de um conflito têm a responsabilidade primária de resolvê-lo — e que a escalada não é a forma esperada de os indivíduos se livrarem dos problemas que surgem em suas mesas.
Segundo, essa prática garante que, quando os gestores aceitam que um problema escale, estejam preparados para tomar uma decisão ótima no menor tempo possível. Muitas vezes, as pessoas não conseguem captar os insights gerados durante os esforços de resolução de problemas. Após trabalhar minuciosamente nele, mas não conseguir chegar a um acordo, os discordantes devem apresentar ao gestor o problema com todos os dados, contexto e possíveis soluções consideradas no esforço de sua resolução. - Exija escaladas bilaterais: Na maioria das organizações, é comum ver cada parte envolvida em conflito escalar unilateralmente o problema em sua própria cadeia de gestão, muitas vezes simpática a essa prática, apresentando o problema de modo que cada um receba a resposta que deseja. Quando um problema é unilateralmente escalado separadamente por duas ou mais cadeias de gestão, vários problemas tendem a ocorrer. Primeiro, cada gestor recebe informações incompletas e frequentemente tendenciosas, que podem levá-lo a tomar decisões divergentes, ruins ou difíceis de implementar, com consequências potencialmente sérias para a organização. Além disso, ao escalar para seus superiores de forma separada reforça-se a mentalidade adversarial que pode ser tão contraproducente para a resolução eficaz de problemas.
Conflitos no ambiente de trabalho frequentemente assumem uma dinâmica em que cada lado quer vencer a discussão em vez de chegar à melhor solução possível. Exigir que as pessoas se dirijam juntas à chefia pode mitigar isso. Se eu escalar sozinho para meu gestor, estou buscando aprovação ou apoio para minha resposta, não para a sua. Se formos obrigados a escalar juntos, é muito mais difícil que o debate aconteça de forma incompleta ou tendenciosa. (Veja “Estrutura para Escalada Conjunta.”) Escalar juntos força ambas as partes a se envolverem com os argumentos do outro de forma mais empática e a fornecer uma explicação mais robusta do conflito aos tomadores de decisão seniores. Dar aos líderes e gestores um conjunto abrangente de perspectivas sobre as raízes do conflito, bem como os esforços anteriores para resolvê-lo e como e por que esses esforços falharam, os capacita a tomar uma decisão em bases consistentes. - Incentive os funcionários a limitarem o escopo das escaladas: Em vez de abdicar completamente da responsabilidade de resolver um problema e simplesmente pedir aos líderes seniores que tomem uma decisão, os indivíduos em conflito podem solicitar orientação sobre como devem resolver seu desentendimento. Isso pode incluir pedir informações adicionais que ajudem a resolver o problema ou sugestões de outras opções a considerar. Às vezes, obter clareza sobre como priorizar os critérios de decisão e quem é responsável por executar a decisão pode ajudar. E os gestores devem estar prontos para oferecer aos membros da equipe coaching sobre como ter conversas mais eficazes com os colegas.
Por exemplo, considere o caso de gerentes de produto que não conseguem concordar sobre quais recursos incluir em um novo produto. Em vez de escalar pedindo uma resposta definitiva sobre quais recursos manter ou descartar e se o lançamento deveria ser adiado, eles reconheceram que seu desacordo se resumia a uma grande decisão estratégica: priorizar a rapidez no mercado ou lançar um produto claramente superior ao da concorrência. Consequentemente, eles foram juntos aos chefes de P&D e marketing para solicitar orientações sobre como ponderar essas prioridades como critérios de tomada de decisão. Em seguida, eles exploraram e debateram opções, mas ainda assim não conseguiram chegar a um acordo. No entanto, eles conseguiram restringir um conjunto complexo de opções e concessões a uma escolha entre duas alternativas distintas com diferentes perfis de risco-recompensa. No processo, eles fizeram 90% do trabalho necessário para uma escolha com base firme e mostraram um resumo claro de sua análise para uma decisão executiva final.
Escalar com escopo limitado permite obter melhores resultados de forma mais eficiente. Isto também incentiva as pessoas a desenvolverem habilidades criativas de resolução de problemas e conflitos, além de fortalecer os laços de colaboração. - Use a escalada como uma oportunidade para receber orientação: Quando se escala um problema para um gestor, ele tende a assumir total responsabilidade por encontrar uma solução, tomar a decisão e depois comunicar essa decisão sem explicar claramente como ou por que chegou a ela. Às vezes, pressões extremas de tempo ou questões sensíveis atuam como fatores limitantes para oferecer uma explicação. Mas, sempre que possível, os gestores devem aproveitar as valiosas oportunidades de aprendizado e coaching que surgem durante o processo.
Quando os problemas são escalados, líderes e gestores têm uma oportunidade de ouro para ajudar seus subordinados a melhorarem sua capacidade de resolver problemas em colaboração com seus colegas. Isso inclui ajudar as pessoas a desenvolverem a propensão e disciplina mental para enxergar conflitos e questões sob a perspectiva de outras — e elevar seu pensamento além do próprio papel, equipe e departamento, cultivando uma visão empreendedora das questões. - Use a escalada como uma oportunidade de aprendizado organizacional: Escaladas, documentadas sistematicamente, fornecem uma fonte rica de dados sobre conflitos organizacionais. Reconhecer que alguns tipos específicos são prevalentes pode revelar questões subjacentes que afetam produtividade, eficiência, criatividade e moral.
Os líderes devem monitorar os tipos de questões que são escaladas para obter insights sobre a saúde da organização e do mercado externo. Pessoal de vendas, desenvolvimento corporativo e compras, assim como outros que se envolvem com stakeholders externos, podem fornecer contribuições valiosas para ajudar a evitar que a liderança e o back office se tornem excessivamente fechados. O conflito frequentemente surge quando diferentes partes de uma organização recebem diferentes sinais de clientes, concorrentes e fornecedores. Ele é uma fonte inestimável de informações sobre o ambiente externo.
Um processo formal de escalada que registre padrões de conflito pode capturar essas informações e ajudar a destilá-las em insights estratégicos. Analisar e abordar conflitos recorrentes também representa uma fonte inexplorada de inovação operacional para muitas organizações. Quando os líderes da empresa resolvem continuamente conflitos recorrentes advindos de políticas e procedimentos divergentes dentro de diferentes unidades operacionais, perdem a oportunidade de padronizar ou harmonizar processos e práticas internas para maior eficiência e maior colaboração entre as unidades de negócio.
Resolva as questões logo que o conflito surge
A capacidade de resolver os problemas – ou a maioria deles – logo que surge o conflito é fundamental para uma escalada eficaz. Porém, muitas vezes, pessoas envolvidas em conflitos se fixam em uma posição (alegando exigências e resultados financeiros) e depois buscam a concordância ou aquiescência dos demais. Esse tipo de debate de soma zero é caracterizado por um impasse ou um processo relutante de concessões incrementais até que se alcance uma solução de “dividir as diferenças”. Além de gerar resultados ruins nos negócios, esse processo geralmente tensiona os relacionamentos e, eventualmente, os prejudica de maneiras duradouras.
Conflitos podem se tornar personalizados, uma dinâmica que os líderes devem trabalhar para minimizar. Uma abordagem sistemática para a escalada, como a que propusemos, pode desenvolver as habilidades dos membros da equipe em gestão de conflitos e resolução conjunta de problemas. Mas os líderes também devem sempre comunicar, tanto em palavras quanto em ações, a importância de respeitar diferentes perspectivas, objetivos e formas de trabalhar como parte de um empreendimento coletivo maior.
Uma abordagem melhor do que argumentar com base em posições fixas é aquela que envolve brainstorming conjunto de múltiplas possíveis resoluções antes de buscar um acordo sobre uma decisão final. Essa prática elimina a dinâmica do “eu contra você” que frequentemente impede o acordo, e leva a novos insights e melhores soluções. Sempre que possível, no ponto de conflito, os envolvidos devem fazer o seguinte:
- Tratar o desacordo como um desafio compartilhado e um recurso que pode ser aproveitado para chegar a uma solução verdadeiramente ótima. Para evitar que o conflito se torne personalizado, é preciso apenas destacar o fato de que as partes compartilham um objetivo comum.
- Evitar discussões limitantes e polarizadoras sobre qual é a abordagem “certa”. Em vez disso, devem se envolver em uma exploração detalhada dos prós e contras relativos de diferentes abordagens.
- Não presumir que as soluções propostas até ali são as únicas possíveis. Que pensem juntos em alternativas.
- Considerar maneiras criativas de integrar vários elementos de diferentes soluções propostas.
A capacidade de resolver conflitos de maneira eficaz na origem e um processo formal de escalá-los para a liderança andam lado a lado. A primeira garante que a segunda não seja sobrecarregada por escaladas desnecessárias; já o segundo fornece uma válvula de segurança eficaz para o primeiro. Juntos, eles permitem que organizações que atuam em ambientes complexos e dinâmicos maximizem a agilidade estratégica, a colaboração interna e a velocidade de execução.
Fonte: Jonathan Hughes e Gabriella Salvatore/ MIT Sloan, com adaptações da MundoCoop












