Dois anos atrás, poucas eram as empresas que adotavam um regime de trabalho que não se encaixasse no modelo 100% presencial. Por isso, quando a necessidade de distanciamento social levou o trabalho do escritório para a casa, o impacto inicial trouxe diversas perguntas que, inicialmente, não possuíam resposta.
Agora, em um momento de retomada, muitos se questionam se esse modelo veio para ficar ou está com os dias contados. Para muitos, o modelo home office abriu um leque de oportunidades e benefícios que foram além da qualidade de vida. E perder tal conquista vem como um balde de água fria para aqueles que já haviam se adaptado ao novo formato de trabalho.
Este panorama é confirmado pela pesquisa O Futuro da Vida no Trabalho. Realizada pela Sodexo em 8 países, o estudo traz um panorama sobre a atual configuração do mercado de trabalho, colocando uma luz sobre a reconfiguração criada pelo regime home office e híbrido que virou regra nos últimos 24 meses.
Segundo o estudo, no Brasil 92% dos entrevistados gostariam de continuar no regime de trabalho home office, frente aos 81% registrados em outros países. Para Vânia Montenegro, diretora de serviços de RH da Employer, as razões para que esse número seja tão alto são bem claras.
“Há diversos motivos para que os trabalhadores prefiram o home office, como por exemplo, a otimização do tempo com deslocamento, que pode ser bastante considerável trabalhando de casa. Além disso, outro motivo seria que parte dos profissionais muitas vezes se sentem mais produtivos em suas residências por não serem constantemente interrompidos por seus colegas, podendo focar em suas tarefas”, ressalta.
De fato, com o regime home office uma nova fase profissional e pessoal começou na vida de milhares de pessoas. Se antes eram perdidas 2 ou 3 horas do dia no deslocamento até o trabalho, hoje esse tempo se converte em relacionamento com a família, participação na vida dos filhos e ainda, na utilização do tempo para atividades que promovem o bem estar: consumo de cultura, prática de exercícios e outros; mudança positiva que foi destacada por 45% dos entrevistados. Ainda neste “pacote” de benefícios trazidos pelo home office, os colaboradores ressaltam outros pontos como a redução do estresse e cansaço (49%), a segurança (50%) e a possibilidade de evitar o transporte público (55%).
Um novo olhar
A partir de tais transformações acerca do regime home office, o posicionamento dos funcionários diante do mercado se modificou. Hoje, as necessidades vão além de um salário digno e benefícios presentes na CLT, e o colaborador busca empresas que impactarão positivamente não só a si mesmos, mas também aos membros de suas famílias.
“As pessoas veem essa mudança na configuração do mundo do trabalho como positiva e querem estar em uma empresa que vise qualidade de vida em toda a sua jornada, durante e após o expediente e ainda mais, que esses benefícios atendam também seus familiares”, destaca Patrizia Garuzi, gerente de Inteligência de Mercado da Sodexo Benefícios e Incentivos.
Esse novo olhar sobre o trabalho já impacto a busca por um novo emprego. Hoje, no processo de recolocação e busca por uma nova vaga, 21% dos profissionais destacam a flexibilidade da jornada como um ponto de destaque, seguido pelos serviços de apoio voltados à saúde e bem-estar (17%) e benefícios como seguro de saúde, creche e vale-alimentação (16%).
Somado a isso, o maior benefício que consolidou o modelo como favorito por muitos foi a possibilidade de se trabalhar em qualquer ambiente. Com o início da flexibilização, espaços de coworking deram um novo fôlego para a jornada de trabalho, unindo-se à possibilidade de trabalhar durante uma viagem, nos grandes centros e em lugares afastados, com muitos trocando as cidades pelo campo. Com o home office, não apenas uma vida mais ativa se tornou viável, mas também a chance de uma manutenção das relações, possibilitando novas experiências possíveis apenas em um momento onde o profissional se tornou mais “livre”.
Perante tal posicionamento do colaborador, Garuzi ressalta a importância de iniciativas corporativas ouvirem o que o seu quadro de funcionários tem a dizer, colocando-os no centro das atenções. Ainda mais, em um contexto onde empresas estão retornando para o modelo 100% presencial, indo de encontro com a vontade do colaborador de permanecer em casa.
“Diante desta nova configuração no mundo do trabalho, é preciso que as companhias invistam na gestão centrada no colaborador, colocando as pessoas no centro de tudo o que faz. Isso significa entender e atender às necessidades e/ou aspirações dos funcionários para garantir uma experiência de valor em toda sua jornada na empresa”, afirma.
Futuro do trabalho
À vista de tantas reformulações, prever qual será o futuro do trabalho é uma tarefa quase impossível. Porém, perspectivas apontam uma tendência de um mercado cada vez mais híbrido, onde atividades específicas continuem a existir em home office, enquanto outras retornam aos escritórios.
Para Vânia Montenegro, este quadro deve fomentar uma reformulação de posicionamento de empresas e organizações, de forma a acompanhar as vontades do colaborador, criando um diálogo que resulte em ganhos para amas as partes. Em contrapartida, aqueles que não se adaptarem ao novo modelo poderão enfrentar um futuro desafiador, que afete inclusive a longevidade dos negócios.
“Mesmo com retomada de trabalho, devemos ter em mente que as mudanças irão continuar e a tecnologia se tornará cada vez mais presente nas relações de trabalho para auxiliar nos processos das empresas. Além disso, com as mudanças recorrentes, é necessário estar apto a se adaptar a novos cenários, pois profissionais e empresas que se mantêm estagnados, tem tendência de deixar de existir”, afirma.
Com tais demandas, entender o outro passará a ser essencial para a continuidade das atividades. E ouvir os dois lados, ponderando a melhor configuração – sempre pautada nas leis do trabalho – que irá possibilitar um ambiente favorável para todos. “O importante é que a comunicação aconteça com transparência, e que a tentativa de equilibrar com um modelo híbrido, por exemplo, aconteça quando possível”, Montenegro finaliza.
Sejam quais for os próximos passos, é fato que o futuro do trabalho levará consigo um legado deste período pandêmico. Não apenas na forma como os processos são realizados, mas principalmente nas relações de trabalho, que buscarão um maior entendimento entre as partes, criando uma relação de parceria entre lideranças e colaboradores.
Por Leonardo César – Matéria publicada originalmente na edição 106 da Revista MundoCoop
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