A preocupação com as sucessões nas cooperativas agropecuárias e a atração de mais jovens para o cenário do cooperativismo tornou-se um dos maiores desafios das cooperativas. A Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag) e o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) indicam que o número de jovens trabalhando no campo despencou na última década.
Segundo o Anuário Estatístico da Agricultura Familiar, em 2012 o Brasil tinha 4,7 milhões de jovens de 16 a 32 anos ajudando a família nas roças. Porém, em uma década, o campo perdeu 1 milhão de jovens trabalhadores. São quase 4 milhões de propriedades rurais em todo o país, representando 77% dos estabelecimentos agrícolas.
Algumas das questões com que as cooperativas precisam lidar é de como se conectar aos jovens e em seguida prepará-los para suceder os seus pais nas cooperativas.
É preciso levar em conta, que segundo o Anuário do Cooperativismo de 2023, as lideranças do cooperativismo brasileiro, são em 56% com a faixa etária acima dos 50 anos e 80% acima dos 40 anos. Algumas ações têm sido feitas para diminuir as distâncias entre as gerações, estão entre eles os programas, os cursos e até Núcleos de jovens, como no caso da Coplacana (Cooperativa dos Plantadores de cana do Estado de São Paulo).
A cooperativa resolveu criar o Núcleo Jovem Coplacana após detectar a falta de engajamento dos jovens e a maturidade de seus cooperados. “O NJC surgiu de uma necessidade da Coplacana atrair essa nova geração de produtores rurais para dentro da cooperativa. A idade média dos cooperados varia entre 50 e 60 anos e identificamos que, no nosso cadastro, não tínhamos a informação se esses produtores tinham filhos, netos e sobrinhos tocando a propriedade. Pensando nisso e na perenidade dos negócios, criamos o Núcleo Jovem para conhecer esse jovem interessado no futuro do agro”, explica Mariane Natera, Analista de Inovação da Coplacana.
Os problemas com a falta de jovens na Coplacana ficaram evidente em 2020, quando a cooperativa recebeu 20 convites para os jovens participarem do Congresso Internacional de Agricultura, mas encontrou dificuldades para achar os interessados. Mariane conta que o Núcleo Jovem é uma iniciativa da Cooperativa atingir jovens sucessores de produtores rurais. Para participar é preciso que eles sejam cooperados, filhos, netos ou sobrinhos de cooperados, com idades entre 16 e 35 anos.
Um dos pontos focados pelo Núcleo é proporcionar informações aos filhos, aos familiares cooperados, e aproximar as gerações. O maior desafio do Núcleo é tratar o tema da sucessão familiar, que ainda é um tabu, principalmente entre as pessoas que serão sucedidas. Silvia Beltrame, coordenadora da gestão 2024, lembra que outro obstáculo é conseguir conciliar algumas atividades com a disponibilidade de alguns membros.
Diagnostico preocupante
Um dos obstáculos do Núcleo era reunir os jovens cooperados que se encontravam distantes da matriz, que fica em Piracicaba, no interior de São Paulo. Outros envolviam o acesso à internet, que é dificultado em algumas regiões e as ferramentas necessárias.
Após muitas pesquisas, a cooperativa descobriu que a sucessão familiar ocorria depois dos 35 anos, e que os jovens tinham uma visão negativa sobre a profissão agrícola.
Com base nessa conclusão, a Coplacana resolveu investir na capacitação dos jovens com o objetivo de despertar o interesse dos filhos darem continuidade as cooperativas familiares, tanto assumindo cargos internos, quanto para se tornarem proprietários rurais.
O Núcleo possui uma coordenação que é eleita anualmente pelos próprios jovens participantes. Ele reúne mais de 140 membros ativos em 17 filiais.
“Mensalmente, são realizadas duas atividades, sendo uma delas presencial e, a outra, online, para atrair o maior número de jovens do maior número de filiais da cooperativa. A intenção é que o jovem se interesse pelo agro, se aproxime da Coplacana e entenda todas as áreas que o agronegócio envolve, não só a produção vegetal ou animal, mas também a gestão de pessoas, marketing, jurídico, crédito, financeiro. Trabalhamos com diversos temas, além do manejo de culturas”, lembra Natera.
A ideia é ir além da informação em direito, administração e liderança. Mas mudar a mentalidade dos jovens, fazendo com que vejam nas cooperativas agropecuárias um caminho positivo.
A cooperativa tem colhido frutos, entre eles por meio das atividades, conseguiu atingir filiais distantes da matriz em Piracicaba. “Notamos diferenças principalmente na participação desses jovens. Um exemplo é o COPLACAMPO, nosso maior evento. Durante a semana, mais de 30 membros trabalham no estande multiplicando informações sobre o NJC. O feedback deles e dos pais é muito positivo. Vimos, também, que, na hora de apresentar ou participar de painéis, eles estão mais desenvoltos, com uma melhor oratória”, diz Mariane.
As ações
As ações abordam temas técnicos de produção, cursos de gestão de propriedades, imersões em oratória, liderança, direito sucessório, inteligência emocional, visão empreendedora além de consultorias em sucessão familiar.
Natera explica que o Núcleo prepara os jovens oferecendo palestras sobre assuntos de relevância, como sucessão familiar, gestão de propriedades, marketing pessoal, modelos de negócios inovadores e outras culturas.
“Também visitamos propriedades com o intuito de fazer networking, falar sobre cooperativismo. A ideia é valorizar essas pessoas, mostrando que elas não estão sozinhas. O Núcleo é uma rede de apoio na qual outros produtores também compartilham suas vivências”, lembra Mariane.
Silvia lembra que as atividades estão sempre voltadas à sucessão familiar e o agronegócio. “Quando a pessoa começa a estudar mais sobre e entender melhor essa sucessão, percebemos que o diálogo com os pais muda, e o envolvimento com eles e a propriedade também; além de realizar atividades envolvendo os pais e filhos(as)”, conta.
O futuro
O Núcleo não pretende parar por aqui, possui metas ambiciosas como por exemplo, alcançar todas as 35 localidades distribuídas em 34 cidades e formar pelo menos um membro de cada filial
“Nas atividades presenciais, queremos focar na diversificação, trazendo novas oportunidades de negócios, além de fortalecer o conhecimento sobre as culturas que os jovens já conhecem. No online, procuramos nos profissionalizar por meio da contratação de uma trilha exclusiva de capacitação de oito meses, com certificado, a respeito de desenvolvimento pessoal”, planeja Mariane.
Silvia relata que para o próximo ano pretendem continuar focando na tecnologia do campo, variedade de culturas, visitas técnicas e procurar parcerias que venham a acrescentar e facilitar a vida dos futuros produtores.
As expectativas é que cada vez mais jovens participem, para que o Núcleo fique mais robusto. “Queremos que eles se preparem e se tornem mais fortes no mercado”, explica Mariane.
“Temos as perspectivas de pessoas que querem aprender, querem entender e serem bons profissionais, e temos a expectativa de oferecer todo o apoio e desenvolvimento necessário para isso acontecer”, finaliza Silvia.
Por Priscila de Paula – Redação MundoCoop
Matéria exclusiva publicada na Revista MundoCoop edição 116
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