A expressão “Brasil é um país continental” não existe à toa. Com dimensões gigantescas, o país conquista os olhares do mundo com sua diversidade econômica e cultural. Mas, além disso, possui nas particularidades de suas regiões diferentes potenciais que atraem inúmeros negócios nacionais e internacionais. Como é o caso do Nordeste, mais especificamente Pernambuco.
Grande produtor, importador e exportador de produtos, em sua maioria agrícolas, Pernambuco é sede de um dos portos com maior representatividade comercial do Brasil, o Complexo Industrial Portuário de Suape, que movimenta anualmente mais de 23 milhões de toneladas de cargas e é um forte impulsionador do desenvolvimento do Nordeste.
Conectando o litoral nordestino com as principais rotas marítimas mundiais, o Porto de Suape também reflete a importância das comunidades pernambucanas e de como a atuação coletiva é peça indispensável para o avanço de uma região, ainda mais o avanço sustentável e a longo prazo.
Atualmente, o Porto ocupa um território de 13,5 mil hectares e 59% dele é destinado à preservação dos biomas ali encontrados. Desde 1995, o Viveiro Florestal de Suape funciona como uma das principais engrenagens dessa área, concentrando atividades de produção de mudas nativas de Mata Atlântica para ações de reflorestamento. O destaque, então, vai para a participação que mantém esse espaço ativo.
Parte importante da produção desse viveiro é realizada por cooperados da Cooates – Cooperativa de Trabalho Agrícola, Assistência Técnica e Serviços. Em entrevista para o Diário de Pernambuco, o gestor do viveiro e engenheiro agrônomo José Mário de Souza Flor e Sá explicou a importância dessa parceria. “Os residentes conhecem a mata como ninguém e ajudam a encontrar as sementes das espécies. Elas são trazidas para cá e passam por todas as etapas de beneficiamento, germinação, ensacamento, rustificação, até que a muda esteja apta para plantio em áreas de restauração florestal determinadas pela Diretoria de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Suape”.
Através de um processo licitatório, a cooperativa atua no viveiro desde 2018. Hoje, eles executam 400 mil mudas de produção e 750 mil mudas de manutenção, mantendo o maior viveiro florestal do Norte e Nordeste. “A responsabilidade de estar à frente de um projeto desses não é só ambiental, mas também de geração de vida e de oportunidade para as pessoas, uma vez que estamos à frente de uma cooperativa que tem tido muito sucesso com seu trabalho e com sua evolução”, conta José Claudio, presidente da Cooates, à MundoCoop. O espaço verde também irá implementar ações para promoção da cidadania e do desenvolvimento sustentável e, com o auxílio da cooperativa, elevar ainda mais seu impacto.
“Uma coisa é importante destacar: nós só construímos isso coletivamente porque o que temos de melhor aqui na cooperativa são as pessoas. Se a gente evolui, as pessoas evoluem junto. Se a cooperativa cresce, as pessoas crescem junto. A grande diferença do negócio de cooperativa é a coletividade”
José Claudio, presidente da Cooates
NA RAÍZ DO COOPERATIVISMO
A escolha de ter uma cooperativa a frente do projeto do Viveiro Florestal de Suape não aconteceu por acaso. Pernambuco é um grande atuante no cooperativismo, possuindo cooperativas de diversos ramos e tamanhos que encontram no Estado um ambiente fértil para se desenvolverem e, assim, desenvolverem também as cidades, municípios e comunidades.
A Cooates é um grande exemplo desse contexto. A cooperativa foi criada em 13 de maio de 2000 por técnicos da agropecuária com o intuito de gerar emprego para aquele grupo de jovens que estava ficando sem oportunidades. Hoje, a Cooates possui 23 cooperados e mais de 2400 famílias beneficiadas com a atuação, que se divide em diversas frentes, todas baseadas na sustentabilidade.
José Cláudio compartilha que, mesmo depois de 23 anos, o propósito da cooperativa continua o mesmo e esse é o segredo de tamanho sucesso. “Claro, também fomos evoluindo conforme a necessidade de mercado. Evoluímos com tecnologias, evoluímos com a relação de produção e vamos evoluindo na relação com o cooperado, na relação com os agricultores e com novas oportunidades”.
Estar comprometido com seu propósito ao mesmo tempo que visa o futuro tem feito a diferença na Cooates, que já sabe qual caminho pretende traçar daqui para frente. A atuação na geração de emprego e renda, na perspectiva de elaboração de projetos, consultorias e tutorias com os cooperados permanecerá, mas eles querem ir além, com muita consciência das barreiras que precisam ser ultrapassadas.
Sobre essa questão, o presidente explica que o maior desafio que a cooperativa ainda enfrenta é a conscientização das pessoas em relação à proteção do meio ambiente e seus ecossistemas. Ou seja, a educação ambiental. “Temos que mostrar que a produção sustentável é viável, é importante e mantém a nossa biodiversidade firme, viva, intocável. E, principalmente, gera recurso, gera oportunidade, gera renda. Então, enfrentar essa relação na produção do agro sustentável é algo que ainda precisa ser bem trabalhado, com calma, com dedicação. Buscando sempre uma relação do homem-natureza e da natureza para a nossa mesa”.
FUTURO
Segundo o Anuário Coop 2022, o Brasil possui, atualmente, mais de 18 milhões de cooperados espalhados em mais de 5 mil cooperativas. Muitas delas gigantes do agronegócio. Ao mesmo tempo, o país possuí uma imensa necessidade de atenção constante com as questões ambientais, um problema global que se intensifica por aqui pela grandeza dos recursos naturais existentes.
O cenário recente também fomenta as conversas sobre o ESG nas empresas, de diferentes segmentos, muitas vezes pensando em reverter um impacto já causado ou minimizar possíveis consequências.
Seja nas discussões passadas, do presente ou tendências futuras e com diferentes conceitos, a sustentabilidade sempre foi um fator decisivo. Mas por que a prática ainda caminha tão longe da teoria enquanto existem exemplos tão reais e efetivos como o da Cooates? Dentro ou fora do agro, será que não está nas pequenas cooperativas o tão procurado “passo-a-passo” para se tornar sustentável de verdade? E mais, por que não investir em cooperativas menores através de parcerias dentro do próprio sistema cooperativista?
Pequenas apenas na nomenclatura, elas carregam uma visão transformadora que se compara as gigantes. Da excelência de resultados ao impacto social. “A nossa cooperativa tem se espelhado no que tem de melhor, na busca por conhecimento, por tecnologia, por dados, na busca de iniciação científica e de informação. Esse é o nosso grande exemplo para as outras cooperativas”, complementa José Claudio.
Ainda, trazer o futuro para o agora também faz parte dos planos da cooperativa. “O próximo passo é desenvolver aplicativos e organismos que possam gerar oportunidade, com novos produtos por exemplo, patentear tudo originário da nossa biodiversidade e, assim, conseguir conquistar mercados. Além disso, queremos trabalhar com inovação, desenvolver novos empreendimentos e tecnologias sustentáveis que possam gerar oportunidade de geração de renda para a nossa cooperativa”, enfatiza o presidente.
Uma cooperativa de Pernambuco que surgiu da necessidade aliada a uma boa ideia alcançou duas décadas de existência, sobreviveu perante as adversidades e crises nacionais e globais e se estabeleceu a partir da agricultura completamente sustentável. Provas de que é possível não faltam. E talvez tenha chegado o momento de olhar para dentro antes de se espelhar nos de fora. O Brasil é riquíssimo e não só no fator econômico.
Para finalizar, José Claudio, presidente da Cooates, divide a fórmula do êxito cooperativista. “Continuar com excelência é sempre buscar envolver as pessoas e mostrar que há diferentes caminhos a serem traçados. A solução não é feita só por uma pessoa. É no coletivo que a gente encontra as saídas”.
Por Fernanda Ricardi – Matéria exclusiva publicada na Revista MundoCoop edição 111
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