Se há algumas décadas a educação corporativa era considerada um luxo ou um gasto extra reservado a poucas empresas, hoje ela é parte essencial da estratégia das organizações. Em um mundo marcado pela velocidade, pela digitalização e pela complexidade dos desafios sociais e ambientais, investir em pessoas deixou de ser opcional e se tornou decisivo para a sobrevivência e prosperidade dos negócios.
A transformação no olhar das empresas para o aprendizado acompanha a evolução da própria sociedade. O conhecimento deixou de ser tratado como etapa isolada para se tornar um ativo em constante renovação, acompanhando todas as fases da vida profissional. E, nesse contexto, o treinamento passou de ser apenas uma atualização técnica: agora, é um investimento em competitividade e em construção de propósito.

“A formação tem desempenhado papel estratégico na renovação geracional do setor, atraindo jovens e fortalecendo a identidade cooperativa.” – PABLO MURTA, COORDENADOR DO CURSO DE COOPERATIVISMO DA UFV
Esse movimento também reflete uma mudança cultural, especialmente no cooperativismo. A nova lógica de gestão ganha contornos ainda mais expressivos ao se basear na coletividade e no desenvolvimento humano, é o que conta Pablo Murta, coordenador do curso de Cooperativismo da Universidade Federal de Viçosa (UFV), ao destacar que a educação, nesse contexto, precisa criar condições para que as pessoas se reconheçam como parte ativa dos processos organizacionais.
A lógica do resultado e da personalização
Na era da velocidade, a lógica da educação corporativa mudou. Se antes prevaleciam cursos longos e genéricos, hoje cresce a demanda por formações curtas, personalizadas e de aplicação prática imediata. Esse modelo responde à necessidade de resultados concretos em um cenário de mudanças rápidas e intensas.
Segundo Leonidas Albano, coordenador da Incubadora de Empresas da PUC Goiás, essa transformação explica por que a educação corporativa deixou de ser vista como gasto e passou a ser considerada como um ativo estratégico para a competitividade das organizações. Para ele, a chave desse processo está na personalização dos métodos de ensino e na capacidade de gerar resultados práticos que se conectam diretamente às necessidades de cada empresa. “O que se busca hoje são intervenções pontuais, personalizadas e com altíssimo impacto. Quando o resultado é claro e mensurável, a formação passa a ser reconhecida como investimento”, afirma.
Esse cenário mostra que a educação corporativa deve ser compreendida não apenas como treinamento, mas como um método de gestão, capaz de alinhar estratégia, cultura e inovação. As empresas que conseguem integrar esse olhar criam ambientes mais dinâmicos, prontos para enfrentar a complexidade e se diferenciar em mercados competitivos.
Universidades e empresas mais próximas
O fortalecimento da educação corporativa depende também da capacidade das universidades de se aproximarem do mercado.
A educação corporativa também tem aproximado a academia do setor produtivo. O papel das universidades já não pode se limitar à transmissão de conhecimento teórico: é preciso criar soluções conjuntas, aplicáveis e transformadoras.
Para Pablo, essa adaptação é constante. Ele acrescenta que a universidade deve ser capaz de traduzir as demandas do setor produtivo em conhecimento científico e, ao mesmo tempo, transformar a produção acadêmica em práticas que impactem diretamente as organizações. “Buscamos adequar a formação às demandas do setor e às competências exigidas pelo mercado de trabalho. Essa adaptação garante que nossos egressos estejam preparados para enfrentar desafios contemporâneos”, ressalta.
Leonidas Albano complementa dizendo que modelos de inovação aberta, comuns em países desenvolvidos, começam a se consolidar também no Brasil. O coordenador ainda ressalta que a universidade deve ser capaz de traduzir as demandas do setor produtivo em conhecimento científico e, ao mesmo tempo, transformar a produção acadêmica em práticas que impactem diretamente as organizações. “A integração entre academia e empresas não apenas produz conhecimento, mas também cria ferramentas práticas para transformar a gestão e a inovação”, complementa.
“As metodologias ativas e os modelos de inovação aberta já são uma realidade. Eles unem universidade, empresas, governo e investidores num mesmo ecossistema de conhecimento, em que o aprendizado nasce da prática e se consolida na troca.” – LEÔNIDAS ALBANO, COORDENADOR DA INCUBADORA DE EMPRESAS DA PUC/GO

O impacto dessa integração pode ser visto nos profissionais que hoje ocupam posições estratégicas em cooperativas e organizações. Eles carregam uma formação que alia conhecimento técnico, visão crítica e experiência prática, tornando-se agentes de transformação nos territórios em que atuam.
Esse resultado evidencia a educação, quando conectada à realidade do mercado, como uma ferramenta de desenvolvimento de indivíduos, e sobretudo, de criação de lideranças capazes de promover mudanças estruturais. A tradução dessa forma de conhecimento acadêmico em soluções aplicáveis estabelece as universidades como uma ponte de relevância social e amplia a capacidade das organizações de responder a desafios complexos, do campo à cidade.
Educação como base da sustentabilidade
Assim como a aproximação entre universidade e mercado fortalece a gestão, ela também amplia o impacto social da educação. O discurso empresarial sobre sustentabilidade não se sustenta sem profissionais preparados para lidar com a complexidade dos temas socioambientais. É nesse ponto que a educação corporativa ganha ainda mais relevância.
Esse processo mostra a educação como motor do desenvolvimento econômico e social. Profissionais bem preparados interpretam cenários complexos, tomam decisões embasadas e atuam de forma colaborativa, o que acaba por fortalecer a capacidade das organizações de gerar valor coletivo. Esse alinhamento entre teoria e prática é o que garante que a aprendizagem se traduza em impacto real nas comunidades e nos setores em que esses profissionais estão inseridos.
Albano reforça que é preciso pensar a formação de forma ampla, indo além do indivíduo. Ele destaca que a educação precisa alcançar também os contextos familiares e comunitários, pois o aprendizado só se sustenta quando está enraizado em uma rede de relações sociais. “Pensar a formação do ser humano é pensar em uma educação que vai além do indivíduo, alcançando o contexto social em que ele está inserido”, aponta.
Cooperativismo como inspiração para o corporativo
Conectando-se ao desafio da sustentabilidade, o modelo cooperativista surge como inspiração para empresas de todos os segmentos. Ao colocar a coletividade no centro, ele estimula a circulação de conhecimento, a colaboração entre equipes e o engajamento com valores comuns.
Leonidas Albano vê nessa lógica uma conexão direta com os modelos mais inovadores de aprendizagem, como hackathons e ensino por desafios. “Quem já tem experiência em ambientes cooperativos está naturalmente mais preparado para a inovação, porque já desenvolveu a colaboração como valor”, defende.
Na UFV, o cooperativismo é ensinado não apenas como teoria, mas como prática cotidiana. Murta destaca que essa vivência fortalece o compromisso ético e social dos estudantes. “Formamos profissionais com visão crítica, sensibilidade social e capacidade de liderar processos de inovação, sempre comprometidos com os valores do cooperativismo”, completa.
Inteligência ampliada como horizonte
A transição para modelos mais colaborativos encontra novo desafio na transformação digital. A revolução tecnológica trouxe novos paradigmas, e a inteligência artificial, cada vez mais presente, é vista como um divisor de águas. Mas o debate não deve se restringir à substituição de pessoas por máquinas. Para Albano, a questão está na forma como a tecnologia será utilizada. “A inteligência artificial deve ser utilizada para ampliar e não substituir a inteligência humana”, afirma.
Pablo acrescenta outro ponto, a internacionalização da educação. A capacidade de compartilhar conhecimento entre diferentes países amplia as referências, cria oportunidades de cooperação e fortalece o preparo dos profissionais para lidar com desafios globais.
Sob este entendimento, o coordenador expõe que a UFV busca projetar seu curso para além do Brasil, sob a justificativa de que os desafios ligados ao cooperativismo, à sustentabilidade e à inovação são cada vez mais globais e exigem profissionais preparados para atuar em diferentes contextos, além de garantir a consolidação da instituição como referência na América Latina. “Nossa meta é consolidar a UFV como referência não apenas no Brasil, mas em toda a América Latina”, afirma.
Educação como pilar do futuro
As iniciativas de aprimoramento profissional já não podem ser entendidas como custo. No cenário de cenário de competitividade atual, essas ações são ferramentas de gestão e desenvolvimento, que geram inovação, engajamento e fortalecem o propósito organizacional.
No cooperativismo, esse papel é ainda mais evidente, sob o entendimento da formação contínua como garantia da preparação de lideranças capazes de sustentar modelos econômicos e sociais.
O caminho para o futuro das organizações passa, necessariamente, pela valorização da educação como pilar estratégico.
Por João Victor, Redação MundoCoop

Reportagem exclusiva publicada na edição 126 da Revista MundoCoop












