O cooperativismo em Pernambuco tem se mostrado resiliente e por isso, tido avanços significativos nos últimos anos. Atualmente, ele contribui no crescimento do estado e emprega pessoas em diversas ocupações diretas e indiretas, comprovando a sua credibilidade ao longo de sua história.
De acordo com o Anuário do Cooperativismo Brasileiro 2024, o estado conta com a presença de 112 cooperativas, mais de 188.268 cooperados e 8.638 empregados. Durante quase um século e meio, a região enfrentou altos e baixos, crises e renascimentos em diferentes momentos de sua trajetória e o movimento cooperativista alcançou importante influência, principalmente no aspecto econômico e social.
“Sua importância está no fortalecimento da pequena agricultura familiar, contribuindo para a produção de alimentos e a agricultura de negócios, formada pela cana de açúcar e fruticultura. No campo social, as organizações potencializam os projetos de vida coletivo para a construção de uma sociedade mais igualitária, participativa e estruturada com base na força da cooperação. O cooperativismo de Pernambuco tem a capacidade de ofertar uma proposta diferenciada de atuação dos seus cidadãos”, conta Malaquias Ancelmo de Oliveira, Presidente do Sistema OCB/PE.
Em Pernambuco, o modelo teve origem no final do século XIX, quando a economia do estado girava em torno da cana-de-açúcar, mas começava a sentir os impactos da concorrência internacional e da industrialização emergente, ao mesmo tempo que recebia as influências das transformações sociais vividas pela França e a Alemanha.
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Emanuel Sampaio, professor do curso de pós-graduação em cooperativismo na PUC Minas, pesquisador e autor de Cooperativismo: uma história sobre o segmento em Pernambuco (1895-2024), conta na obra que o engenheiro Carlos Alberto de Menezes, responsável pela estruturação da Fábrica de Tecidos de Camaragibe, foi um dos primeiros a trazer a ideia cooperativista para o estado. “Durante viagens à Europa para comprar máquinas, ele conheceu o modelo das corporações cristãs francesas, idealizadas por Léon Harmel, onde patrões e trabalhadores compartilhavam a gestão e os benefícios do trabalho”, conta Sampaio.
Inspirado por essa experiência, Menezes estruturou uma das primeiras organizações do cooperativismo em Pernambuco, a Cooperativa de Consumo de Camaragibe, que garantia aos operários acesso a bens essenciais a preços justos. “Mais do que uma simples loja, essa cooperativa fazia parte de um sistema que incluía moradia, educação e assistência social para os trabalhadores da fábrica”, lembra o pesquisador.
Em 1901, foi criada a Cooperativa dos Funcionários Públicos de Pernambuco, que oferecia crédito e apoio financeiro aos servidores do estado, consolidando o cooperativismo financeiro no território pernambucano. Mais tarde, em 1904, nascia a Cooperativa Pernambucana de Serviços Clínicos, um dos primeiros exemplos do cooperativismo de saúde. Já o setor agropecuário começou em 1928, com a criação da Cooperativa Açucareira de Pernambuco, formada por pequenos e médios fornecedores de cana, que buscavam melhores condições comerciais em um mercado dominado pelos grandes engenhos.
Emanuel lembra que a primeira usina de leite pasteurizado da região, na década de 1940, veio por meio do suporte de uma cooperativa e iniciativas como eletrificação rural encontrou destaque em seus benefícios. “Ao longo de quase 150 anos, foram muitas as vantagens que o cooperativismo trouxe, seja para associados e a sociedade pernambucana. Fortalecer pequenos produtores, dar acesso ao crédito, criar empregos e renda podem ser destacados como alguns dos seus méritos. Contudo, a maior delas é a gestão democrática, permitindo que seus membros participem ativamente das decisões e garantindo maior transparência e eficiência”, diz o pesquisador.
A história tem comprovado que as organizações cooperativas não só têm sobrevivido aos tempos difíceis, mas se mantém como uma ferramenta essencial no desenvolvimento regional. Nos próximos anos, espera-se um crescimento expressivo delas em áreas estratégicas para a economia local.
Um papel fundamental
Apesar das perspectivas positivas, o cooperativismo enfrenta muitos desafios estruturais e conjunturais, como a adaptação às mudanças regulatórias e de mercado, o fortalecimento da intercooperação e a ampliação de sua visibilidade como modelo de negócio sustentável. Sampaio explica que o avanço tecnológico, especialmente com Inteligência Artificial (IA), exige que as organizações adotem novas práticas de gestão e digitalização de processos. A incorporação de ferramentas tecnológicas para gestão financeira, comunicação e monitoramento é essencial para garantir competitividade no mercado. “O setor precisa lidar com as constantes mudanças regulatórias e normativas que impactam sua operação, especialmente no cooperativismo de crédito e saúde”, completa Emanuel.
Outro fator que desperta a atenção das organizações é a necessidade de fortalecimento de redes cooperativistas para impulsionar a economia local e expandir mercados. Ainda, o incentivo à intercooperação e a maior visibilidade do setor são essenciais para que as cooperativas possam expandir suas atividades e gerar impacto positivo. Com essas medidas, o estado pode consolidar o cooperativismo como um pilar do seu desenvolvimento sustentável. “Uma das principais formas de potencializar o cooperativismo em Pernambuco é integrar as iniciativas com as estratégias de desenvolvimento regional, estimulando a criação de unidades em setores estratégicos, como agricultura, crédito, infraestrutura, saúde e serviços”, indica Sampaio.
Parcerias de sucesso
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Muitas cooperativas têm liderado algumas iniciativas de desenvolvimento do estado, como o Sicredi, que promove cursos de educação financeira, inclusão social e sustentabilidade, alcançando pessoas sem acesso às informações. Uma dessas propostas é o Projeto Cooperativismo Transforma Nordeste, da Central Sicredi Nordeste, capacitou em apenas um ano, 400 colaboradores, liderada por Cleber Zequetto, Gerente de Desenvolvimento do Cooperativismo da Cooperativa. “As perspectivas para os próximos anos são otimistas, acreditamos que o cooperativismo de crédito será uma força transformadora ainda maior no Nordeste, com potencial para expandir sua abrangência e consolidar-se como um modelo de negócios sustentável”, destaca Zequetto.
O especialista explica que apesar da expansão do cooperativismo, a região enfrentar dificuldades, para crescer, dependendo muitas vezes de parcerias estratégicas e do fortalecimento das ações educativas e culturais. “Um dos maiores desafios está em ampliar o conhecimento sobre os benefícios do cooperativismo, especialmente em regiões onde a cultura da cooperação ainda é pouco disseminada. Além disso, há o desafio de fortalecer a participação dos associados, incentivando uma governança mais ativa e democrática”, diz Cleber.
O Nordeste de uma maneira geral pode se beneficiar amplamente do cooperativismo ao investir em políticas públicas que incentivem a educação cooperativa e a integração entre as cooperativas e outras organizações. “O movimento não é apenas um modelo de negócios, mas uma filosofia de vida que transforma realidades e cria comunidades mais fortes e resilientes. Ao disseminar esse conhecimento e incentivar a participação ativa, continuaremos a construir um futuro mais justo e sustentável para o Nordeste brasileiro”, finaliza o Gerente de Desenvolvimento do Cooperativismo da Sicredi Central Nordeste.
A expansão do cooperativismo de crédito
O cooperativismo de crédito no Nordeste vem se expandindo, seja pela sua atuação em novos sistemas ou apoio aos arranjos produtivos, alavancando a economia local. Esse crescimento tem gerado vantagens competitivas permitido que algumas regiões não bancárias, tenham acesso a serviços financeiros, trazendo o desenvolvimento regional.
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Aline Robéria Costa Araújo, diretora executiva do Sicoob Central NE de Pernambuco, conta que o cooperativismo atende mais de 17 milhões de cooperados, as cooperativas de crédito já contam com um vasto portfólio de produtos e serviços, sem perder o foco nas pessoas e na humanização dos negócios.
O Sicoob Central NE de Pernambuco nasceu em 1999, com o nome de Credipajeú, em São José do Egito, um município do alto Sertão do Pajeú pernambucano. Após seis meses, abriram a primeira agência com 101 sócios e 04 colaboradores. Atualmente, esse número pulou para 50 mil associados, mais de 300 diretos e indiretos, 38 pontos de atendimentos e 840 milhões de ativos. “O maior desafio enfrentado pelas cooperativas de crédito de Pernambuco tem sido a conscientização das pessoas sobre esse modelo de negócio. Os associados precisam conhecer e perceber que há um investimento social na comunidade onde as cooperativas estão instaladas”, conta Robéria.
Assim como os demais, a diretora acredita que o cooperativismo tem o poder de transformar os desafios enfrentados pelos nordestinos em grandes oportunidades de negócio, a partir de apoio ao financiamento de projetos com juros acessíveis e o fortalecimento local. “O estado pode aproveitar o cooperativismo a partir da construção de parcerias e políticas públicas, como por exemplo a formalização de convênios estaduais, a geração de emprego e renda, do aumento do PIB, todas essas iniciativas favorecem o círculo virtuoso do movimento”, conclui Araújo.
Impulsionando setores
O setor da alimentação e dos produtos regionais é outro grande case de sucesso cooperativista no estado, onde se destacam cooperativas como a Cooperativa de Produção e Comercialização da Agricultura Familiar Orgânica Agroecológica (Coopcafa), registrada na OCB/PE em 2016, com sede no município de Triunfo em Pernambuco. A organização tem 48 cooperados e seu carro-chefe é o açúcar e a rapadura. Só em 2023, a cooperativa moeu 732 toneladas de cana-de-açúcar.
Nadjanécia Guerra, Presidente da Coopcafa conta que a cooperativa é um modelo que vem dando certo no setor agropecuário. Entre as vantagens de atuar via modelo cooperativista estão a de escoar melhor a produção, se tornar regularizada com a emissão de notas fiscais e garantir o acesso a pequenos e grandes mercados. “Para os municípios, ela gera renda, cuida da comercialização e trabalha com o ato não cooperativo, agregando valor ao local. Atualmente, fazemos contratos com mais de 5 engenhos para envio de matéria-prima. A cooperativa também já recebeu visita de grupos de Moçambique para conhecer seu modelo de gestão. Para os próximos anos, pretendemos aumentar o número de cooperados, melhorar a produção e exportar nos próximos três anos”, relata Guerra.
Por Priscila Gorzoni – Redação MundoCoop