Um dos principais setores que tem crescido de forma exponencial é o voltado para o cooperativismo de crédito. O salto vem sendo registrado nos últimos anos, mas em junho deste ano o ramo surpreendeu, atingindo um crescimento de 29% acumulado nos últimos 12 meses, superior ao sistema financeiro como um todo que, no mesmo período, registrou 17% de expansão.
Os números representam um excelente momento que, no geral, atinge todas as cooperativas. Segundo o Anuário Coop, hoje existem 4880 cooperativas com 18.88.168 milhões de cooperados em todo o território nacional. Deste montante, 763 cooperativas integram o ramo crédito, com 13.956.975 milhões de cooperados.
Segundo o presidente do Banco Central, Roberto Campos, o papel que as cooperativas exercem no desenvolvimento das comunidades em que se encontram inseridas impactam positivamente em diversas variáveis como renda, emprego e empreendedorismo. Durante uma live organizada pelo Sistema OCB, Campos falou sobre a sanção da Lei que moderniza o Sistema Nacional de Crédito Cooperativo, frisando que as cooperativas são importantes ferramentas na busca pela inclusão financeira, uma vez que são a única instituição financeira em diversos municípios do país.
Para o consultor José Carlos de Assunção, as cooperativas que compõem o Sistema Nacional de Crédito Cooperativo, na sua maioria, já estão com o processo de consolidação bastante adiantado e não apenas aceitando novos cooperados, como fomentando essa adesão. “Qual a empresa consolidada ou próxima do processo de consolidação que aceita a entrada de novos sócios, que passarão a usufruir da riqueza e da estrutura geradas ao longo de anos, sem cobrança de algum tipo de pedágio? Além disso, nas cooperativas de crédito, os cooperados têm os mesmos produtos e serviços financeiros que encontram nas demais instituições financeiras, como os oferecidos pelos bancos, mas encontram muito mais do que isso: têm um atendimento realizado por pessoas preparadas para ‘cuidar das suas necessidades’”, observa ele, acrescentando que a cooperativa de crédito não apenas empresta dinheiro, mas busca entender a real necessidade do demandante de crédito. “A isso se inclui, por exemplo, a dificuldade em gerir finanças, situação que assola uma grande massa da população brasileira”, complementa.
Já o conselheiro consultivo Neilson Oliveira afirma que o cooperativismo brasileiro se destaca por uma razão simples: as cooperativas de crédito estão inseridas dentro das comunidades, onde são tomadas as decisões da gestão por justamente conhecerem a dinâmica daquela economia local. “Isso faz com que esse setor cresça acima da média do sistema financeiro, principalmente pela carência de serviço de qualidade que o brasileiro sofre por não ter as instituições financeiras comprometidas com a sociedade”, explica.
Assunção concorda. Para ele, o cooperativismo coloca à disposição do cooperado uma outra solução, que não faz parte da realidade dos bancos e demais instituições financeiras. “Trata-se dos sete princípios cooperativistas, mas destaco esses três: a educação, a formação e a informação. Por meio dessa orientação, a cooperativa tem a obrigação de orientar o cooperado quanto a sua gestão financeira, com o objetivo de dotá-lo, com relação a esse quesito, de qualidade de vida, o que beneficia também toda a família. Portanto, há espaço para manter esse nível de crescimento e até ampliá-lo porque, no cooperativismo, não apenas se faz negócio, o cooperado e a sua família são, também, cuidados”, explica.
Lei do Cooperativismo impacta em crescimento do setor, dizem especialistas
Outro ponto observado é que a nova Lei do Cooperativismo de Crédito traz algumas inovações, proporcionadas pelo Banco Central do Brasil. Nela, a quota-parte do cooperado se torna impenhorável, além de permitir campanhas para atrair novos associados e permitir novas regras de governança.
Para Paulo Souza, diretor de fiscalização do Banco Central, a aprovação sem vetos é uma grande vitória para o setor. “Parece que foi ontem que entregamos o projeto (2020), passamos pela pior crise da história e o cooperativismo deu um show. Mesmo sem o marco, desde o início dessa experiência, a participação do cooperativismo no crédito, avançou 30%”, afirmou em recente entrevista à imprensa.
De acordo com José Carlos de Assunção, a LC 196/2.022, que alterou a LC 130, trouxe avanços importantes na governança, mas ainda há necessidade de regulamentação de alguns dispositivos por parte do Banco Central para melhorar o entendimento da aplicabilidade. “Na minha opinião, isso não deve demorar. Mas, com a nova lei, as cooperativas de crédito passaram a receber, por força normativa, direcionamentos obrigatórios, o que melhorou o ambiente de administração, de gestão e de fiscalização dessas entidades nos últimos 13 anos. A lei representa avanço substancial na governança cooperativa e, por consequência, deve melhorar a administração e a gestão das cooperativas de crédito, potencializando a capacidade de atender cada vez mais cooperados, inclusive por meio de plataformas eletrônicas. Isso é muito bom, afinal, o que é bom deve ser levado ao maior número de pessoas possível”, opina.
Neilson Oliveira afirma que a lei proporciona uma maior competitividade no mercado. “Isso não aconteceu por acaso, mas por causa de uma conquista que se deve ao fato de que a governança das cooperativas amadureceu ao longo dos anos. Isso permitiu que o órgão regulador pudesse criar inovações para ampliar o leque, fazendo com que cada cooperativa pudesse se destacar nas regiões onde estão. Posso destacar, também, o lado de preocupação com a lei, pois sabemos que o ESG está em alta. No entanto, a questão do G, de governança, ainda necessita de aperfeiçoamento, precisa ser profissionalizada nas cooperativas com conselheiros da administração para que possam buscar a perenidade do negócio”, diz Neilson.
Futuro do setor prometer ampliação e novos cooperados
Para o futuro, é notório que o cooperativismo de crédito vai alçar voos mais altos. Segundo o Sistema OCB, não é somente o setor que vai crescer: as perspectivas são de que, até 2027, sejam movimentados R$1 trilhão no cooperativismo como um todo, com o movimento chegando a 30 milhões de cooperados apenas no Brasil. Quando observada a participação do crédito cooperativo no cenário total, a meta é que o sistema responda por 20% de todo o cenário de crédito no Brasil, dobrando a participação atual.
José Roberto Assunção diz estar otimista., listando o que vai ser tendência de hoje em diante.“ Vamos manter o nível de desenvolvimento e crescimento, ampliando a presença no Brasil e o atendimento a mais cooperados que, ao conhecerem uma cooperativa de crédito, com os benefícios em termos de produtos e serviços financeiros, mas também de princípios cooperativos, que dão ao relacionamento contornos de ‘cuidar do outro’, nunca mais deixarão de operar neste ramo do cooperativismo brasileiro, pelo contrário, vão concentrar seus negócios na cooperativa da qual o cooperado é um dos donos”, detalha.
Neilson Oliveira destaca que, para o ano que vem, a recuperação da economia pós-Covid impacta, também, no ramo do cooperativismo de crédito. Para ele, as cooperativas devem atuar de forma mais precisa, principalmente por conta das inovações tecnológicas aprovadas pelo Banco Central, que vão do PIX ao Open Finance. “Isso vai apertar na competitividade, não só de bancos, mas também de outros players que vão entrar no mercado. Se o cooperativismo brasileiro souber acompanhar as tendências mundiais, vai crescer ainda mais, de forma acelerada. Afinal, não estamos atrás de países do primeiro mundo, e ainda temos ao nosso lado o Banco Central, o que não ocorre em outros locais”, comenta.
E nem mesmo a pandemia foi motivo para que as cooperativas de crédito sofressem uma queda em seus números. Pelo contrário. José Roberto Assunção explica: “na iminência de uma crise, os bancos param de emprestar e, com isso, eles colaboram para potencializar os problemas financeiros e até operacionais das pessoas físicas e jurídicas demandantes de crédito. Na pandemia, os bancos somente passaram a emprestar recursos em condições mais favoráveis quando o governo aprovou fundo que garantia até 80% das operações. As cooperativas não pararam de emprestar em nenhum momento”, finaliza.
Por Letícia Rio Branco – Matéria publicada originalmente na edição 108 da Revista MundoCoop
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