Não é surpresa para ninguém que o cooperativismo valoriza e fomenta a união e a colaboração entre pessoas para a construção e o alcance de objetivos comuns. No mundo, a cooperação tem se mostrado uma ferramenta poderosa de desenvolvimento econômico e social sustentável.
O que talvez nem todos saibam é que entre os princípios cooperativistas estão a educação e o interesse pela comunidade, princípios ainda mais relevantes em tempos de desafios como, por exemplo, os trazidos pelo avanço das apostas on-line e dos seus muitos efeitos.
No início do mês de abril, na CPI das Apostas Esportivas do Senado, o Banco Central do Brasil divulgou dados impressionantes sobre o mercado de apostas on-line. Segundo a instituição, representada naquele ato por seu Presidente, Gabriel Galípolo, e seu secretário-executivo, Rogério Lucca, os brasileiros movimentam mensalmente entre 20 e 30 bilhões de reais com apostas esportivas em “Bets”. Esse valor representa um aumento significativo em comparação aos estudos anteriores, inclusive ao realizado pelo BACEN menos de um ano antes, que estimavam movimentações mensais entre 18 e 21 bilhões reais.
De outra forma, a pesquisa conduzida pelo Instituto DataSenado expõe dados tão incríveis quanto alarmantes, como a existência de um universo de mais de 22 milhões de brasileiros realizando apostas on-line rotineiramente, dos quais 32% (trinta e dois por cento) são classificados como “fora da força de trabalho” ou “desocupados”.
Os estudos revelam também que o perfil dos apostadores é predominantemente masculino, com idade entre 16 e 39 anos, mais da metade deles com renda inferior a dois salários.
Esse grupo, que representa uma parcela significativa do total da população brasileira, está cada vez mais vulnerável ao endividamento e aos jogos on-line. Dados levantados pelo SERASA indicam que pelo menos 42% dos apostadores têm dívidas em atraso (inadimplidas) e 58% destes possuem débitos vencidos há mais de 90 dias.
Também segundo os estudos, além dos problemas econômicos e financeiros relacionados às apostas, de maneira mais grave nos casos de excessos, seus efeitos psicológicos e impactos na saúde mental dos apostadores podem ser ainda piores.
Psicólogos, psiquiatras e sociólogos têm feito alertas importantes associados aos jogos on-line, chamando a atenção de todos para uma possível “epidemia de saúde mental” e fazendo um paralelo entre as sensações/estímulos produzidas pelas apostas e o surgimento de compulsões/dependências similares as de outros vícios.
Robson Gonçalves, economista comportamental e professor da FGV, alerta também para o chamado “viés de custos irrecuperáveis”, quando os jogadores passam a acreditar que depois de inúmeras perdas sucessivas haverá um momento de vitórias e sucesso, ampliando, assim, na imensa maioria dos casos, seu universo de perdas, e aprofundando seus prejuízos.
Seguindo além do âmbito do endividamento (46% dos negativados do Brasil realizaram apostas on-line em algum momento das suas vidas), os estudos apontam para ansiedade, desenvolvimento de padrões comportamentais compulsivos, isolamento social e depressão, como reflexos dos jogos ou da sua dependência.
Diante desse cenário alarmante e da massiva propaganda realizada pelas casas de apostas, muitas delas representadas na mídia ou difundidas nas redes sociais por artistas, influenciadores e celebridades populares, a educação se apresenta como única alternativa e ferramenta essencial de combate aos excessos.
O fato é que, quando a regulamentação falha na proteção das pessoas e permite, por exemplo, a torrente de propagadas de jogos on-line vista nos dias atuais com pouco ou nenhum limite, cabe aos indivíduos, por suas consciências, buscar o melhor caminho. Essa consciência, por outro lado, exige educação, afluente do conhecimento e da sabedoria.
É aqui que se fortalece o papel das sociedades cooperativas de, na condição de educadoras, colaborar para que seus associados tomem decisões mais conscientes e responsáveis. Grandes sistemas cooperativistas como Sicredi e Sicoob têm investido fortemente nessa educação, oferecendo iniciativas como oficinas, workshops, palestras, cursos e verdadeiros programas de educação financeira, com uso de gamificação e outras estratégias, alcançando jovens, adultos e crianças, contribuindo para que as pessoas compreendam melhor a gestão do dinheiro e, naturalmente, os riscos das apostas.
Da mesma forma, quando relaciona como princípio o interesse pela comunidade, o cooperativismo compreende a importância social de ações de prevenção ao endividamento e, inclusive, de suporte psicológico, o que tem estimulado algumas cooperativas a oferecerem apoio aos seus associados apostadores e a realizarem campanhas de conscientização sobre os perigos vinculados aos jogos.
A educação financeira não apenas ajuda a evitar o endividamento, mas também capacita as pessoas a identificar e evitar riscos desnecessários, assim como sugere caminhos para a solução de dívidas.
Na 12ª edição da Semana Nacional de Educação Financeira, iniciada no último dia 12 de maio e com programação até o dia 18, os esforços das cooperativas se mostram mais evidentes e se espalham por todo o país. As iniciativas são as mais variadas e, cada uma ao seu modo, alcançam todos os cooperados interessados.
Juntos, os maiores sistemas do cooperativismo financeiro do país comemoram dezenas de milhões de pessoas impactadas por seus esforços para gerar educação financeira. Essas ações fazem a diferença além do ambiente econômico e financeiro das pessoas, transformando comunidades, desenvolvendo consciências e promovendo cidadania.
Não há dúvida: o caminho para a prosperidade é o trabalho, a colaboração mútua e o conhecimento, mas, se ainda assim você estiver pensando em apostar, procure a sua cooperativa e, invista, “all-in”, em um futuro sustentável, construído passo a passo com educação financeira.
Manfrini Andrade é Advogado Cooperativista e Especialista em Direito Cooperativista e Tributário