Nos últimos anos, o Banco Central tem intensificado seus esforços para modernizar o sistema financeiro brasileiro, e a Consulta Pública nº 109 divulgada no último dia 08/11/2024 representa um passo significativo nesse sentido. Com o foco na regulamentação dos ativos digitais, a consulta busca estabelecer diretrizes claras para o setor, aumentando a segurança para todas as instituições financeiras. Para as cooperativas de crédito, este é um momento crucial de reflexão, mas, acima de tudo, uma grande oportunidade de inovação.
A consulta não visa apenas criar regras; ela sinaliza uma mudança no entendimento sobre os ativos digitais e o papel da tecnologia blockchain. As cooperativas, que já se destacam por sua tradição de inclusão financeira e proximidade com seus associados, têm a chance de liderar essa transformação. Entretanto, para aproveitarem plenamente essa posição privilegiada, é necessário adotar uma estratégia clara, sintonizada com as novas tendências de governança digital.
Ativos Digitais: Uma Nova Perspectiva para as Cooperativas
Embora muitos associem ativos digitais exclusivamente às criptomoedas, eles englobam uma diversidade de instrumentos, incluindo tokens de utilidade, stablecoins e representações digitais de ativos físicos. A Consulta nº 109/2024 visa regular este universo, criando um marco normativo que permita integrar esses ativos ao sistema financeiro de forma segura e eficiente.
Para as cooperativas de crédito, o desafio envolve não apenas a adaptação às exigências regulatórias, mas também a exploração das possibilidades que esses novos instrumentos oferecem. A utilização de ativos digitais (especialmente criptografados) pode resultar em benefícios como a redução de custos operacionais, maior transparência nas operações e o desenvolvimento de novos produtos e serviços para seus cooperados.
Contudo, alcançar esses resultados exige investimento em capacitação e infraestrutura tecnológica, sempre com um olhar atento às normas regulatórias e aos aspectos de segurança.
Transformação e Governança: Um Olhar para a Era da Web3
A Web3 é a próxima fase da internet, caracterizada pela descentralização e pela propriedade de dados pelos usuários, habilitada pela tecnologia blockchain.
Embora a Consulta nº 109/2024 não aborde diretamente a Web3, ela pode servir como inspiração para as cooperativas entenderem as tendências emergentes e aproveitarem a tecnologia blockchain — um dos pilares que viabilizam essa nova era da internet. A Web3, fundamentada na descentralização e na utilização de blockchain, pode representar uma evolução significativa para o setor financeiro, oferecendo maior transparência, segurança e autonomia.
Para as cooperativas, que já operam sob princípios de gestão democrática e participação dos cooperados, a adoção da blockchain pode servir como base para práticas inovadoras de governança digital.
Em vez de ver as regulamentações como barreiras, as cooperativas devem considerá-las como oportunidades para aprimorar seus modelos de gestão, utilizando as vantagens da Web3 para fortalecer a confiança dos cooperados e se posicionar como líderes na inovação financeira.
O Novo Recorde do Bitcoin e a Reflexão Estratégica
No dia 11 de novembro de 2024, a criptomoeda mais conhecida, o Bitcoin, atingiu um novo recorde histórico de preço, alcançando US$ 89.956,00. Convertido para a cotação atual de R$ 5,78, esse valor equivale a cerca de R$ 519.946,00, consolidando ainda mais sua posição como o ativo digital de maior valor no mundo. O valor de mercado total (Market Cap) do Bitcoin agora ultrapassa US$ 1,7 trilhão (cerca de R$9,85 trilhões de Reais), demonstrando a confiança crescente dos investidores e o interesse institucional.
Este cenário reforça a necessidade do mercado financeiro reavaliar preconceitos e aprofundar seu entendimento sobre os fundamentos e o impacto dos criptoativos. Embora o mercado de criptomoedas ainda envolva riscos e não esteja totalmente regulado, ativos como Bitcoin e Ethereum já se firmaram como elementos relevantes na nova economia digital.
A Consulta nº 109/2024 também sinaliza a possibilidade de as cooperativas financeiras desempenharem papéis relevantes como intermediadoras ou mesmo custodiantes de criptoativos consolidados, como o Bitcoin. Essa abertura representa uma oportunidade estratégica para as cooperativas ampliarem seu portfólio de serviços e atenderem às demandas de um público cada vez mais interessado em ativos digitais. Ao se posicionarem como facilitadoras seguras e confiáveis para a negociação e custódia de criptoativos, as cooperativas poderão fortalecer seu relacionamento com os cooperados e atrair novos usuários que buscam segurança e credibilidade nesse mercado emergente.
A aprovação da Lei nº 14.478/2022, o lançamento do DREX e a própria Consulta Pública nº 109/2024 são exemplos claros de que esse mercado descentralizado é inevitável. E o Banco Central do Brasil (Bacen), juntamente com o Conselho Monetário Nacional (CMN), já compreenderam a importância dos ativos digitais.
Para as cooperativas de crédito, este é o momento de perceber os sinais do mercado e se preparar para a nova realidade que está surgindo. Assim como os taxistas enfrentaram o impacto do Uber há uma década, as decisões tomadas hoje podem definir se as cooperativas serão protagonistas ou apenas espectadores nessa transformação.
Preparação para um Futuro Digital
A Consulta Pública nº 109/2024 apresenta uma oportunidade para que as cooperativas de crédito avancem em direção a um futuro digital mais seguro e eficiente. Com uma abordagem estratégica e proativa, as cooperativas podem não apenas cumprir os novos requisitos, mas também aproveitar as vantagens oferecidas pelos ativos digitais e pela governança baseada em Web3.
O momento é de agir com discernimento e estratégia. As cooperativas que buscarem conhecimento e alinhamento regulatório agora estarão em uma posição de destaque, ajudando a moldar um ecossistema financeiro mais moderno, inclusivo e inovador.
Fernando Lucindo é advogado especialista em direito cooperativo e advocacia digital