O cooperativismo tem vantagens e ao mesmo tempo desvantagens no que diz respeito aos membros do conselho da sua organização. Como vantagem, é uma determinação estatutária, uma regra, uma diretriz de ter um conselho. Muitas organizações nascem e não percebem o valor ou benefício de ter um conselho. Digo isso por experiência própria de empreendedor.
Grande parte ou a maioria das pequenas empresas e start-ups não entendem a necessidade de ter um conselho. Eu mesmo como empreendedor, em meu primeiro empreendimento, via o conselho como um custo, um compromisso desnecessário. Principalmente pelo fato de não entender o que um conselheiro pode trazer de contribuição quando o que você está criando é novo e quem mais entende do que esta sendo criado é o fundador do negócio e a sua equipe mais próxima. O que os fundadores e empreendedores não entendem, algo que para mim hoje é muito. Nós empreendedores ou stratupeiros, “não sabemos o que não sabemos” e por isso achamos que sabemos TUDO que precisa ser sabido do que estamos criando. Um certo nível de arrogância por ignorância.
Ter um conselho determinado pela legislação, força você a ter um grupo de pessoas que pode ajudar você a pensar fora da caixa. Pessoas que não estão diretamente vinculados a operação, ao trabalho do dia a dia. Isso é claro, desde que esse grupo seja diverso em sua maneira de pensar e com os talentos alinhados com o mandato de um conselho – visão estratégica.
No caso de uma cooperativa, todo associado pode fazer parte do conselho. Isso abre o leque de candidatos como em nenhuma outra organização teria. Nenhum outro tipo de colaboração humana (empresa, ONG, etc.) tem a disposição uma carteira de talentos como a cooperativa. O desafio é que naturalmente, as pessoas que se aproximam e participam do cooperativismo tem características mais parecidas, são pessoas de talentos muito parecidos.
Vamos fazer um parêntesis para falar de talentos humanos. Talento é a forma natural de um individuo pensar e agir. Tão natural, fácil e automatico que as vezes não são nem valorizadas pelo próprio individuo. Em nosso trabalho, reconhecemos talentos em 4 grupos de impacto:
– Talentos de Execução – temas presentes em pessoas fazem as coisas acontecer, executores, realizadores;
– Talentos de Relacionamento – temas presentes em pessoas com facilidade de criar e manter relacionamentos com outras pessoas;
– Talentos de Influência – temas de pessoas com facilidade de compartilhar ideias, influenciar outros e estar no comando de iniciativas; e
Talentos de Pensamento Estratégico – pessoas capazes de abstração para visualizar e simular possibilidades futuras, analisar situação e tomar decisões.
Em uma amostra aleatória de pessoas, vamos encontrar individuos com talentos estatisticamente distribuídos de forma homogénea. Em media 25% da população em cada uma das áreas.
Em uma cooperativa, teremos uma concentração maior em Relacionamento, depois se concentram entre Execução e Influencia e em menor probabilidade, Pensamento Estratégico
Na população em geral, a percentagem em cada área de talento fica ao redor de 25% (20 a 30%). Em uma cooperativa, pela natureza da associativista, os talentos ficam um pouco menos homogéneos, sendo mais presentes na dimensão de Relacionamento (25% – 40%), nas dimensões de Influência e Execução, também um pouco acima da media (20% e 35%) e menos presentes na dimensão de Pensamento Estratégico (10% a 25%).
Isso não significa que conselhos de cooperativas não possam ter líderes e membros com uma excelente visão estratégica, a questão é que se faz necessário melhorar o processo seletivo para encontrar aqueles que possam contribuir com esse mandato mais estratégico do conselho.
Outra característica importante destas dimensões de talentos, elas estão diretamente associadas a perspetivas de curto, medio e longo prazo.
– Execução: Curto Prazo
– Relacionamento: Curto e Medio prazo
– Influência: Medio e Longo Prazo
– Pensamento Estratégico: Longo Prazo
Quando pensamos em um mandato de um conselho, as principais características ou talentos que deve ter um bom conselho são as relacionadas mais a visão de longo prazo e menos a visão de curto prazo. O curto prazo já é trabalhado diariamente pelos executivos e gestores da cooperativa. Um conselho com muitos talentos nas dimensões de curto prazo pode trazer uma interferência na gestão, ou frustração dos membros do conselho que se sentem que não podem ajudar nada (do ponto de vista deles).
Dentro de nosso estudos e trabalhos, vemos que muitos dos Conselhos de cooperativas tem talentos desbalanceados quando comparados com um perfil de um mandato ideal. Como é natural no perfil dos associados, esse perfil se reflete também nos conselhos, e pode limitar ou atrasar o potencial de criação de valor que um conselho poderia oferecer a cooperativa, a seus associados e a comunidade na qual esta inserida.
Abaixo temos dois exemplos do perfil de talentos de dois conselhos de cooperativas que passaram por um programa de desenvolvimento e realinhamento:
Esses dois conselhos passaram por um programa de identificação e preparação de futuros candidatos aos conselheiros que pudessem fortalecer o pensamento estratégico, alinhar a área de Relacionamento e Influencia e baixar os talentos de Execução.
Esse re-balanceamento de talentos no nível de conselho da cooperativa, permite menos interferência na execução das atividades da cooperativa pelo time executivo e traz uma discussão mais estruturada de investimentos, avanços, gestão de riscos futuros e estratégias de crescimento e desenvolvimento da cooperativa.
Parece fácil, mas encontrar talentos necessários para um Mandato de alto impacto requer, não só um trabalho de desenvolvimento e conscientização de coordenadores de núcleo e de delegados, mas também atração de talentos que muitas vezes não estão próximos da gestão para serem identificados.
No caso acima, foi possível subir significativamente os talentos de Pensamento Estratégico nos Conselhos reduzindo Talentos de Execução e das outras áreas que estavam fora de equilíbrio para um Mandato ideal de um Conselho.
Esse programa de identificação e desenvolvimento de candidatos ao conselho se fez a partir do desenho e implementação da Jornada do Coordenador de Núcleo, criando um caminho claro, com espectativas reais e uma troca honesta no processo de desenvolvimento do talento humano, que não atende apenas a cooperativa, mas o desenvolvimento pessoal de cada um dos participantes, de certa forma criando uma prosperidade na dimensão do autoconhecimento e do desenvolvimento pessoal.
No gráfico acima podemos ver o resultado desse balanceamento de talentos resultando do programa de desenvolvimento do Coordenador de Núcleo. Essa mudança potencializa o desenvolvimento da cooperativa, a discussão de assuntos críticos, uma avaliação mais estratégica de investimentos e riscos de longo prazo, uma vez que os executivos estão diariamente olhando e cuidando do curto prazo da cooperativa.
Essa metodologia de desenvolvimento de conselhos de cooperativas foi desenvolvida pela equipe da CBJ – Conscious Business Joruney, que atua com o desenvolvimento de lideranças (Conselhos, Presidentes, Diretores Gerais e CEO, e Gestores) além de implementar e fortalecer os fundamentos do capitalismo consciente nas mais diversas organizações.
*Thomas Eckschmidt é CEO e Cofundador da ResolvJá
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