O agronegócio brasileiro vive um processo acelerado de transformação, impulsionado pela digitalização e pela mudança nos hábitos de consumo de informação. Foi nesse contexto que a Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio (ABMRA) realizou, ontem (18), em São Paulo, o 17º Congresso de Marketing do Agro, reunindo lideranças, executivos e especialistas para discutir os 5 Ps do marketing: Pessoas, Processos, Praça, Promoção e Performance.
Criado em 1984, o congresso é reconhecido como o fórum mais relevante de marketing rural no Brasil. Nesta edição, trouxe temas atuais e de impacto para profissionais de marketing, agências, distribuidores, acadêmicos, associações e representantes políticos.
A abertura do evento contou com Ricardo Nicodemos, presidente da ABMRA. Ele destacou a urgência de repensar a comunicação no agro e valorizar a inovação. Nicodemos lembrou que, diante de um público cada vez mais digitalizado, as empresas precisam se posicionar de forma clara e consistente, sob pena de perder relevância.
Na sequência, Roberto Rodrigues, professor emérito da Fundação Getulio Vargas (FGV), coordenador do Centro de Agronegócio da FGV e ex-ministro da Agricultura, ressaltou o protagonismo do Brasil no combate à fome e sua importância estratégica na segurança alimentar global.
O também embaixador da FAO para o Cooperativismo defendeu que a comunicação do agro precisa ser uma ferramenta diplomática, capaz de mostrar ao mundo o papel do país como fornecedor confiável de alimentos.
Valorização como estratégia
O primeiro painel trouxe o P de Pessoas, com foco em motivação e engajamento. Bill Moraes, CEO da FranklinCovey Brasil e especialista global em eficácia organizacional, destacou os princípios do best-seller “Os 7 Hábitos das Pessoas Altamente Eficazes” e os relacionou ao ambiente do agronegócio.

Ele explicou que empresas rurais, muitas vezes familiares, precisam adotar modelos de liderança que inspirem confiança e promovam responsabilidade compartilhada. Defendeu ainda que a cultura organizacional deve ser pensada de forma estratégica, já que a transformação começa nas atitudes individuais e só se sustenta quando se transforma em hábito coletivo.
Claudio Vicente, especialista no Modelo Disney de Excelência em Serviços, lembrou que a experiência do colaborador é um reflexo direto da experiência do cliente. Ele defendeu que no agro, assim como em outros setores, é preciso ir além do atendimento funcional e buscar criar interações memoráveis, que fortaleçam o vínculo entre produtores e empresas.
Paulo Camargo, ex-CEO do McDonald’s Brasil e referência em gestão de pessoas, destacou a segurança psicológica como base para a inovação. Além disso, falou sobre os desafios da carreira em empresas de grande porte e defendeu que a construção de ambientes acolhedores é fundamental para atrair e reter talentos. Segundo ele, colaboradores só podem entregar seu melhor quando se sentem respeitados e incluídos, o que também contribui para a imagem positiva das marcas no mercado.
O debate contou com a mediação de Pedro Costa, jornalista do Canal TerraViva, e com as considerações de Afonso Abelhão, presidente da APP Brasil, que ressaltou a importância da ética e da valorização da profissão publicitária.
Consistência e inovação
No painel de Processos, Adriano Henriques, vice-presidente do comitê de Inteligência Artificial do IAB Brasil, falou sobre publicidade programática e explicou as diferenças entre inteligências artificiais analíticas e generativas. Ele defendeu que o agro precisa usar IA não apenas para otimizar campanhas, mas também para prever comportamentos de consumo e compreender melhor a jornada do produtor.
Marcondes Farias, Innovation Hub Director na Microsoft, apresentou soluções de nuvem, dados e IA como ferramentas para aumentar a eficiência dos processos empresariais. Ele destacou como a automação pode reduzir falhas operacionais, ampliar a produtividade e apoiar decisões mais rápidas. Ao mesmo tempo, chamou a atenção para a dependência excessiva de algoritmos, que pode engessar processos criativos e estratégicos, e para o risco de vieses nos dados, que, se não tratados corretamente, podem levar a interpretações equivocadas e comprometimento dos resultados.
A sessão foi mediada por Marusa Trevisan, editora-chefe e apresentadora do Planeta Campo no Canal Rural, com a participação de Bia Ambrogi, presidente da APRO+SOM, que destacou a relevância da convergência entre diferentes mídias e as novas oportunidades de comunicação out-of-home no setor.
Logística e presença de mercado

O P de Praça abordou os desafios logísticos e a importância da capilaridade na distribuição de insumos. Paulo César Tibúrcio, presidente executivo da ANDAV (Associação Nacional dos Distribuidores de Insumos Agrícolas e Veterinários), destacou o papel estratégico dos distribuidores e defendeu que a eficiência logística é decisiva para garantir competitividade ao produtor rural.
Rafael Vieira, especialista em Logística e instrutor da Harven Agribusiness School, ressaltou a relevância das cooperativas para garantir a entrega de insumos em diferentes regiões. Ele defendeu que o futuro da logística no agro passa pela integração de soluções digitais, sustentabilidade e proximidade com o produtor.
O debate conduzido por Aleksander Horta, diretor de jornalismo do Notícias Agrícolas, contextualizou os impactos da logística no desempenho do setor.
Comunicação integrada

No painel de Promoção, Bruno Busquet, presidente da Popai Brasil e especialista em trade marketing, ressaltou o poder do ponto de venda como espaço de decisão e influência. Ele defendeu que marcas precisam integrar suas estratégias de PDV ao ambiente digital para oferecer uma experiência completa ao consumidor.
Melissa Vogel, executiva C-Level com passagem por grupos como WPP e TV Globo, destacou que 48% dos produtores já utilizam ferramentas online para planejar suas compras, o que reforça a necessidade de estratégias multimídia e crossmedia. Ela defendeu que o agro precisa dialogar de forma integrada, unindo TV, rádio, digital e ações de campo.
Rodrigo Neves, fundador e CEO da VitaminaWeb e presidente da AnaMid, trouxe a visão do marketing digital de performance. Defendeu que campanhas segmentadas e bem estruturadas podem gerar resultados muito superiores aos métodos tradicionais, mas lembrou que criatividade e dados precisam caminhar juntos.
Mensuração e inteligência de dados
O congresso foi encerrado com o painel de Performance. Diego Senise, professor da USP e pesquisador em inteligência artificial e estatística, mostrou como modelos de machine learning já estão sendo aplicados para medir campanhas em tempo real. Ele defendeu que no agro a performance não pode se restringir a métricas de alcance, mas precisa considerar também impacto real no campo, como a adoção de novas tecnologias e a fidelização do produtor.

Juliano Machado, vice-presidente da Ram Brand para a América do Sul, apresentou cases de gestão de grandes marcas e defendeu que performance também significa reputação. Para ele, ser eficiente nos números é fundamental, mas ser culturalmente relevante para cada público é o que garante longevidade.
A mediação foi de Angela Ruiz, jornalista agro premiada e reconhecida entre as mais admiradas do setor, que destacou a importância de alinhar métricas financeiras com métricas de engajamento.
Retrato do produtor conectado
Durante o evento, também foram apresentados os primeiros resultados da 9ª Pesquisa ABMRA – Hábitos do Produtor Rural, que revelou a presença quase universal da internet no campo: 98% das propriedades já estão conectadas, contra apenas 39% há pouco mais de dez anos.
O levantamento mostra que o WhatsApp é hoje o principal canal de informação do agro, usado por 96% dos produtores para decisões de negócio. Sites de busca são consultados por 84%, o YouTube já é fonte de orientação para 61% e sites especializados saltaram de 35% para 66%. A televisão aberta, embora ainda relevante, caiu de 95% para 80% no mesmo período.
Por João Victor, Redação MundoCoop