Imagine ganhar, toda semana, um dia inteiro. Não para cumprir pendências, mas para acordar sem despertador, caminhar devagar, cozinhar algo sem pressa, estar com quem importa — ou simplesmente não fazer nada.
Um estudo publicado na Nature Human Behavior mostrou que empresas que adotaram a jornada de quatro dias, sem corte salarial, viram mais do que produtividade subir: viram gente dormir melhor, se sentir mais capaz, chegar ao fim do dia menos esgotada.
Não é sobre trabalhar menos por preguiça. É sobre trabalhar melhor porque se vive melhor. Sobre entender que o tempo não é apenas medida de produção, é medida de saúde.
Na Roche e na Allianz, por exemplo, o relógio já começou a girar de outro jeito. Durante as férias escolares, pais e mães podem optar pelo trabalho remoto. Parece simples, mas essa escolha diz muito: “nós confiamos em você”. E confiança, no trabalho, costuma render mais do que horas extras.
O que está em jogo não é só eficiência, é vínculo. É criar um ambiente onde as pessoas não precisem escolher entre presença profissional e presença de vida.
Por muito tempo, produtividade foi sinônimo de horas contadas. Hoje sabemos que ela mora mais no contexto do que no ponto: nas relações de confiança, na autonomia para criar, no clima saudável e respeitoso.
E aqui, o cooperativismo tem uma vantagem natural. Porque nasce do cuidado mútuo e da participação, e pode liderar essa conversa sobre tempo de forma coerente com sua essência.
Mas o tempo é também um desafio logístico. Nem todo setor pode simplesmente cortar um dia. Indústria, atendimento contínuo, serviços essenciais exigem outras estratégias. Às vezes, a mudança começa menor: flexibilizar horários, reorganizar turnos, dar previsibilidade para que a vida fora do trabalho também caiba na agenda, entre outros pontos.
Talvez a próxima grande disputa entre empresas não seja por salários mais altos, mas pelo tempo mais valioso: aquele que se pode chamar de seu.
E, nesse jogo, quem cuidar das pessoas com autenticidade vai descobrir que tempo devolvido não é custo — é investimento. É nesse lugar que a cooperação verdadeira se manifesta, a inovação sustentável e o futuro que a gente quer trabalhar para ver.
Mesmo ainda incipiente no Brasil, a jornada de quatro dias merece atenção especial. Pela própria natureza e valores do cooperativismo — sobretudo diante dos desafios trazidos pela NR-01 — é um tema que precisa ganhar espaço em mesas de debate, congressos e reuniões estratégicas. Porque, no fim, falar de tempo é falar de qualidade de vida, e falar de qualidade de vida é falar de sustentabilidade. Talvez o futuro do trabalho não esteja apenas em novas tecnologias ou processos mais ágeis, mas na estratégia de devolver às pessoas o que todos nós temos de mais precioso: o tempo para viver.
Taís Di Giorno é Autora e Jornalista