Quando chega perto do meio-dia e a maré vem subindo, barcos repletos de basquetas de açaí encostam no pequeno porto às margens do rio Santo Antônio. Homens descalços, arriados do sol quente, vão desembarcando o “ouro roxo”.
É começo de safra em Igarapé-Miri, a capital mundial do açaí, de onde saem mais de 20% da produção nacional. Situada a 140 quilômetros de Belém (PA), a cidade abriga na zona rural uma das cooperativas pioneiras na comercialização do produto amazônico.
“O açaí é o futuro do nosso povo, que deixou de morar em casa de palha e paxiúba, comprou barco, colocou filho na universidade”, diz Leubaldo Costa, 47, presidente da Caepim (Cooperativa Agrícola dos Empreendedores Populares de Igarapé-Miri).
Em parceria com a 100% Amazonia, finalista do Prêmio Empreendedor Social 2025, a Caepim conquistou certificação orgânica que valoriza produtos da sociobiodiversidade, como andiroba, cacau, buriti, murumuru e cupuaçu. Em 2023, faturou R$ 4,8 milhões, o que beneficiou 150 famílias.
A 100% Amazonia entende que a gente precisa produzir e que a floresta tem que ser respeitada”, diz Costa às margens do rio que nutre aquelas terras.
“Só aqui nesse rio tinham três engenhos de cana-de-açúcar. Do lado de lá era um dono, aqui outro. Foram todos embora. As famílias ficaram sem ter o que fazer, foi momento de miséria, fome e êxodo rural.
Então a igreja católica, o sindicato de trabalhadores rurais e a associação Mutirão incentivaram a agricultura familiar nos anos 1990. Plantamos pimenta do reino, cana-de-açúcar, cacau, maracujá, coco, laranja e açaí. E o açaí deu certo porque ele é nativo, não tem segredo, é só fazer o manejo e pronto, ele vai dar.
As famílias sabiam que, mesmo vendendo barato, tinha perspectiva de renda. A feira de Igarapé-Miri não foi mais suficiente para absorver a produção, e aí fomos vender em Belém. As propriedades foram se tornando açaizais e, em 2000, o açaí explodiu, foi tomando conta do Pará. Em 2005, criamos a Caepim para cuidar da comercialização. Esse trabalho coletivo nos dá orgulho.
Sou filho de agricultores, irmão de onze. Tenho um filho criado com açaí. Ele precisava de fisioterapia em Belém por um problema neurológico que prejudicou o movimento da perna. Foi andar aos 7 anos. Hoje ele tem 12.



Fonte: Folha de São Paulo com adaptações da MundoCoop