Em um mundo corporativo em constante transformação, um novo cargo começa a ocupar espaço nas empresas brasileiras: o Chief Happiness Officer (CHO), ou Diretor de Felicidade. Pode parecer um nome curioso à primeira vista, mas essa função vai muito além de sorrisos e eventos motivacionais. O CHO é um agente estratégico, voltado para a promoção do bem-estar, do equilíbrio emocional e da satisfação no trabalho, elementos que hoje são decisivos para a sustentabilidade dos negócios.
A ascensão do CHO no Brasil não acontece por acaso. Em 2024, o país registrou quase meio milhão de afastamentos por motivos relacionados à saúde mental, segundo dados do Ministério da Previdência Social – o maior número em uma década. A crise silenciosa afeta diretamente a produtividade e exige das empresas novas abordagens na gestão de pessoas.
“Investir no bem-estar dos colaboradores é uma estratégia inteligente para atrair, engajar e reter talentos” – MARCELO DE ABREU

“Após a pandemia, ficou evidente que saúde mental, bem-estar e qualidade de vida são fatores essenciais não apenas para o indivíduo, mas também para a sustentabilidade dos negócios”, afirma Marcelo de Abreu, presidente da Employer Recursos Humanos. Segundo ele, a demanda por esse novo perfil profissional está atrelada a uma mudança cultural profunda. “Investir no bem-estar dos colaboradores é uma estratégia inteligente para atrair, engajar e reter talentos.”
Mais que eventos, uma nova cultura
O papel do CHO entra direto nesse ponto, pois vai além de organizar ações pontuais. Trata-se de uma liderança transversal, focada em construir uma cultura organizacional saudável, que valoriza o desenvolvimento humano, o clima interno e o equilíbrio entre vida pessoal e profissional.
“As organizações perceberam que cuidar da experiência do colaborador é parte fundamental da gestão estratégica de pessoas. E isso se traduz em resultados concretos para a empresa”, reforça Marcelo.
Essa percepção é confirmada por pesquisas recentes. Um levantamento da The School of Life com a Robert Half revelou que quase metade dos líderes (44,72%) e liderados (45,82%) reconhece que as empresas devem ter um papel ativo na promoção da felicidade. Já dados da consultoria Gallup apontam que muitos profissionais ainda se sentem desconectados do propósito das empresas – um espaço onde o CHO pode atuar como elo entre estratégia e significado.
Casos reais e resultados expressivos
Algumas empresas no Brasil já colhem os frutos dessa nova abordagem. A Heineken, por exemplo, criou uma diretoria de felicidade e capacitou mais de mil embaixadores internos. O resultado? O engajamento dos colaboradores saltou de 18% para 82%. Já a Chilli Beans, com uso de plataformas que monitoram emoções e relações no ambiente de trabalho, reduziu o turnover (rotatividade de colaboradores) e aumentou a rentabilidade.
“A presença de um CHO representa uma tendência global na gestão de pessoas. No setor cooperativista, ele pode ser o elo entre inovação e valores sociais” – ALEX WEYMER
No setor cooperativista, a tendência também avança. Em 2024, a PUCPR realizou um estudo inédito sobre o Programa de Felicidade Interna do Cooperativismo (FIC), conduzido por Cristina do Nascimento Moreira sob orientação do professor Alex Weymer.
“O FIC oferece subsídios significativos para decisões com foco no equilíbrio constante entre vida pessoal e profissional, o chamado work-life balance”, explica Weymer.
Ele observa que o programa está inserido na chamada “Economia do Cuidado”, que valoriza relações humanas e bem-estar coletivo. “A presença de um Chief Happiness Officer representa uma tendência global na gestão de pessoas. No setor cooperativista, ele pode ser o elo entre inovação e valores sociais, fortalecendo a competitividade com base em felicidade organizacional com propósito”, afirma.

Para Weymer, o CHO fortalece o programa ao integrar diagnósticos a políticas sustentáveis, considerando dimensões como liderança engajada, escuta ativa, capacitação de “felicitadores” e monitoramento de indicadores como satisfação com o tempo livre, vitalidade comunitária e licenças por saúde mental.
Perfil e competências do CHO
Mas afinal, que tipo de profissional é esse? Segundo Marcelo de Abreu, o sucesso no cargo depende de uma combinação rara: inteligência emocional, empatia, visão de negócios e domínio de ferramentas de gestão.
“A inteligência emocional é, sem dúvida, uma das principais competências. O CHO precisa entender as reais necessidades da equipe e construir um ambiente saudável”, diz.
A tecnologia também tem papel central. Ferramentas de análise de dados ajudam a detectar padrões de comportamento, como absenteísmo, enquanto plataformas de comunicação interna fortalecem a cultura e o sentimento de pertencimento. “Essas soluções não substituem o olhar humano, mas potencializam o alcance e a efetividade das ações do CHO”, destaca Abreu.
Avanços, desafios e caminhos possíveis
Apesar dos avanços, ainda existem barreiras. Para Alex Weymer, equilibrar felicidade e produtividade exige maturidade organizacional e políticas coerentes.
“Os desafios são complexos e sistêmicos. Portanto, dependem do contexto e do posicionamento de cada cooperativa ou empresa quanto à governança, alinhamento ao propósito, políticas de gestão de pessoas, liderança por propósito e promoção de um equilíbrio entre interesses individuais e organizacionais”, afirma.
Ele reconhece que nem toda organização está pronta para criar uma diretoria exclusiva, seja por razões financeiras ou culturais. Mas destaca que áreas de ESG podem inicialmente assumir esse papel. “Já que a criação de um cargo estratégico, como é o caso do CHO, implicaria em movimentações estruturais, econômicos e de processos.”
No fim das contas, a ascensão do Chief Happiness Officer sinaliza um novo tempo no mundo do trabalho. Mais do que uma moda passageira, o cargo representa uma virada na forma como as empresas se relacionam com seus talentos. Colocar a felicidade no centro das decisões não é apenas uma escolha ética, é um movimento estratégico. “Isso já não é mais um diferencial, mas uma expectativa clara dos profissionais”, conclui Marcelo de Abreu.
Por Andrezza Hernandes – Redação MundoCoop

Reportagem exclusiva publicada na edição 124 da Revista MundoCoop