O cooperativismo brasileiro tem colecionado diversos cases de sucesso, tanto dentro quanto fora do país. E o resultado disso é que cada vez mais cooperativas têm encontrado oportunidade de se alinhar a diversas parcerias internacionais. Recentemente, o Conselho Mundial de Cooperativas de Crédito (WOCCU) anunciou a adição do SICOOB, um dos maiores sistemas cooperativos financeiros da América Latina, como seu novo membro, que agora faz parte de uma estrutura de membros revisada do Conselho da WOCCU Conselho de Administração, tendo sido aprovado no início deste ano.
Não é novidade que o SICOOB é um dos gigantes nacionais do setor corporativista: possui mais de US$ 43 bilhões em ativos, apoiando mais de 14 cooperativas de crédito centrais e 343 cooperativas de crédito afiliadas individuais. No total, são atendidos mais de sete milhões de membros em todo o Brasil. Por isso, Marco Aurélio Almada, CEO do SICOOB, afirma que a novidade é motivo de grande satisfação. “Isso evidencia o compromisso da nossa instituição com os princípios do cooperativismo financeiro, como também confirma a importância do tema à escala global.”
No entanto, o fato de o SICOOB integrar o WOCCU vai além de uma nomeação propriamente dita. Para Clara Maffia, gerente de relações institucionais do Sistema OCB, tal parceria veio em boa hora e oferece espaço para o setor se fortalecer ainda mais globalmente. “Ela reforça a pujança do cooperativismo de crédito brasileiro no cenário mundial e que tem se destacado em relação aos pares internacionais no que se refere à maturidade normativa; temos um excelente arcabouço legal, bem como no crescimento e participação no Sistema Financeiro Nacional (SFN). Consideramos a presença do SICOOB no Woccu uma consequência natural desse protagonismo que tem marcado a atuação das nossas cooperativas de crédito no desenvolvimento de atividades que envolvem a inclusão financeira, o financiamento de projetos sustentáveis e o desenvolvimento das comunidades, principalmente em áreas mais distantes, onde a presença dessas cooperativas oferece resultados significativos na oferta de crédito para seus associados, pessoas físicas ou jurídicas”, diz ela, acrescentando que as cooperativas de crédito são a única instituição bancária fisicamente presente em 322 municípios brasileiros, desempenhando um papel vital na integração monetária de áreas remotas.
Outro exemplo bem-sucedido é o Sicredi, membro direto do WOCCU há mais de 20 anos, e uma das organizações que defendeu uma maior inclusão através da abertura da adesão a essa entidade a mais de uma associação nacional por país, mesmo que isso significasse acolher uma das suas concorrentes. Segundo Manfred Alfonso Dasenbrock, diretor do WOCCU e presidente da Central Sicredi PR/SP/RJ, é o primeiro projeto em nível mundial no qual mais de um sistema do mesmo país integra o Conselho Mundial, o que antes era vedado no estatuto interno. “Com o apoio dos membros do colegiado e a liderança da Elissa McCarter LaBorde, nossa CEO, conquistamos esse avanço no campo dos estatutos internos do WOCCU. O objetivo dessa iniciativa é unir esforços em nível global, para caminharmos juntos no campo regulatório, a exemplo do que nós temos no Brasil no Conselho Especializado de Crédito da Organização das Cooperativas Brasileiras (CECO) da OCB, que nos representa nas frentes regulatórias e, dependendo do tema, são iniciadas conversas com órgãos reguladores, principalmente os do Parlamento”, explica ele.
Manfred detalha, ainda, que a ideia é ter uma atuação de forma conjunta e, com isso, fortalecer o sistema diante de temas de interesse geral em campos como Comitê da Basileia, FGCoop, entre outros. “É um esforço no sentido de intercooperarmos em temas de interesse geral como as questões ambientais, por exemplo”, completa.
Desta forma, parcerias com entidades tão relevantes como o WOCCU fazem com que o cooperativismo rompa fronteiras, em todos os aspectos. Para Clara Maffia, gerente de relações institucionais do Sistema OCB, o cooperativismo nacional já avançou muito na construção de um marco legal que propiciasse seu desenvolvimento e crescimento. “Repito que o papel que o cooperativismo nacional desempenha na inclusão financeira das pessoas, em especial aquelas que estão nas localidades mais longínquas, é um diferencial que ele oferece como referência para o resto do mundo, conquistando cada vez mais relevância nos debates promovidos pelo WOCCU. Com a integração do Sicoob ao Conselho, certamente o cooperativismo de crédito nacional será utilizado como referência para os demais países membros”, observa.
Os números não negam que, se continuar assim, o cooperativismo de crédito vai crescer exponencialmente conquistando, inclusive, maior reconhecimento junto à sociedade. De acordo com dados do Banco Central, o Sistema Nacional de Crédito Cooperativo (SNCC) registra depósitos totais superiores a R$352 bilhões e um volume de operações de crédito superior a R$361 bilhões. O número de cooperados cresceu significativamente em 2022, alcançando diretamente 15,5 milhões de pessoas. Além disso, o segmento gera 99 mil empregos nas cooperativas distribuídas em todas as regiões do país. “Guiados pela visão de um futuro financeiro mais cooperativo e acessível para todos, o nosso compromisso é divulgar e colaborar ativamente com os nossos parceiros globais, esforçando-nos por moldar um sistema financeiro sustentável, transparente e centrado nas pessoas”, acrescentou Miguel Oliveira, Presidente do Conselho de Administração do SICOOB.
Vale destacar que a nova estrutura de membros do WOCCU também permite que as cooperativas de crédito de primeiro e segundo nível se tornem Membros Associados, caso estejam localizadas em países onde o WOCCU não tenha um Membro Direto existente. A adesão associada também permanece aberta às confederações cooperativas financeiras regionais enquanto organizações de serviços de cooperativas de crédito, fintechs e outros parceiros da indústria, que anteriormente eram Membros Associados, agora são reconhecidos na nova categoria de Membro de Apoio. A estrutura revisada de membros não altera os privilégios de voto no WOCCU: os Membros Diretos ainda serão as únicas organizações autorizadas a votar na Assembleia Geral Anual do WOCCU e serão elegíveis para nomear representantes para o Conselho de Administração do WOCCU.
EM PAUTA
Manfred Alfonso Dasenbrock, diretor do WOCCU e presidente da Central Sicredi PR/SP/RJ, fala sobre os 20 anos do Sicredi como membro do WOCCU, perspectivas para o futuro e como as entidades podem se unir em prol do setor
Mundocoop: Qual a importância de o Sicredi abrir caminho para que outras cooperativas de crédito sigam o mesmo caminho e se tornem membros associados do WOCCU?
Manfred Alfonso Dasenrock: Essa conquista mostra que há espaço para outros sistemas como Unicred, Cresol e Ailos, e demais sistemas organizados terem esse mesmo espaço para integrarem o WOCCU, enquanto membros associados. Creio que a força para isso acontecer sejam essas pautas comuns que nós temos ao redor do mundo, principalmente os temas ligados a nossas fundações e institutos, assim como as pautas regulatórias em nível global, as quais refletem também nacionalmente. É muito importante reunir forças nos lugares onde atuamos para alcançar vitórias relevantes para o nosso setor, a exemplo da recente conquista da Lei Complementar 196, aprovada por unanimidade e sem vetos no Senado e Congresso brasileiros. Queremos fortalecer esse movimento para ampliar a nossa representação e ampliar o número de membros associados ao WOCCU. Então, com isso, formamos um modelo maior, mais robusto, no qual seremos exemplo para o mundo e o espaço está aberto às entidades interessadas.
Mundocoop: Num cenário em que a tecnologia e a sustentabilidade estão em voga, impactando ainda no debate em relação ao sistema financeiro em geral, como essa associação ao WOCCU pode, praticamente, torná-lo mais sustentável, transparente e focado nas pessoas?
Manfred Alfonso Dasenrock: Sim, nós temos um grande movimento que é a nossa Conferência Mundial das Cooperativas de Crédito, realizada anualmente. Em 2024, será em Boston, nos EUA, junto com a American Credit Union – sistema de cooperativas de crédito americano –, essa parceria dará uma visibilidade global para o evento e deve atrair a participação de muitas pessoas, tanto do Sicredi como de outras entidades, cada vez mais presentes nas atividades. Isso cria um movimento de debate e troca de ideias dos representantes brasileiros perante os demais países e gera o movimento desses representantes levarem essas ideias para seus sistemas no Brasil, principalmente no que tange questões da agenda ESG e regulatórias como a pauta das mudanças climáticas, trabalhada na COP28, um tema no qual nosso segmento precisa estar engajado, e o espaço de Conselho é muito produtivo para isso.
Mundocoop: Quais ações são desenvolvidas, em sinergia da Sicredi com o WOCCU?
Manfred Alfonso Dasenrock: Nós temos, ao longo dessas décadas de parceria, realizado muitas ações que, além de mostrar a eficiência do nosso modelo, têm sido fundamentais para a troca de experiência. O planeta tem novos, e mais relevantes, desafios. Temas muito sensíveis como: inclusão, diversidade, clima e sustentabilidade, atenção a refugiados, regulação do nosso setor que são trabalhados no ambiente do Conselho. Assim como o movimento de fomento de lideranças jovens dentro do cooperativismo, o qual, a partir do modelo do WOCCU, adaptamos ao Brasil e temos tido muito êxito, são todos assuntos que colocamos energia, investimentos e conseguimos um bom eco dentro do Sicredi. Temos orgulho em reforçar que o Sicredi procurou ser muito ativo nesse movimento, colaborando para essa abertura do Conselho que, de certa forma, é um piloto a nível global, uma experiência para países como o Caribe, o Canadá, vários países da Europa, da Ásia, entre outros, que têm condições de fazer o mesmo.
Mundocoop: Pode fazer um balanço desses 20 anos na WOCCU e como isso impacta no que a Sicredi representa, hoje, para o setor?
Manfred Alfonso Dasenrock: Posso afirmar que é um movimento que ganhou notoriedade na última década. Vale destacar que, nesse período, tivemos um momento importante que foi a Lei Complementar 130 – que regulamentou as cooperativas de crédito no Brasil e trouxe muitos ganhos para o cooperativismo, a exemplo da constituição do nosso Fundo Garantidor do Cooperativismo de Crédito (FGCoop). São avanços relevantes que foram permeando a nossa caminhada e deram maior visibilidade ao cooperativismo de crédito brasileiro, movimento beneficiado também pela colaboração da OCB, especialmente por meio da criação do CECO. Pudemos reunir forças para a aprovação da Lei Complementar 196 – responsável por fortalecer o cooperativismo de crédito no sistema financeiro. Foram fóruns específicos que renderam reflexos, especialmente em países da América Latina, onde nós temos um convênio de cooperação, por exemplo, com: Peru, Colômbia e Costa Rica. São países muito próximos, com uma sinergia muito grande de intercooperação.
Mundocoop: Quais são as perspectivas para o futuro?
Manfred Alfonso Dasenrock: É fundamental dar atenção a todas as questões ambientais e migrações globais, assim como temos um desafio no campo da educação brasileira, principalmente por conta da nossa conexão com as comunidades, a qual gera uma série de oportunidades de impacto positivo no nosso segmento. O Brasil é um país que acolheu diversas culturas, etnias e, por meio da participação no Conselho, conseguimos levar nosso exemplo e ter uma posição, inclusive, de protagonismo em prol da paz mundial. O próximo ano foi estabelecido pela ONU como o ano do cooperativismo e, intercooperação, teremos cada vez mais força para cooperar com os desafios brasileiros e mundiais.
Por Letícia Rio Branco – Redação MundoCoop
Conteúdo exclusivo publicado na edição 115 da Revista MundoCoop
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