Lembro-me de dois momentos interessantes, mas, também, surpreendentes, que vivi, dialogando com um jovem e um idoso. O primeiro, de 19 anos, contou-me que tendo sido aprovado em concurso para o serviço público, ao assinar o termo de admissão ficara triste porque, a partir daquele dia, seria obrigado a trabalhar durante 35 anos para obter a sonhada aposentadoria, ou seja, aos 54 anos. Para os dias de hoje, ainda um “guri”. Pensava em aproveitar mais a vida do em trabalhar. Soube, depois, que não durara no emprego.
Em contrapartida, tive a felicidade de conhecer e conviver com o ex-deputado federal constituinte, secretário de estado da agricultura e vice governador de Santa Catarina, Victor Fontana, um engenheiro agrônomo com vários cursos no exterior e que foi a mola propulsora da Sadia, em Concórdia-SC, empresa fundada por seu tio Atílio Fontana. Nos nossos sempre prazerosos encontros, ele não se cansava de afirmar: “A pessoa que trabalho e se aposenta obrigatoriamente aos 70 anos, deve, no dia seguinte, continuar trabalhando, porque, se assim não o fizer, está se aproximando da morte”. Sábias palavras. Ele viveu bem até os 101 anos. Lendo frases do dramaturgo escocês, Sir Walter Scott (1771-1832), uma me chamou a atenção: “Descansar em demasia é oxidar-se”. Essa era a visão àquela época, dita num momento de grande lucidez.
No mundo, o primeiro país que criou um plano de aposentadoria foi a França – em 1673 – construindo um sistema estatal exclusivo para os membros da Marinha Real. Dois séculos depois, esse plano também se estenderia para funcionários públicos. No Brasil, não foi diferente. Sistemas análogos ao previdenciário surgiram a partir de 1888 beneficiando principalmente setores que eram importantes para o império: os funcionários dos correios, da imprensa nacional, das estradas de ferro, da marinha, da casa da moeda e da alfândega. Mas foi só em 1923 que o Brasil viu o ponto de partida da história da Previdência social como conhecemos hoje. Assim, a aposentadoria é um direito do trabalhador em qualquer área para prover sua existência quando completar seu plano de contribuição e atingir a idade legal.
Sim, vou me aposentar. E agora? Qualquer que seja o tipo de aposentadoria, ficar em casa lendo jornal, assistindo programas de TV, lendo bons livros? Apenas isso? Essa conduta não é recomendável. Além de medidas para cuidar da saúde como alimentação adequada, exercícios físicos, relacionamento familiar e social, uso de medicamentos sob orientação médica e ter um plano de previdência privada, é preciso ter consciência que a longevidade do ser humano aumentou muito e continua aumentando, atingindo, no Brasil, o percentual de quase 30% da população sendo chamada de idosa. Essas pessoas atingiram a “idade prateada”.
Mas, não significa deixar de trabalhar. O talento individual não morre e deve ser usado em benefício próprio, de seus familiares e de seus pares. Inúmeros exemplos poderiam ser dados. Porém, quero deixar aos leitores a reflexão de que, mesmo aposentado por tempo de serviço, não pare de trabalhar. Busque alguma atividade prazerosa, como aquela de ajudar ao próximo. Se essa atividade lhe render benefício financeiro complementando a aposentadoria, melhor. Mas, se não for assim, coloque na cabeça que não existe atividade mais emocionalmente compensatória do que a solidariedade; ajudar pessoas necessitadas com gestos de compaixão e carinho. Conheço muitas pessoas que praticam esses gestos e vivem bem consigo mesmo.
Encerro com palavras de Charles Chaplin: “Chega um momento em sua vida, que você sabe quem é imprescindível para você, quem nunca foi, quem não é mais, quem será sempre!
Sejamos imprescindíveis!
Por Murillo Ronald Capella, médico em Florianópolis
Conteúdo exclusivo publicado na Revista MundoCoop edição 104
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