Ao citarmos a saúde suplementar no Brasil, podemos afirmar que dessa vez, a conta não fechou. Segundo a ANS – Agência Nacional de Saúde, o resultado das operadoras de planos de saúde, sem incluir odonto e as administradoras de benefícios, foi negativo em R$ 11,5 bilhões. O acumulado em 2022 foi o maior desde 2001, quando o órgão regulador iniciou esse tipo de análise.
De acordo com a ANS, os resultados podem ser justificados, devido ao aumento dos custos dos procedimentos médicos, mas embora menos frequentes, também podem ser gerados pela perda ou estagnação de receitas. Ao efetuar uma análise no setor de saúde suplementar, em uma avaliação preliminar, as despesas assistenciais não apresentam crescimento que possa explicar os aumentos na sinistralidade. Escutamos as análises dos especialistas, que mencionaram são só a pandemia, mas a incidência de fraudes como um fator agravante no setor de saúde suplementar no Brasil.
Ana Nunes, gerente comercial do canal corretor Brasil na Extramed Administradora de Benefícios, explicou que existem vários fatores que alteram as contas no mercado de saúde suplementar. Uma delas, é a fraude. “Quando falamos no mercado de saúde, onde os preços ficam cada vez mais altos e as redes ficam mais enxutas, isso já vem antes da pandemia. E um grande agravante, são as fraudes! Durante a pandemia, houve uma redução de utilização, porque as pessoas não saiam de casa, houve cirurgias suspensas, ou seja, tudo que era eletivo e não era urgência e emergência, ficou para ser feito depois. Quando o mundo voltou e saímos da época da pandemia, claro que houve um uso maior da rede médica. As cirurgias foram feitas, os atendimentos eletivos foram realizados, e isso com certeza, agravou mais ainda.
A executiva ressaltou outra questão, que preciso conscientizar o usuário sobre o uso das clínicas e redes hospitalares. “Outra situação bem importante, é a forma como a gente trabalha o mercado de seguros, da conscientização do usuário e até mesmo do mercado em si. Como que vou conscientizar o beneficiário para trabalhar essa questão? A gente vai chegar em um momento bem complicado. Se queremos ter uma opção de plano de saúde que atendam as necessidades do cliente, a gente precisa se unir nessa força, combatendo a fraude e trabalhando dentro da regra daquilo que é possível, do que tem que ser feito”.
Os dados divulgados pela ANS mostram que a sinistralidade aumentou 2,1 pontos percentuais de 2021 para 2022 e chegou a 89,21%. Isso ainda está em parte relacionado ao represamento ocorrido durante a pandemia e ao aumento da demanda após 2020, que até pode configurar uma mudança no comportamento de consumo de planos de saúde. Mas é claro que se a receita per capita está diminuindo, a sinistralidade cresce. Há também que se considerar a liberação de terapias sem limites e a incorporação de novos procedimentos e medicamentos para tratamento de algumas doenças, que espremeram a margem das operadoras.
O diretor de mercado da Unimed-BH, Garibalde Mortoza Junior, falou sobre o momento delicado e dos desafios do setor de saúde suplementar. “O ano de 2022 foi marcado pela instabilidade política e econômica, além disso, as empresas do setor de saúde suplementar ainda estão sofrendo os impactos da pandemia da Covid-19. Além desses fatores, várias empresas do setor registraram um grande aumento das despesas médicas, o que impactou nos resultados econômico-financeiros. O nosso grande desafio, bem como de todos os outros serviços da saúde suplementar, é manter a sustentabilidade do negócio e as despesas médicas sob controle, mantendo a qualidade e a excelência dos serviços que são ofertados aos clientes”.
Os resultados podem ser explicados pelo aumento dos custos de procedimentos médicos, mas, embora menos frequente, também podem ser gerados pela queda ou estagnação das receitas. Os dados atualizados de dezembro também confirmam o constante aumento da base de beneficiários dos planos desde o início da pandemia, de 47 milhões em dezembro de 2019 para 50,4 milhões em dezembro de 2022. Então, por que os resultados são tão ruins?
Armando Vergilio, presidente da FENACOR – Federação Nacional dos Corretores de Seguros, falou sobre os principais desafios do mercado de saúde suplementar, sobre essa régua da conta que não está fechando. E reforçou que se existe fraude, essa conta vai chegar para o consumidor final. “Uma vez que o sistema independente do ramo, é mutualista. Então, ele é muito bem calculado para um uso responsável e justo. Na medida que esta corrente é quebrada, aqueles que precisam do sistema vão pagar muito mais, em função daqueles que usando de forma inadequada, vão fazer que não só o preço suba, mas que se trace um olhar de desconfiança sobre o mercado. Nós sabemos a importância que tem o seguro saúde hoje, milhões de pessoas que estão nesse sistema, e que poderia ser um sistema mais justo inclusive na precificação, se fosse o número de fraudes que é perpetrado”.
Evaldo de Paula, diretor de expansão do Grupo A12+, falou sobre a responsabilidade do corretor de seguros e do mercado de saúde suplementar, orientar os beneficiários em relação ao uso dos serviços de saúde no Brasil. “Eu vejo que o corretor de seguros, ou seja, quem atua ofertando o plano e o seguro saúde para o consumidor, tem um papel extremamente preponderante nessa questão, porque ela inclusive é muito oportuna. Existe uma guerra, que o preço está alto, que a ANS autoriza mais procedimentos e inviabiliza que o cliente final tenha um produto que caiba no bolso dele. Mas esse próprio cliente quando ele é detentor do uso, acaba ignorando completamente as guias que ele assina. Ele vai no hospital, faz uma consulta, gera um exame e ele assina seis, sete procedimentos. A gente precisa educar o consumidor, para que ele possa ser o primeiro auditor do que ele está assinando, como efetivamente, é ele que paga essa conta. O beneficiário não percebe que é ele que vai pagar essa conta, no decorrer dos anos, ou seja, a conta é dele”.
Para Adriano Londres, sócio fundador da Arquitetos da Saúde, uma consultoria técnica que apoia empresas na gestão de plano de saúde coletivo, é mais uma oportunidade de cobrar mais clareza a toda cadeia para formação de indicadores mais precisos. “Posso reiterar que para nós da Arquitetos da Saúde, é preciso refletir sobre a necessidade de aumentar a eficiência dos planos de saúde e de cobrar mais transparência de toda a cadeia para a formação de indicadores mais claros na formulação de contratos e reajustes. Deveríamos ter, de um lado, empresas que não penalizam o consumidor por suas perdas. E, do outro lado, contratantes mais empoderados justamente para não reforçarem essa engrenagem que sempre se volta contra eles mesmos”, concluiu.
Por Karem Soares – Matéria exclusiva publicada na Revista MundoCoop edição 111
Discussão sobre post