COLUNA COOPERAÇÃO BLOCKCHAIN
Apesar do avanço da regulamentação de criptoativos no Brasil, o tema ainda passa quase despercebido em muitas cooperativas. Em palestras, eventos e conversas que tenho mantido com lideranças e gestores — especialmente do ramo crédito — é comum perceber uma postura de espera: aguardar as diretrizes do órgão regulador ou uma iniciativa do sistema. Mas essa cultura reativa pode ser prejudicial. Enquanto outros agentes se organizam para ocupar novos espaços, o cooperativismo corre o risco de ficar para trás justamente no momento em que a tecnologia abre oportunidades inéditas de fortalecimento institucional.
A promulgação da Lei nº 14.478/2022, o avanço do Drex e, mais recentemente, a inclusão da tokenização de ativos como prioridade regulatória para 2025–2026 sinalizam um caminho claro: o ambiente está sendo preparado para acolher soluções estruturadas com base na tecnologia blockchain — e isso inclui as cooperativas.
Nesse contexto, surge uma pergunta estratégica: as cooperativas vão apenas observar ou se posicionar como protagonistas?
O potencial já está em pauta. A legislação em vigor reconhece a atuação de prestadores de serviços de ativos virtuais (VASPs), e o Banco Central assumirá esse papel regulador. O Drex, ainda em testes, é mais do que um projeto de moeda digital: representa o esforço do Estado em incorporar os ganhos da blockchain ao sistema financeiro nacional.
As Consultas Públicas nº 109, 110 e 111/2024 mostram que o Banco Central não trata os ativos digitais como fenômeno isolado, mas como parte de uma transformação mais ampla. Ao discutir intermediação, custódia, modernização prudencial e flexibilização regulatória, essas consultas revelam um cenário em que inovação e regulação caminham lado a lado — e criam espaço para que as cooperativas ampliem sua atuação de forma segura e atualizada.
Não é difícil imaginar, num futuro próximo, cooperativas oferecendo carteiras digitais para seus cooperados armazenarem tokens e criptoativos, atuando como intermediárias em operações tokenizadas ou mesmo desenvolvendo novos modelos de negócio a partir da lógica da descentralização.
Diante disso, o desafio não é apenas cumprir normas. É entender que estamos diante de uma chance concreta de reposicionamento estratégico. A regulação não bloqueia a inovação — ela abre caminho para que ela aconteça de forma confiável e sustentável.
A blockchain propõe novos modelos de confiança. A lei começa a dar sustentação a esses modelos. E a hora de se preparar já está passando. É preciso investir na capacitação de lideranças e equipes, criar comitês técnicos, contratar assessores com conhecimento específico e incorporar a agenda digital — com ênfase em blockchain e ativos digitais — nos planos estratégicos das cooperativas.
O futuro está em construção. E no cooperativismo, hesitar pode custar mais do que tomar a iniciativa.
*Fernando Lucindo é Advogado, especializado em Cooperativismo e Blockchain

Coluna exclusiva publicada na edição 124 da Revista MundoCoop