Tanto na sociedade, quanto nas cooperativas, a busca pela geração de energia limpa, sustentável e que causem menos impactos ao meio ambiente tem se tornado uma meta prioritária. Uma das possibilidades mais promissoras tem sido o desenvolvimento dos biodigestores ou o biogás, que se mostrou uma alternativa eficiente na gestão de resíduos, além da redução das emissões de gases e do efeito estufa. O Brasil tem tudo para se tornar uma referência nessa produção, pois reúne todos os seus requisitos necessários, que vão desde potencial de resíduos agrícolas, urbanos como lixo, esgoto e dejetos animais.
No ano passado, foi apresentado o Projeto de Lei do Combustível do Futuro (PL 4516/2023) que, se aprovado, impulsiona a produção do biogás e do biometano. A ideia é investir em infraestrutura para a produção, transporte e distribuição do biocombustível, além de definir regras claras sobre o seu uso. A meta é alcançar 5% na matriz energética nacional até 2030, estimulando o aumento de sua demanda e o crescimento no mercado.
Para reforçar o setor, o ministro da fazenda Fernando Haddad, lançou no ano passado, em Nova York, os títulos soberanos sustentáveis, ou títulos verdes. Ele tem como objetivo financiar os projetos de sustentabilidade que podem colaborar para a competitividade das cooperativas. A ideia é levantar mais de US$2 bilhões em emissões.
Marco Morato, coordenador de Meio Ambiente e Energia do Sistema OCB, explicou que a iniciativa vai colaborar para garantir o protagonismo do cooperativismo na transição energética e possibilitar a diversificação de produtos e serviços, gerando renda, produzindo ativos ambientais e conferindo melhor qualidade de vida à comunidade local.
O tema é mais do que necessário, de acordo com um estudo inédito produzido pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), apenas na destinação de resíduos, o país tem condições de reduzir as emissões de 29 milhões de toneladas de gás carbônico (CO2), o equivalente por ano a geração de eletricidade pelas unidades de destinação de resíduos de mais de 280 MW. Isso representa o volume suficiente para abastecer uma população de cerca de 1,5 milhão de pessoas.
Lembrando que segundo a Política Nacional de Resíduos Sólidos, quase 30 milhões de toneladas por ano ainda não têm tratamento adequado.
Os biodigestores oferecem muitas vantagens
O biodigestor é um sistema biológico que transforma matéria orgânica, como por exemplo resíduos industriais, alimentícios, esterco de animais e cultura agrícola em biogás, biometano e fertilizante orgânico. Nesse processo, a produção do biogás é uma mistura de metano e dióxido de carbono, que podem se tornar fontes de energia.
Para se ter uma ideia, um dos principais vilões do meio ambiente é o metano, que está presente em 70% dos gases gerados da fermentação dos dejetos suínos e tem o potencial de aquecimento global 25 vezes maior do que o gás carbônico. Por meio do biogás, esse gás pode se transformar em energia, reduzindo inclusive as emissões de gases efeito estufa. Um galpão de frangos de corte pode gerar cerca de 65.250 m3 de biogás, que quanto convertidos em energia elétrica equivale a 110,1 MW de energia. Os desafios dos produtores brasileiros é tornar a criação animal em sistema sustentável.
Os biodigestores oferecem uma série de vantagens para as empresas e as cooperativas, estão entre eles contribuir para a redução do desperdício de resíduos orgânicos, diminuir os impactos ambientais dos aterros sanitários, diversificar a matriz energética e reduzir a dependência de combustíveis fósseis. Por outro lado, o biogás produzido pelos biodigestores pode ser convertido em energia elétrica, fornecendo eletricidade para as comunidades rurais e a rede convencional.
Os especialistas explicam, que quando se considera a possibilidade de implantar a produção de biogás nas cooperativas é fundamental levar em conta alguns pontos chaves como por exemplo qual é o tipo de resíduo disponível, quantidade de matéria orgânica processada, as condições climáticas e as limitações de espaço.
“É muito importante o engajamento do cooperativismo agropecuário paranaense brasileiro, em especial o do sul do Brasil, o do sudeste e sul do Brasil, com a produção do biogás. Pois é nesses locais que ocorrem a produção agroindustrial, com resíduos passíveis de fazer biodigestão. Isso dialoga com os objetivos do desenvolvimento sustentável, dos mais de 200 países no mundo, por meio das Nações Unidas, que trabalham para reduzir as emissões. Tratar de dejetos significa reduzir a emissão de metano, que é 21 vezes mais poluente do que o CO2”, conta Herlon Goelzer de Almeida, engenheiro agrônomo, coordenador de Energias Renováveis e do Programa Renova SP no IDR Paraná.
Cooperativas produzem energia com impactos ambientais positivos
Há muitos anos, as cooperativas buscam novas formas de produzir energia, gerando menos impacto e focando na preservação do meio ambiente. Algumas delas são o biogás e o biometano, que são produzidos desde a década de 1970, pelos produtores rurais, que aproveitam nele parte da sua produção animal. As perspectivas dentro do cooperativismo são de aumento de produção de biogás. Porque há uma expansão da produção, principalmente de animais, e consequentemente da industrialização dessas proteínas animal, como carne e leite.
A produção passou por várias fases, sendo largamente usado pelas cooperativas, em lagoas de tratamento, no final dos processos frigoríficos, e na própria produção de matrizes, especialmente a partir da década de 80. O produto vem sendo valorizado pelas empresas e organizações já que está respaldado pelas preocupações ambientais e a produção de mais energia.
Ele também encontra apoio no desenvolvimento da tecnologia e na percepção dos cooperados de que o material tem muita capacidade, não só de impactar positivamente o meio ambiente, mas no benefício de criar uma energia direta para os cooperados, a sociedade e as indústrias. Silvio Krinski, coordenador da área técnica e sanitária da Gerência de Desenvolvimento Técnico do Sistema Ocepar, conta que existem várias vantagens de se fazer essa transformação. Uma delas está na redução do potencial de contaminação, já que quando não há um tratamento das lagoas há um maior impacto ambiental.
O especialista conta que o uso do biogás pelas cooperativas é interessante porque se consegue atrelar a sua própria marca, às ações voltadas para a preservação do meio ambiente. Outro ponto importante, é que essas organizações trabalham com modelos de gerações de energias, que conseguem se sustentar sozinhas, sem os subsídios do governo.
De olho nessas vantagens, o estado do Paraná tem se destacado na produção, atualmente se estima que existam de 6 ou 7 cooperativas produzindo biogás dentro das suas plantas. Estão entre elas a Frimesa, Lar, Copacol, C. Vale, Frísia e a Castrolanda. Isso representa uma produção em torno de 4 milhões e meio a 5 milhões de metros cúbicos por ano de biogás. “Falamos aqui só da parte industrial, pois quando pensamos nos produtores e cooperados, não temos dimensão de quanto de biogás é gerado. Não temos essa estimativa”, conta Krinski.
Para auxiliar na evolução dessa produção, a Ocepar tem desenvolvido ações direcionadas às cooperativas há alguns anos com treinamentos e palestras sobre o tema. O objetivo é ensinar aos técnicos de cooperativas a como transformar o passivo ambiental, os dejetos, em ativo ambiental. No curso, os cooperados descobrem, que além da energia limpa gerada pelo biodigestor há um bom retorno econômico para a organização e os produtores.
No Paraná, outras iniciativas tem acontecido, entre elas o programa Renova Paraná, que completou mais de dois anos, com o lançamento de 6.662 projetos de energia sustentável, entre eles os de biometano, biogás instalados em propriedades rurais na região, subsidiados pelo Banco do Agricultor Paranaense. Já foram financiados 6,6 mil projetos, somando R$1,2 bilhão em investimentos.
Cooperativas do Paraná produzem mais de 15,6 mil m² diários de biogás
Algumas cooperativas têm investido pesado no biogás e no biometano, entre elas estão a Castrolanda e a Unium, da região de Campos Gerais, no Paraná. Somadas as produções, elas têm a capacidade de produzir 15,6 mil m2 diários de biogás e uma potência instalada de 1,4 MW. Além de investir em sustentabilidade e economia, a cooperativa ampliou o número de empregos diretos e indiretos. Os investimentos do grupo Unium foi realizado em conjunto com a Castrolanda, Frísia e Capal e recebeu o aporte de R$ 14,5 milhões, rendendo a capacidade de 1,2 MW, a produção de 550 m²/hora de biogás, o que corresponde a 13,2 mil m² ao dia.
Outra Unidade da Castrolanda é a de Produção de Leitões (UPL) de Piraí do Sul, no Paraná, com um investimento de R$4 milhões. Ela possui um biodigestor com potência instalada de 230 kW, com produção de 100 m 2 por hora (2,4 mil m 3/dia) de biogás. No biodigestor da Unium, os resíduos vindos do frigorífico chegam por tubulação. Os demais são transportados por caminhão e recebidos em uma área de recebimento de resíduos sólidos e efluentes.
Algumas das vantagens dessa produção é a formação de uma economia cíclica, aproveitando os resíduos, gerando energia limpa, emprego, renda e retorno financeiro para as cooperativas. Na região de Toledo, no Paraná, a família Angst, cooperada da Primato Cooperativa Agroindustrial, está liderando uma produção agropecuária com o auxílio do biogás.
Os proprietários, Maria e Emílio Angst, os filhos Luiz Henrique e Lucas Adriano, trabalham há 20 anos na criação de suínos e na atividade leiteira. Eles estão investindo R$1,3 milhões na instalação de um biodigestor, com as ajudas do Plano Safra, Banco do Brasil e o suporte técnico do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-Paraná).
O Projeto de biogás e biometano da Família Angst não apenas está mudando a realidade da família, mas também fortalecendo a cooperativa e promovendo o desenvolvimento sustentável regional. Com a capacidade de criar 7,8 mil porcos de uma vez e um rebanho de vacas leiteiras triplicado, os cooperados estão fazendo uma revolução de recursos. Os dejetos dos animais são transformados em biometano, que alimentam os caminhões da Cooperativa Primato. Essa iniciativa não apenas reduziu os custos de combustível da cooperativa, mas também resolveu um passivo ambiental. Eles entraram para a história como a primeira família cooperada a abastecer um caminhão movido a biometano.
Em Alagoas, a Cooperativa Pindorama, que está localizada nos municípios de Penedo, Coruripe e Feliz Deserto, foi a primeira cooperativa agroindustrial do Norte-Nordeste a implementar uma unidade de produção de biogás e biometano, em parceria com a ZEG Biogás. A organização fez um investimento de R$65 milhões, e espera iniciar as suas operações no segundo semestre de 2025, com uma produção anual estimada em 6 milhões de metros cúbicos de biogás e biometano. O projeto está 100% alinhado com as políticas de descarbonização, podendo substituir combustíveis fósseis, como o diesel, para transportes, e o gás natural, para a indústria. “Todas as cooperativas, têm olhado para esse assunto, porém, apenas algumas conseguem trabalhar e evoluir com relação à sua produção. Nós acreditamos que o biogás e o biometano são alternativas tanto ambiental como também de geração de energia com aspectos positivos”, finaliza Silvio.
Por Priscila de Paula – Redação MundoCoop
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