A sustentabilidade é a principal – se não a maior – agenda da atualidade. Essa é a pauta que muda hábitos de consumo, direciona prioridades, reestrutura negócios e altera os rumos do mercado.
Contudo, a sustentabilidade também é o conceito que já estava presente em inúmeras realidades, antes mesmo de se tornar uma discussão recorrente e global. E esse cenário pode ser visto fortemente na maior floresta tropical do mundo, a Amazônia.
Hoje, não é possível falar em preservação sem levar em consideração os mais de 20 milhões de habitantes que ocupam a região Amazônica em território brasileiro. São essas pessoas que contribuem para o equilíbrio de diversos ecossistemas e para o protagonismo de práticas sustentáveis efetivas, em contraponto a crimes ambientais ainda recorrentes.
Atuando na região do Arquipélago do Bailique, na foz do Rio Amazonas no Estado do Amapá, a Cooperativa Amazonbai representa algumas delas e se tornou uma referência em manejo sustentável da floresta.
Fundada em 2017, a Cooperativa foi criada com o propósito de melhorar a comercialização e os preços para os produtores de açaí, reduzindo a dependência de intermediários e, assim, garantindo uma distribuição mais justa da renda. Mas foi no extrativismo sustentável que encontrou um caminho para desenvolver as comunidades, a educação dos jovens e a conservação da Amazônia.
“As principais atividades envolvem a coleta, processamento e comercialização do açaí, com foco em práticas sustentáveis e de mínimo impacto. Além disso, a cooperativa trabalha com uma lógica da estreita colaboração com as comunidades locais para oferecer capacitação e assistência técnica continua em manejo sustentável, promovendo o desenvolvimento socioeconômico da região”, relata Amiraldo Picanço, Presidente da Cooperativa Amazonbai.
De acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o Amapá tem consistentemente apresentado taxas de desmatamento significativamente mais baixas em comparação com outros estados da Amazônia. Em anos recentes, o Amapá tem mantido mais de 70% de sua cobertura florestal intacta, um testemunho do compromisso do estado com a conservação e a sustentabilidade.
Nesse contexto, a população local, composta principalmente por pescadores, agricultores e extrativistas, tem o açaí e o peixe como pilares de sua subsistência. A cultura ribeirinha é profundamente enraizada, com os rios desempenhando um papel central como via de transporte, meio de subsistência e parte integrante da identidade cultural.
É nesse ecossistema que a Amazonbai se destaca. Atualmente, a cooperativa representa dois territórios e possui dezenas de associados, incluindo produtores extrativistas de açaí que também desempenham outras funções como pescadores e agricultores. Amiraldo destaca que a interação com a comunidade é uma parte fundamental da abordagem de atuação da cooperativa que trabalha de mãos dadas com as comunidades locais em todas as fases do projetos. “A Amazonbai acredita na importância de envolver a comunidade em todas as etapas do processo e através desse contato com os produtores agroextrativistas por meio de consultas regulares e práticas de tomada de decisão inclusivas, garante que a comunidade esteja no centro de todas as suas atividades”, acrescenta.
Recentemente, a Cooperativa anunciou a primeira exportação direta de açaí liofilizado (açaí em pó) para os Estados Unidos. De acordo com a cooperativa, a contratação inicial foi de 10 toneladas do produto e venda para os estadunidenses deve garantir um valor de até R$ 2,4 milhões por mês aos 141 ribeirinhos da região.
Unindo sustentabilidade e inovação, a Amazonbai é a tradução do que tem se destacado cada vez mais no mercado e conquistado a preferência de consumidores. Além disso, os frutos colhidos se alinham perfeitamente com a visão de futuro que guia os planos da cooperativa. “Queremos expandir para outros territórios da Amazônia e contribuir com o desenvolvimento econômico sustentável, sem precisar degradar o meio ambiente”, finaliza o Presidente.
A Amazonbai possui o selo internacional FSC de Manejo Florestal e Cadeia de Custódia, uma certificação pioneira para a cultura do açaí.
Do cooperativismo para o futuro
Com o pioneirismo que se deve pela participação da comunidade, a Amazonbai é uma grande representante de como o cooperativismo é um aliado no desenvolvimento sustentável do país.
É fato que a preservação ambiental está diretamente ligada a intervenção humana. Nesse sentido, as cooperativas aparecem como importante meio de organização coletiva de povos e comunidades tradicionais, que fazem uso econômico da floresta, dos solos e dos rios, orientando formas racionais e sustentáveis de manejo e criando mecanismos para proteger esse ecossistema.
“Podemos dizer que o cooperativismo é um dos modelos organizacionais que mais combinam com a economia da sociobiodiversidade da Amazônia hoje e isso não é uma percepção filosófica sobre as cooperativas; elas realmente precisam empreender um novo modelo de negócio, centrado em seus cooperados e na valorização econômica da floresta viva para se manterem competitivas nos mercados”, reforça Alair de Freitas, Professor e Pesquisador na UFV e pesquisador integrante do Observatório do Cooperativismo na Amazônia.
Segundo dados do Censo Agropecuário e DAP (Declaração de Aptidão ao Pronaf), na região Amazônica, cerca de 61,5% dos estabelecimentos da agricultura familiar cooperativada relatam não utilizar agrotóxico na produção. Ainda, 8,11% fazem uso de adubação orgânica, contra 5,97% dos estabelecimentos da agricultura familiar não cooperativas. Exemplos cooperativos que demonstram contribuições das cooperativas para a sustentabilidade.
Mas engana-se quem pensa que esse impacto é local. A intervenção das cooperativas nessas regiões intensifica o desafio ainda existente de despertar a consciência dos consumidores ao mesmo tempo que reforçam a importância de políticas públicas que promovam assistência técnica, difundam tecnologias e crédito e concedam benefícios tributários e fiscais aos produtos de origem sustentável da agricultura familiar, povos e comunidades tradicionais, limitam a oferta e oneram os produtos para os consumidores finais.
Ação coletiva gera resultados coletivos, não apenas para o presente ou o amanhã, mas para que exista um futuro nas próximas gerações. “Quanto mais conhecermos sobre o cooperativismo na Amazônia, mais será possível planejar intervenções que ampliem sua capacidade produtiva e gerencial e fortaleça sua resiliência. Se o futuro da Amazônia for mais cooperativo, teremos mais chances de manter a floresta viva e os rios fluindo”, conclui Alair.
Por Fernanda Ricardi – Redação MundoCoop
Matéria publicada na edição 118 da Revista MundoCoop
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