Liderança é processo, e um líder que se conhece, tem ciência de seus pontos fortes, limitações e saber administrar emoções apresenta características mais ao estilo chamado liderança autêntica. Esse tipo de líder também valoriza nas pessoas os pontos fortes delas e reconhece aspectos que podem ser melhor trabalhados, contribuindo para o desenvolvimento de cada um. E colabora para um ambiente de confiança e de bons relacionamentos na organização.
“A consciência de que diante das incertezas, de ambientes muito marcados por paradoxos, em que há divergência de percepções, é muito importante e urgente que as lideranças sejam capazes de olhar para seu próprio processo e para o outro; um caminho para alcançar a liderança autêntica”, avalia Luciana Ferreira, professora de Liderança e Comportamento Organizacional da Fundação Dom Cabral.
“Uma liderança autêntica é inspiradora, porque traz seus pontos positivos e negativos com muita coerência ao longo do tempo, isso inspira”, pondera Luciana. A coerência vai além de fazer o que diz, inclui vivenciar o que se pensa.Isso inclusive ajuda a tomar decisões difíceis e até a encontrar a empresa com ambiente, cultura e propósito coerentes com o perfil desse líder, para que possa exercer sua autenticidade no dia a dia. “Nem toda liderança serve para todos os lugares é muito importante entender isso”, pontua.
MENOS CENTRALIZAÇÃO E CONTROLE E MAIS PARTICIPAÇÃO
“A velocidade das mudanças, na maioria dos setores da economia e das áreas dentro das empresas, tende a funcionar cada vez pior com lideranças baseadas no controle unilateral”, avalia José Vicente de Mello Cordeiro, coordenador dos cursos de pós-graduação em Desenvolvimento de Lideranças da FAE Business School. A tendência é de que as equipes evoluam para mais membros com capacidade e autonomia, lideradas por pessoas que aprendem e produzem melhor na diversidade.
Essas transformações exigem formas de pensar mais complexas. Cordeiro comenta que o desenvolvimento de lideranças tem apresentado, historicamente, um viés tecnicista (ensinar técnicas de feedback, delegação, comunicação assertiva, negociação, etc.), o que por si só não garante a melhoria nas equipes. “Aí vem talvez a maior necessidade de mudança nos processos de desenvolvimento de lideranças: não vai se resolver o problema engajando apenas a mente do líder. Será necessário envolver suas dimensões emocional e interpessoal. Isso vai exigir boa dose de esforço e de vulnerabilidade do líder, bem como apoio da área de RH e dos seus superiores”, projeta.
Apesar das empresas estarem buscado modelos mais ágeis de gestão, adicionar tecnologia atual e implementar técnicas ágeis sem se atualizar a cultura organizacional não produz efeitos concretos. “O maior obstáculo é justamente a cultura que se enraizou com décadas de gestão hierarquizada e burocrática”, avalia Cordeiro.
TRANSFORMAÇÕES PARA AS QUAIS LÍDERES DEVEM SE PREPARAR
Os profissionais ouvidos apontam que, na dinâmica do mercado atual, líderes de qualquer setor de atividade econômica, porte ou maturidade de empresa precisam enfrentar conflitos de múltiplas gerações e maior heterogeneidade no ambiente organizacional. Entendendo o conflito como algo positivo, que gera movimento, unir em equipe profissionais de gerações distintas pode ser uma situação positiva, que traz visões de mundo e de valor do trabalho diversos, mas capaz de criar um ambiente mais inclusivo e promover soluções inovadoras. Além disso, o relacionamento dos jovens com o trabalho exige da liderança a habilidade de conciliar a oferta de qualidade de vida e propósito aos liderados sem deixar de demandar empenho e resultados.
Outro ponto tem a ver com as desigualdades. Elas “vão oferecer limites para os modos de produção e para o consumo e, portanto, para rentabilidade das empresas. Mas, existem muitas oportunidades”, projeta Luciana Ferreira. Uma possibilidade seria olhar políticas públicas menos como obrigação e mais como propósito. “Isso é um caminho muito importante, aumenta a percepção positiva, melhora a reputação da empresa, traz impacto positivo, favorece as condições do mercado e, por isso, ela pode se sair melhor”.
Até mesmo incertezas decorrentes da introdução de novas tecnologias em contextos organizacionais também merecem atenção. A inteligência artificial, por exemplo, ainda em estágio inicial no mundo empresarial, à medida que for ganhando espaço, os profissionais terão de estar preparados para fazer melhores perguntas. “Isso irá demandar formas mais complexas de pensar. Portanto, o melhor que uma empresa pode fazer hoje é se tornar, cada vez mais, uma organização focada em desenvolver líderes e pessoas”, recomenda Cordeiro.
Aprender a aprender
Para tudo isso, é necessário a líderes e liderados capacidade de reconhecer que o que aprendeu já não é suficiente. O líder que compreende a importância desse processo trabalha melhor delegação de tarefas, estabelece uma dinâmica mais democrática; procura não só acertar, mas aprender e transformar. O treinamento de liderados faz que se sintam capazes. “O aprendizado contínuo colabora para trazer mais significado àquele trabalho que está sendo realizado”, diz Luciana Ferreira.
Efetividade é melhor que eficiência
Diante dessas novas configurações no ambiente organizacional, “uma das piores formas de avaliar a liderança é usando critérios de eficiência. Liderança precisa ser efetiva”, defende Luciana Ferreira. Um líder efetivo é aquele capaz de desenvolver outras pessoas, inclusive novas lideranças, fazer a gestão da mudança, ou seja, lidar com momentos de transição, e tomar decisões difíceis. “Não é mudar o mais rápido economizando o maior volume de recursos possíveis; é promover um processo de transição que sustente uma nova realidade organizacional. Não é eficiência, mas efetividade”, sublinha.
O PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DE LÍDERES COOPERATIVOS
As cooperativas podem ter tanto líderes eleitos dentre cooperados (conselheiros), quanto executivos contratados do mercado. Os primeiros com uma atuação mais estratégica, os segundos, mais voltados a garantir a realização dos objetivos definidos. “Nós trabalhamos uma gestão democrática, procuramos ouvir o colaborador, suas sugestões de melhorias. Isso ajuda o relacionamento líder e liderado”, afirma Haroldo Polizel, superintendente geral da Integrada Cooperativa Agroindustrial.
“A escuta ativa é fundamental nessa convivência. Não tem mais a história de manda quem pode, obedece quem tem juízo. Tem de praticar a empatia, colocar-se ao lado do outro, fazer que o outro também se coloque do seu lado para enxergar do seu ângulo de visão, e essa troca de experiência e visões diferentes enriquece a equipe e contribui para o sucesso da cooperativa”, complementa.
Para ele, avaliação e feedback são os momentos importantes entre líder e liderado que permitem reconhecer as boas ações, orientar o desenvolvimento do profissional, alinhar expectativas e até identificar futuros líderes. Além da observação no dia a dia, os processos de escuta e feedback ajudam líderes a identificar em suas equipes possíveis novas lideranças, que são convidadas a iniciar um processo de desenvolvimento, em busca de sucessores capazes de enfrentar esses e novos desafios, aliando a doutrina cooperativista. Compreendendo a importância da liderança permitir a inovação, um programa interno incentiva as novas ideias e até premia as melhores inovações.
A Integrada investe, por exemplo, em cursos de formação e atualização, tanto a líderes cooperados quanto integrantes executivos. “O líder precisa foco em pessoas, trabalhar de forma colaborativa, agir com ética, comprometido com a entrega de resultados, compartilhar o caminho e o destino. Assim ele vai inspirar pessoas”, destaca Polizel.
Por Nara Chiquetti – Matéria exclusiva publicada na Revista MundoCoop Edição 113
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