Segundo a pesquisa Customer Experience da Gartner, nunca se investiu tanto na Experiência do Cliente. Mais de 80% das empresas acreditam que competem com base na experiência, enquanto 90% possuem uma posição de liderança sênior responsável pelo CX.
Se nas últimas décadas as organizações aprenderam que a experiência de seus clientes importa, agora elas estão percebendo que a experiência de seus colaboradores também importa – impulsionadas por fatores como aumento da competição local e global por talentos, aumento das taxas de turnover, novas expectativas em relação ao trabalho e ainda a menor separação entre vida pessoal e profissional (especialmente após a pandemia em 2020).
Da mesma forma que Customer Experience (CX) se tornou indispensável para vencer a “guerra por clientes”, agora chegou a hora da revolução do EX (Employee Experience) como forma de vencer a “guerra por talentos”. Isso permitirá que as organizações aumentem sua capacidade de atraí-los, engajá-los e retê-los.
Apesar de ser um tema novo, já existem dados sobre o impacto do EX na performance das organizações. No livro “The Employee Experience Advantage”, Jacob Morgan constatou que empresas do quartil superior do seu EX Index, quando comparadas às do quartil inferior, possuem 7x mais capacidade de inovar, 2x mais receita, 40% menos turnover e 7x mais facilidade em atrair talentos.
O que é Employee Experience (EX)?
A definição clássica de EX foi herdada do CX: é a soma de tudo que os colaboradores encontram, fazem, veem e sentem no seu relacionamento com uma empresa. É uma definição simples que pode ser resumida como “a soma de tudo que vivemos ao longo da jornada” — ou seja, do primeiro ponto de contato no processo seletivo até nosso último dia de trabalho. Portanto, atuar com esse olhar significa investir em compreender e agir em todos os pontos de contato desse relacionamento entre empresa e colaborador.
Outra forma de pensar em EX é refletir sobre a sua relação com o Employee Engagement (engajamento do colaborador). Como já sabemos, diversos estudos apontam que pessoas mais engajadas no trabalho são mais produtivas, performam mais e permanecem na organização por mais tempo. Contudo, apesar de existir historicamente muito investimento para aumentar o engajamento, segundo o Gallup State of the Global Workplace: 2023 Report, 77% da força de trabalho global está desengajada gerando um prejuízo estimado em 8,8 trilhões de dólares para a economia global.
Jacob Morgan sugere que não faz sentido investir em ações de engajamento, já que ele não é a origem dos problemas, e sim a consequência de experiências positivas ou negativas que as pessoas têm no trabalho. Sua opinião, portanto, é que os investimentos devem ocorrer em ações de melhoria de experiência que resolvam estruturalmente os problemas enfrentados pelas pessoas no dia a dia.
Apesar de ser simples, essas definições também são genéricas e não nos ajudam a compreender de forma clara o que efetivamente impacta EX. Por isso, é possível explorar o tema sob o prisma de como definimos o que é a “experiência ideal”. Podemos imaginar que existem duas perspectivas nesse sentido: a da empresa e a dos colaboradores. De um lado, existe o desenho organizacional das expectativas e necessidades dos colaboradores, no qual construímos processos e políticas – o modelo de reconhecimento e recompensa, os processos de recrutamento e onboarding, entre outros – da forma como acreditamos fazer sentido para as pessoas. Do outro lado, existem as reais expectativas e necessidades das pessoas.
A Employee Experience, neste contexto, nada mais é do que a interseção entre essas duas perspectivas. Ou seja, quanto mais acertamos no desenho da organização com base no que as pessoas realmente querem, melhor é o nosso “Design de Experiência do Colaborador” e, consequentemente, menor é o Gap de Experiência.
O desafio é que, em geral, a nossa visão sobre o que importa para as pessoas é enviesada por quem somos e pelas nossas metas: mesmo com boa intenção, construímos a empresa com a organização no centro. Por isso, precisamos refinar constantemente a nossa visão sobre o que importa para as pessoas. Essa é a única forma de construir uma empresa com os colaboradores no centro.
Mark Levy — ex-Global Head of Employee Experience no Airbnb e provavelmente um dos profissionais pioneiros em EX no mundo —, diz que “Employee Experience is about doing things with and for your employees, not to them”. Ou seja, EX não é sobre construir uma organização PARA as pessoas, e sim sobre construir uma organização COM as pessoas, trazendo-as para o centro desse processo.
EX e Employer Branding (EB)
Como já pontuado, Employee Experience é tudo que engloba a experiência dos colaboradores na sua jornada em uma empresa. Já Employer Branding — ou Gestão da Marca Empregadora — está atrelado à reputação da empresa como um bom lugar para se trabalhar. Ao englobar tudo que uma empresa faz intencionalmente ou não intencionalmente para promover sua identidade para colaboradores e potenciais colaboradores, o EB pode ser considerado o primeiro ponto de contato do futuro colaborador com a empresa.
Por se tratar da primeira interação, a experiência da pessoa candidata é acompanhada da primeira impressão, dos primeiros pensamentos e dos primeiros sentimentos de uma pessoa sobre uma organização. Para atrair e reter as melhores pessoas, é preciso encantá-las desde o início. Por isso, investir no Employer Branding é fundamental em meio a este cenário de “guerra por talentos” do mercado. Nesse sentido, Employer Branding pode ser considerado um dos ingredientes não-óbvios de sucesso de marcas gigantes como Apple, Starbucks e Google, por exemplo.
Contudo, como se trata justamente da reputação da sua marca no mercado, é preciso ter cuidado para garantir que o que estamos promovendo é de fato encontrado pelas pessoas que passam a trabalhar na nossa organização. É neste momento que entra a importância de se gerir a experiência: é preciso que haja uma cultura de escuta e avaliação contínua ao longo de todo o ciclo de vida do colaborador, do Onboarding ao Offboarding. Em outras palavras: não devemos parar no EB.
A jornada de EX é uma jornada analítica
A jornada de trabalho com Employee Experience é uma jornada de trabalho contínuo com dados, já que um bom programa de EX deve ser criado junto aos colaboradores. Por isso, é importante desenvolver a habilidade analítica dentro da equipe responsável por EX ou criar alinhamento com times de People Analytics.
Trabalhar com dados de experiência não significa apenas fazer pesquisas, já que podemos capturar dados através de outros meios, como entrevistas e indicadores. Mesmo assim, sabemos que pesquisas constituem uma peça central da mensuração da experiência dos colaboradores, sendo necessário coletar a sua opinião ao longo da jornada e de forma frequente.
EX não é responsabilidade apenas do RH
Em geral, qualquer tema relacionado a pessoas é automaticamente atribuído à área de RH. Porém, ela não pode e nem deve ser a única área responsável pela gestão de EX.
Diversos papéis impactam a experiência das pessoas na jornada e, por isso, todos devem ser corresponsáveis pelo tema. De forma ampla, é possível pensar em 4 responsáveis centrais por EX:
- Colaboradores: responsáveis pela construção da sua própria experiência com protagonismo (atitudes e ações alinhadas às suas próprias necessidades) e opinião (participação em pesquisas e outros mecanismos de escuta);
- Lideranças diretas: responsáveis por tangibilizar a entrega da experiência de forma “personalizada” para os integrantes dos seus times no dia a dia;
- Áreas internas: responsáveis por oferecer um bom serviço aos clientes internos;
- Recursos Humanos: responsáveis por estruturar o time/squad que gere o Programa de EX, organizando a execução de iniciativas voltadas para a experiência e orquestrando os demais participantes por meio de dados e governança.
De EX para HX (Human Experience)
Em uma reflexão mais ampla, é possível questionar: para onde vai o EX no futuro? Entendemos que, cada vez mais, estamos caminhando para a Human Experience (HX). Além do fato óbvio de que por trás de todo crachá existe um ser humano, alguns fatores reforçam a HX como futuro da EX, incluindo a menor separação entre os horários e locais de trabalho e da vida pessoal, a maior expectativa das pessoas em relação às responsabilidades da organização e a maior conexão emocional com os diferentes papéis que exercemos com as marcas.
Vivemos de forma cada vez mais intensa a transformação da relação entre pessoas e empresas, que deixam de ter uma conexão baseada em transações financeiras para ter uma conexão baseada em transações emocionais. Afinal, a jornada de trabalho pode até ser das 9h às 18h, mas a vida é um turno de 24h.
*Frederico Lacerda é CEO da Pin People
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