Izaque Suruí, 41 anos, é um pequeno agricultor que vive da colheita de castanhas no município de Cacoal, nos limites dos estados de Rondônia e Mato Grosso, na Amazônia brasileira. Ali, onde o povo indigena do qual Izaque faz parte — os Paiter Suruí — vive, a principal fonte de renda são as castanhas que caem das árvores nativas.
Durante muitos anos, a rotina de Izaque e sua família com a venda dos frutos se resumia em colher o produto e vendê-lo para atravessadores clandestinos a preços bem abaixo do mercado. Na época, cada quilo de saca colhida lhe rendia entre R$ 2,50 e R$ 3,50. “Era preço de banana”, lembra.
Como cada família Paiter Suruí colhe em média três sacas de castanhas por dia, a renda mensal familiar era de apenas R$ 315 na comunidade. Com um agravante: eles só podiam contar com esse valor entre o final de novembro e início de janeiro, época em que as castanheiras dão frutos. Uma dura realidade que só mudou quando essas famílias se uniram em torno do cooperativismo. Juntas, eles fundaram a CooPaiter — uma cooperativa que leva o nome da tribo que, em português, significa “gente de verdade”.
“Desde que nos unimos, cada quilo da saca sai por volta de R$ 9 reais. A cooperativa tem ajudado muito a gente porque já compra nosso produto por um preço justo”, diz Izaque. “Hoje, nós, indígenas, podemos ter crediário, nota fiscal. O negócio ficou mais formal”, completa.
Para compensar os meses sem colheita das castanhas, a cooperativa criou alternativas de renda para os cooperados, que podem trabalhar descascando, desidratando, empacotando e fazendo outras atividades que agreguem valor ao produto. Motivados pela certeza de ter uma fonte certa e constante de subsistência, a produtividade dos produtores aumentou. Hoje, a CooPaiter é responsável por todo o processo de embalagem dos produtos, com uma capacidade produtiva de 16 toneladas de castanhas processadas todos os anos.
Outra estratégia de sucesso foi diversificar a produção, com o plantio sustentável de café. Em 2018, o grão de café produzido pelos Paiter Suruí ganhou destaque após receber uma das notas máximas da Semana Internacional do Café — uma das maiores feiras de toda a cadeia produtiva do café, realizada todos os anos, em Belo Horizonte. São 48 toneladas produzidas anualmente, com a participação de 51 famílias indígenas.
“A gente vai se desenvolvendo e aprendendo com a cooperativa, nos capacitando. Além de ser um meio de preservarmos a natureza”, avalia Izaque.
Desde sua fundação, em 2012, a CooPaiter impactou positivamente a vida de centenas de famílias, gerando uma renda maior e mais constante para elas. E vale destacar: parte do dinheiro arrecadado pela cooperativa retorna à comunidade na forma de benefícios, como a criação de programas locais de valorização da cultura índigena e preservação da floresta amazônica.
Sustentabilidade
Bem longe da floresta, em Guaxupé, cidade localizada no sul de Minas, próxima à fronteira com o estado de São Paulo, está localizada a Cooperativa Regional de Cafeicultores de Guaxupé (Cooxupé) — primeira cooperativa brasileira autorizada a negociar créditos de carbono, ou seja, apta a comercializar este tipo de ativo com empresas e países que não consigam reduzir suficientemente as emissões de CO2 de suas atividades.
Com 97% de seu quadro de cooperados formado por pequenos produtores que vivem da agricultura familiar, a Cooxupé mantém uma Política de Sustentabilidade que baseia toda a sua produção, comercialização e relacionamento com os cooperados e colaboradores, assim como o impacto nas comunidades onde a cooperativa está inserida. Essas práticas sustentáveis se dividem entre aspectos econômicos, sociais, culturais e ambientais.
“O cooperativismo é diferente do modelo de negócios B2B (empresa vendendo para empresas) ou B2C (empresa vendendo para consumidores). Nós somos P2P (people to people) — uma organização de pessoas para o desenvolvimento de pessoas. Este diferencial alcança os preceitos sustentáveis e só precisamos aprimorar esse modelo às novas perspectivas do novo mundo em que vivemos”, explica Alexandre Costa Monteiro, gerente do setor de ESG da Cooxupé.
Em 2021, a cooperativa recebeu diferentes premiações em reconhecimento ao compromisso com a sustentabilidade. Entre eles o programa RainFlorest Alliance que repassou R$ 50 milhões aos cooperados da Cooxupé com o objetivo de incentivar e remunerar as boas práticas sustentáveis do cultivo do café. Outro reconhecimento importante veio do programa C.A.F.E Practices Mulheres da Starbucks, que deu às cooperadas da Cooxupé a oportunidade de fornecer sua produção à maior rede mundial de cafeterias do mundo. O reconhecimento — que também envolve incentivo financeiro — é mais um fruto das boas práticas de plantio e manejo do produto, que estão alinhadas às exigências internacionais de cultivo ESG.
Vale destacar: estudo encomendado pelo Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (CeCafé), conduzido pelo Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) e pela Universidade de São Paulo (USP)*, mostrou que a cafeicultura, quando produzida de forma sustentável, é capaz de sequestrar carbono, tanto no solo quanto nas plantas, em índices muito maiores que as emissões desse tipo de gás.
Economia aquecida
De olho nas oportunidades abertas pelo mercado da sustentabilidade, a Cooxupé está investindo em tecnologias que possam ampliar o sequestro de carbono dos cafezais de seus produtores. Assim, espera-se conquistar cada vez mais compradores nacionais e internacionais. Nada mal para uma cooperativa que já comercializa sua produção para mais de 50 países, sendo a maior exportadora individual de café do mundo.
“Procuramos nos atualizar nas novas demandas de mercado para entregar produtos feitos dentro dos mais rígidos critérios ESG. Proporcionar o acesso a este novo mercado por pequenos cafeicultores é praticar, de forma efetiva, a promoção da sustentabilidade”, diz Alexandre.
Hoje, a Cooxupé conta com 17 mil cooperados em mais de 300 municípios de Minas Gerais e São Paulo. Ao longo dos anos, a produção familiar dele e dos outros produtores associados foi capaz de construir 48 unidades de negócios, entre a matriz, núcleos e filiais, além de armazéns e um complexo industrial de última geração.
Intercooperação
Diferentemente do mercado tradicional, onde a competição entre empresas é um processo comum para definir quem ganha e quem perde nos negócios, o cooperativismo prega a ideia da ajuda mútua, da cooperação, e não da competição. Por isso, as cooperativas têm o bom hábito de unir forças para crescer. Foi o que aconteceu com três gigantes do agronegócio: Frísia, Castrolanda e Capal, sediadas no Paraná.
Quando ambas já eram potências em seus respectivos mercados, elas se viram diante de um impasse: para continuar a crescer, precisariam disputar o mesmo mercado. Foi então decidiram se unir em torno de uma ideia muito mais criativa e inovadora.
“Os conselhos das três cooperativas se juntaram, sentaram e basicamente a discussão foi: se a gente pode cooperar, porque a gente vai competir?”, lembra Auke Dijkstra Neto, gerente de Estratégias e Inovação da Frísia e responsável pelo marketing da Unium, nova marca criada com a fusão das três cooperativas.
Ficou decidido que cada cooperativa manteria sua produção, marca e parque industrial, mas elas se posicionaram no mercado sob uma nova marca: a Unium, passando a dividir resultados ao invés de disputar clientes.
Em seu site, a Unium destaca: é uma marca ‘genuinamente paranaense’, e conta hoje com mais de 5 mil cooperados e R$ 7 bilhões em faturamento anual, exportando seus produtos para 25 países. São 3,5 milhões de litros de leite embalados ao dia, 145 mil toneladas de trigo e 113,5 mil de carne suína processados por ano.
Entre os benefícios de unir forças ou — como se diz no cooperativismo — “de terem intercooperado”, a Unium trouxe às três coops envolvidas maior rentabilidade, ganho de escala e vantagem competitiva. Além disso, a nova marca ajudou as envolvidas a reduzirem custos, já que elas passaram a compartilhar a logística de distribuição, beneficiamento de produtos e até mesmo quadro de pessoal.
“O poder de investimento da Unium é muito maior do que o de cada cooperativa individualmente. Ganhamos uma capacidade muito maior de acessar novos mercados e crescer”, finaliza Auke.
Fonte: G1
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