COOP É TECH, COOP É POP
Em 1997, o mundo assistiu estarrecido à derrota do então campeão mundial de xadrez, Garry Kasparov, diante do supercomputador Deep Blue. Para muitos, aquele momento representava o início de uma nova era — a era das máquinas. E com ela, um temor: será que a inteligência artificial substituiria os humanos?
Mas o tempo mostrou outro caminho.
O próprio Kasparov, anos depois, transformou sua perspectiva. Em vez de resistir à máquina, decidiu colaborar com ela. Foi assim que surgiu o conceito de xadrez centauro: partidas disputadas por duplas formadas por um ser humano e um motor de IA. E o mais surpreendente? Os vencedores não eram os grandes mestres, nem quem usava o software mais potente — mas sim os amadores que sabiam colaborar melhor com suas IAs. Sabiam quando confiar, quando duvidar, quando liderar… e quando deixar a máquina liderar.
Essa história nos mostra um princípio essencial para o mundo atual: não é a inteligência bruta que vence, mas a sinergia entre humano e máquina. E, para que essa sinergia aconteça dentro de uma organização — especialmente em uma cooperativa — é preciso algo maior do que tecnologia. É preciso cultura.
IA não substitui. Ela amplia — quando há confiança.
Um estudo da Wharton School reforça essa ideia: quando a IA entra na tomada de decisão, ela não apenas melhora os processos humanos de forma linear — ela dá origem a capacidades totalmente novas, que emergem da colaboração entre os dois. Mas para isso, há um elemento-chave: confiança.
E confiança, como sabemos, não é automática.
Ela nasce da experiência prática, da interação real, do uso cotidiano. Segundo o estudo “Investigating the Relationship Between AI and Trust in Human-AI Collaboration”, essa confiança depende de dois pilares:
- Percepção cognitiva: a IA parece lógica, útil e compreensível?
- Percepção emocional: a IA nos dá segurança, conforto e controle?
Ambas são impactadas por fatores como a complexidade do sistema, o esforço exigido na coordenação e a qualidade da experiência de uso. Ou seja: adotar IA não é só uma questão técnica — é uma questão humana.
O papel da liderança: treinar, não só implementar
Para construir uma cultura de IA sólida dentro da sua cooperativa, é preciso preparar as pessoas — não apenas com manuais, mas com experiências práticas. A confiança na IA cresce quando a complexidade diminui, o uso se torna intuitivo, e o aprendizado é coletivo.
Aqui estão três pilares para guiar esse processo:
- Simplifique a experiência: ensine como interpretar respostas da IA, fazer bons prompts e entender seus limites. Confiança nasce da clareza.
- Crie rituais coletivos: inclua a IA nas reuniões, compartilhe boas práticas, incentive o uso experimental e colaborativo.
- Foque no “quando usar” — não só no “como”: IA mal utilizada gera frustração. Ensine as pessoas a identificar onde ela traz real impacto.
9 atitudes práticas para começar agora
Para transformar cultura, é preciso começar pelas atitudes do dia a dia. Aqui vão nove práticas que qualquer colaborador — de qualquer área — pode adotar:
- Atualize-se semanalmente sobre IA
- Experimente tarefas de baixo risco com IA
- Compartilhe aprendizados e prompts com colegas
- Crie espaços de troca (ex: canal de IA no WhatsApp)
- Use uma linguagem acessível e inclusiva
- Normalize o desconforto como parte do aprendizado
- Mapeie os usos mais eficazes da IA em sua área
- Desenvolva pensamento crítico sobre os outputs da IA
- Escolha um desafio real e resolva com IA nos próximos 30 dias
O futuro da sua cooperativa depende disso
Você não precisa ser especialista em IA. Precisa ser bom em trabalhar com ela. E isso começa com três ingredientes simples: curiosidade, consistência e coragem.
A IA não vai tirar o seu lugar. Mas ela vai mudar o que significa ocupar esse lugar.
Criar uma cultura de adoção da IA é, acima de tudo, um exercício de humanidade. De preparar as pessoas para colaborarem com a tecnologia com clareza, com estratégia — e com empatia. Esse é o verdadeiro diferencial competitivo de uma cooperativa pronta para o futuro.
Por Andrea Iorio, palestrante, escritor best-seller e especialista em Transformação Digital e Inovação

Coluna exclusiva publicada na edição 124 da Revista MundoCoop