As cooperativas brasileiras têm se inspirado no sistema cooperativo alemão para resolverem os seus desafios atuais. O país, que se tornou uma das economias mais sólidas nesse modelo social, conta com mais de 700 cooperativas filiadas, 17,9 milhões de cooperados e 1/3 da população negociando com bancos cooperativos.
As organizações representam 25% do Sistema Financeiro Alemão, concorrem diretamente com os bancos privados, podendo inclusive atuar com não-associados, absorvendo 30 milhões de clientes. O movimento carrega em seu currículo um histórico de mais de 85 anos, já atravessou duas grandes guerras, enfrentou momentos de crises, e segue na posição de terceira maior economia mundial, considerada detentora de um sistema cooperativo de crédito forte.
Eduardo Oliveira, Consultor Técnico de Inteligência de Mercado do Sistema Ocesp, lembra que o cooperativismo na Alemanha tem um grande fundo de reserva financeira, oferecendo solidez ao sistema cooperativista, que não registra um único caso de liquidação de uma cooperativa há mais de 80 anos. Segundo o especialista, o sistema segue um sistema simplificado, atuando monitorando e oferecendo ferramentas de gestão às suas cooperativas filiadas.
“Vários elementos contribuem com o cooperativismo alemão, entre eles o de ser um único sistema de crédito cooperativo. Outros pontos interessantes envolvem algumas particularidades no seu desenvolvimento. Quando houve deflação na economia alemã, as organizações não tinham como rentabilizar seu capital social e, consequentemente, as quotas-parte de seus cooperados, a partir dos créditos financiamentos disponibilizados. Por conta disso, começaram a aplicá-lo na construção civil, construindo, alugando e vendendo imóveis, de modo a rentabilizar seus recursos”, exemplifica Eduardo.
Portanto, as organizações alemãs carregam uma história de resiliência, na adversidade, inovaram e focaram na construção de imóveis. Seus financiamentos imobiliários garantiram a rentabilidade do capital, por meio do valor agregado das construções, ao invés da correção.
“Esse é um dos exemplos que pode ser seguido pelo cooperativismo brasileiro, uma vez que há ampla demanda desses tipos de imóveis em algumas regiões do país. Além de desenvolver programas mais adaptáveis e de enfrentamento de seus desafios, a partir da simplificação de seus processos e elevação do controle de suas operações, analisando e planejando antecipadamente para mitigar possíveis riscos financeiros”, indica Oliveira.
Como as cooperativas alemãs lidam com os riscos
A partir do levantamento das necessidades das cooperativas de crédito, algumas instituições, entre elas o Sistema OCESP, criaram projetos, como o Programa Executivo Internacional de Gestão de Riscos nas Cooperativas de Crédito na ADG Akademie Deutscher Genossenschaften, na cidade de Montabaur, na Alemanha.
O evento aconteceu em julho e contou com a participação de 23 cooperativas, que aprenderam sobre o sistema cooperativo alemão, suas singularidades e desafios, além de realizarem benchmarking, networking e propostas de intercooperação.
O objetivo foi levar os diretores e gestores das cooperativas para a Alemanha, com a finalidade de entenderem como as organizações alemãs lidam com a gestão de riscos. Luis Antônio Schmidt, Gerente-geral do Sistema Ocesp, conta que a participação dos executivos nesse programa possibilitou fazer a replicação dos modelos em suas operações, bem como realizar contatos e promover ações de intercooperação.
“Durante o curso criamos uma linha de comunicação entre os participantes e as cooperativas promovida ou não pelo Sistema OCESP, sobre ações implementadas e propostas de intercooperação a serem apresentadas, independentemente do sistema ao qual a cooperativa está afiliada. Essa iniciativa é uma forma de trocarem experiências e conhecimentos após o fim do programa”, lembra Luís.
Atualmente, alguns dos principais desafios que as cooperativas alemãs têm enfrentado é a renovação de seus associados e de seus gestores. O especialista relata, que o envelhecimento de sua população e a diminuição do interesse das novas gerações sobre o cooperativismo vem gerando um alerta. “Por isso, os seus focos estratégicos têm sido a retenção de talentos, oferecendo programas de desenvolvimento de carreira, que rivalizem com as do mercado de trabalho europeu”, complementa Schmidt.
Outros problemas estão relacionados aos Marcos Regulatórios, que criam exigências e ampliam a necessidade de reporting das cooperativas, aumentando os encargos sobre os recursos de instituições pequenas e médias, e por isso dificultando sua operacionalização.
Para finalizar há uma necessidade de ampliar os programas de sustentabilidade, que respeitem o cumprimento de padrões sociais e de governança.
Intercâmbio conecta profissionais e ajuda no networking
Além do programa criado peloSistema OCESP, a Confebras desenvolveu um Programa de Intercâmbio Executivo, que tem como objetivo conectar os profissionais dascooperativas financeiras brasileiras com as principais instituições cooperativistas do mundo, entre elas as alemãs.
Durante o evento, os cooperados vivenciam o dia a dia das maiores referências do segmento cooperativo em vários países, a partir de visitas técnicas, aulas e imersões.
O último intercâmbio foi realizado em 2023 e envolveu 12 turmas, com cerca de 250 integrantes, em cinco países: Alemanha, Canadá, Espanha (País Basco), França e Inglaterra. Porém para a Alemanha as imersões são feitas desde 2008, por apresentar um cooperativismo muito antigo e que só evolui.
No curso são oferecidas várias oportunidades aos cooperados, entre elas fazer o networking com as instituições, conhecer cases de sucesso, maturação e expansão de projetos de acordo com informações e conhecimento adquirido. Fora isso, os participantes conhecem as tendências de inovação, não só no mercado financeiro e cooperativista, mas também no mundo dos negócios.
Brunna Barbosa, administradora pós-graduada em Marketing e MBA em Gestão de Cooperativas de Crédito, Coordenadora de Eventos na Confebras, conta que desde o surgimento, as organizações alemãs têm se reinventado com o crescimento exponencial em participação no mercado. Também ocorre a capacitação dos profissionais e a estrutura da rede financeira cooperativa, apoiando os 697 bancos cooperativos singulares.
“Atualmente, as cooperativas estão focadas em temas macro, como tendências econômicas, socioculturais, tecnológicas, ecológicas e de políticas legais, trazendo cada vez mais sustentabilidade ao negócio cooperativo”, finaliza Bruna.
Por Priscila de Paula – Redação MundoCoop